CORAGEM
Quis gritar. Arrumar as malas. Bater a porta e ir. Pra onde, não sei.
Enquanto despejo minha angústia nestas palavras mal organizadas, Manô me canta aos ouvidos.
"Amor não é assim, arrumar as malas e ir embora.
Amor não foi assim, o que combinamos eu já nem sei..."
[Coragem - Ela Manô]
Não. Não combinamos nada disso. Não combinamos nossas brigas por nada. Não combinamos esse desencontro de ideias, de opiniões. Não combinamos silêncio. Não combinamos a falta de tato. Não combinamos distância. Não combinamos as malas feitas. Não combinamos esse adeus.
A cena é típica de um romance de baixo orçamento. A cerveja esquentando em minhas mãos. O cigarro esquentando-me a garganta, obstruída por todas as palavras que eu não disse. Engoli, sem direito de resposta. Inflamou. A porta tão fechada quanto teus ouvidos para meus questionamentos. Os cabelos tão bagunçados quanto meu peito, depois de tanto guardar. A roupa tão usada quanto as tuas desculpas.
Minhas mãos suam. Contrariam, como sempre, o vento gelado que passa pela janela entreaberta. Quis ser folha, passear por aí com o vento. Quis ser menos. Tudo menos essa na qual me transformei. Quis não me importar. Quis ser qualquer coisa que se assemelhasse à garota segura, independente, disposta e compreensiva por quem você se apaixonou. Quis ser eu novamente, mas não fui. Não deu. Não dessa vez.
Gritei. Arrumei as malas. Bati a porta e fui. Pra onde, não sei.