O Papagaio que nunca existiu e o homem que continua esperando
Alguns anos atrás tive um papagaio lindo como meu companheiro fiel, falando assim pareço um pirata senil mas o ponto não é esse, suas penas arroxeadas lustrosas de um brilho ridículo, bela mancha preta em seu bico curvado que destacavam o das outras aves e até mesmo dos outros animais que eu vira no presente momento de minha longa vida, corpanzil formidável e acima de tudo um pequeno topete que deixaria os mais orgulhosos leões africanos com inveja.
Achei-o ao acaso quando havia perdido o rastro do caminho, em uma de minhas expedições solitárias, la estava, olhando para meu lustroso brinco o qual fervilhava de um amarelo vivido graças a um dos poucos raios de sol que penetravam na mata fechada. Passei dias perdido, sempre sentindo um vulto colorido no meu encalço me guiando, deixando pistas, observando como se soubesse do meu desespero. No final do 10º dia encontrei minhas próprias pegadas, em algo que deveria ter sido uma poça de lama a alguns dias atrás, obviamente, com uma pena rubra ao seu lado. Havia encontrado meu rumo e era hora de deixar meu novo-velho amigo em seu habitat. Porém, não contente em me salvar do terrível destino que a floreta me reservara, grudou em meu ombro e seguiu me até aquela velha choupana campestre que eu chamava de lar.
Em um piscar de olhos, em um bater de asas, parecia que nos conhecíamos a anos, ensine-lhe a falar e a mim, ensinou a cantar como só os pássaros sabem. As minhas mundanas manias sabia-as todas, e a seus hábitos primaveris nunca esquecerei; sua alegria eufórica de cantar a plenos pulmões, seu bater de asas endiabrados para se secar da chuva. Ouvir o bater de asas daquela criatura todas as manhas e seu canto todas as tardes parecia ser meu destino final até chegar sua hora de voar com os anjos.
Com o passar dos meses, parecia cada vez mais aflito de ser mantido na choupana, e leva lo a mata em minhas sórdidas aventuras passou a ser uma
aposta, subia além da copa da longilínea vegetação ao amanhecer para voltar apenas a noite com um rasante sobre meu jardim de rosas que cultivava com tanto afeto. Voltava renovado de sua própria expedição quanto a mim, estava sempre acabado ao final do dia e vê lo no seu pulheiro me alegrava os ânimos, quanto a ele, ver me parecia ser uma lástima a qual deveria sanar na manhã seguinte.
As horas de voo aumentavam todos os dias, não reconhecia mais seu canto, parecia ter perdido força, suas assas não batiam com a mesma energia
e animação de outrora. A minha rotina não lhe cabia mais lembrar e sua companhia era esporádica e passageira. Ao passo que te lo na incerteza, não saber se sua palheta de cores passaria diante dos meus olhos nessa ou na próxima semana. Tudo isso me levou a tomar medidas que nunca teria pensado em
mil anos se não fosse pelo efeito que causara em mim essa constante inconstante. Cortei-lhe as asas sem remorsos, sem piedade de ve lo sofrer. Cortava-as
todas as semanas, as quintas feiras, sem falta.
Dia a pois dia seu olhar melancólico tornava-se cada vez mais frequente e por mais que recebesse mimos e carinhos, ele apenas queria abrir suas asas lilases e voltar a sentir o vento transpassar suas penas farfalhantes, sentir o sol brilhanto em seu bico curvo e destacando a mancha preta a quem estivesse passando. Sentindo o remorsos pelo meu ato egoísta, deixei suas penas voltarem a brilhar contra o sol da manha mas seu rasante noturno não foi visto por um mês. De certo achei que perdera a amizade do meu fiel companheiro. A companhia de outras criaturas aladas não me satisfaziam tampouco outros animais me agradavam completamente. Apenas serviam para ocupar um espaço sem sentido de existir na minha velha cabana.
Eis que um dia, depois de longa espera meu amigo volta, sem rasante, sem cantoria, sem alegria. Pousou na janela do quarto; olhou para sua antiga casa,; os cômodos; os moveis, ruídos por ele mesmo; os quadros das paredes e para o piano , seu lugar favorito. Até que encontro o reflexo de minha iris nas suas pequenas pupilas Psittacoideas, suas asas se abrem e a luz soturna do por do sol as transpassa estão tão belas como no primeiro dia
que as vi na floresta. Em seguida bate levemente o bico na janela, se afasta e alça voô.
Fiquei la parado, um pirata sem papagaio, sozinho com uma xícara de chá preto quente entre as mãos sabendo que nunca mais veria meu irmão alado, sabia que aproveitara meu tempo em sua presença e espero que ele pense o mesmo. Pelo menos ele estava feliz, livre como deveria estar. Um sorriso fora arrancado de mim e demorei a voltar a ir em minhas aventuras solitárias mesmo sabendo da sua felicidade e liberdade, como deveria ser,
a sensação de vazio perdurava. Quem sabe eu volte a vê-lo, em outra expedição, com um sorriso no bico, acenando seu topete real.
"Como vai velho amigo?"
"Tão bem quanto no dia que batera em minha janela e alçou voo, velho amigo"