Doe de amor perdido

A noite principiava a cair fazendo as sombras se espalharem aos poucos em volta da casa grande.O gado já fora recolhido, as galinhas nos seus poleiros, os piões entregues aos seus merecidos sossegos, o cão Bola adormecido aos pés do dono, tudo nos seus conformes, em paz no fim de mais um dia.No peito de Francisco, porem, não havia paz, um emaranhado de sentimentos se chocavam.Ele sempre apreciara aquela hora, porem as lembranças agora o atormentavam.Tereza não estava ali por perto, não ouvia o bater da louça sendo posta na mesa, não escutava seus passos na tábua corrida, não teria mais o som de sua voz chamando para o jantar,a vida muda, mas ele não pensara nunca sobre isso, era orgulho e confiança demais sobre si mesmo.Dor de amor, quem nunca sentiu? Na verdade, ele se achava imune a isso.

Agora porem, ele estava só, enfrentando o vazio da sua vida.Jamais pensara que seria abandonado por uma mulher .Ele? Nunca!Rico, poderoso, respeitado ,até temido.Naquela Vila ele era como um rei.Como fora possível Tereza não sentir amor por ele? Ela sempre fora cordata, simples e, principalmente, linda.Sempre acatara os desejos dele, as ordens, eu quero isso, quero aquilo, e ela parecia dizer:sim meu senhor!Ter sido escolhida por ele, entre outras, deveria ter sido um encantamento para ela.Para o pai de Tereza fora como um bilhete premiado.Estava garantido, ganhou um pedaçinho de terra, uma casa, virou capataz e, principalmente, ganhou o título de "sogro" de Francisco.Muito mais que pensara conseguir na sua vida.Tereza nunca fora consultada sobre o fato, se queria ou não.Uma boa filha obediente,sorrindo quando tinha que sorrir, chorando as sós.

Ilusõesperdidas, o tempo passando, a vida seguindo.O filho esperado não veio, Francisco nem se preocupou em saber motivo.Filhos podem trazer problemas, ocupam a mãe por tempo demais, e tempo ainda havia pela frente.O sogro sempre bajulador, colocando Francisco no alto, Tereza sempre a mesma, cuidando da casa grande, trazendo tudo em ordem, do jeito que Francisco gostava, e ele sempre mimado , mandando em tudo e em todos.Tereza uma boneca sem alma, entregando-se a ele quando solicitada, sem arroubos.Ela deveria ter seus desejos, mas isso não interessava aos seus senhores, o marido, o pai.O tempo e as mágoas não afetaram a beleza dela, orgulho de Francisco.

Um dia ela descobriu que não podia amar o pai como antes, agora estava ciente que ele nunca pensava nela, cheio de si se tornara um espelho de Francisco.Chegou por fim o tempo que, como um dique que arrebenta espalha a destruição por todos os cantos, Tereza soltou a sua alma,e foi na calada da noite, uma como tantas outras, que ela partiu.Foi embora com o amor de toda sua vida.Há muito eles teciam planos, faltava só a decisão.Ela não levou nada com sigo, so´ o desejo de sua liberdade,tinha que soltar todas as amarras , e lá foi ela com o coração em festa.Seria dona da sua vida, do seu destino.Francisco ficou só, com suas terra, seu dinheiro , e o seu orgulho ferido.Temeroso de perder seus novos bens, o pai a renegou.Filha ingrata, e dobrou seus cuidados pelo genro dono do tesouro.

Só então Francisco compreendeu que amara mesmo aquela mulher, sem ela seria difícil seguir.Quando só, ele chorava lágrimas amargas, a dor vinha solta.Antes ele vivia e ela vegetava, agora as coisas haviam mudado.Muito tarde para mudar.A noite caiu de todo e os ruídos noturnos chegaram até Francisco, o pio das corujas, a brisa nas folhagens, um galope distante de uma montaria, o mugido do gado.A vida pulsando,ausência de Tereza, a cama gelada, o coração sofrendo.Anos pela frente para serem enfrentados, sem amor, sem companhia.Francisco sofria...

lucia verdussen
Enviado por lucia verdussen em 08/04/2016
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