Encontros e Desencontros
O casal de jovens conversava alegremente no banco da praça. Num ambiente bem decorado e o clima propício para aquele momento especial e épico.
Luiza e Romulo estavam sob a tutela de ventos macios e sol fraco, por ter seus raios filtrados pelas nuvens claras e desenhadas por anjos que captaram os fluídos enérgicos do amor. E eles se entendiam através de um elegante diálogo:
- Rominho, ninguém nunca fizeste algo assim para mim. Sou mesmo merecedora de tamanho préstimo?
- Luiza, todos são merecedores. A diferença é que alguns fazem por merecer. Deixam o coração aberto para as alegrias da vida. E outros não.
- Hoje é o dia mais feliz de minha vida!
- Como eu disse, é porque está com o coração aberto para o amor. E tenha certeza, todos são capazes de aspirar e respirar este grandioso sentimento. Basta querer.
Após aquela conversa agradável, floresceu as juras de amor:
- Rominho, quero-o como meu companheiro eterno. Que estejas sempre ao meu lado. Quero cuidar de você. Respeitá-lo e fazer jus a todo seu esforço.
Ele sorriu. E declarou-se:
- Prometo-lhe respeitá-la. Farei o possível para vivermos em paz e harmonia. As pessoas deveriam acreditar no amor. Fazer com que ele se torne presente com veemência nas relações.
Após as confidências abraçaram-se. E logo veio o primeiro beijo com sabor de vitória.
Foi um dia inesquecível. Luiza tirou um guardanapo da bolsa e tomou de empréstimo uma caneta com Romulo. Começou a anotar cada detalhe daquele instante. Descrevia tudo. A temperatura, as vestimentas e os preciosos segundos.
Ele novamente sorriu. Demonstrou interesse na atitude da jovem. Deslumbrou-se com a riqueza das informações descritas e afirmou:
- Luiza, não se assuste com minha confissão, mas estou apaixonado por você! Não estou precipitado. È a mais pura verdade!
Ela distendeu os lábios, emocionada. Não conseguia esconder tamanha felicidade. Não imaginava que em meio a paisagens e sinalizações, durante o passeio premeditado por ruas e avenidas, poderia florescer um sentimento daquele nível. Completo por dentro e por fora. Sincero e grandioso. Tudo indicava que de fato, foste amor à primeira vista.
E Romulo jamais esqueceria o dia daquele encontro, onde teve o privilégio de admirar o lindo e belo sorriso de Luiza. Ela concedeu-lhe a honra, com extrema carisma, fruto de sua pura e simples gentileza. Ele cedeu bondosamente seu lugar no acento do ônibus, sendo retribuído pela expressão de amabilidade da jovem.
O encontro que antecedeu o início do romance na praça, ocorreu quando eles trocaram olhares e risos cheios de malícia. Pareciam estarem a sós dentro do coletivo. Apesar de todo o calor humano, deixaram de lado o público que alternavam-se num sobe e desce e levavam no íntimo, sentimentos otimistas que revezavam-se entre tons de equilíbrio e estresses.
No pequeno mundo móvel e barulhento em que Luiza e Romulo se identificaram, antes do primoroso reencontro, letras unidas borbulhavam pelo ar, enquanto os dois continuavam sem trocar uma palavra. Pareciam prever que as frases estariam reservadas para o futuro.
Naquele dia, do primeiro encontro, a jovem Luiza, em estado de êxtase e empolgada com o momento, distraiu-se. Ao perceber já estava no seu costumeiro local de desembarque, numa das avenidas mais movimentadas da capital paulista. Ela levantou-se rapidamente e desceu, sem trocar um conjunto de letras e números com aquele jovem cavaleiro.
Romulo ficou sem reação. Imóvel. Queria desembarcar, mas era tarde. O ronco do motor atrasou provisoriamente sua intenção de conhecê-la melhor.
Por sua ação nobre em ceder o lugar no coletivo, teve como recompensa apenas a imagem de Luiza, nítida e clara, estampada em seus pensamentos. E o desenho perfeito, acompanhou-o durante todo o seu expediente. Pela grandeza daquele encontro e todos os seus ingredientes, imaginara que não acabaria assim. Tinha certeza que aquela história perpetuaria durante dias e mais dias.
Na manhã seguinte, Romulo embarcou no mesmo horário, numa tentativa desesperada de vê-la novamente. Nada! Retornou noutro dia. Nada! Tentou outros meios. Acrescentou uns minutos e tirou alguns do horário de costume. Fracassou! Intentou por diversas vezes. Todas sem sucesso! Indagou-se:
- Seria uma miragem? Mas era tão real aquele sorriso! Preciso ter esperança.
Depois de várias tentativas frustradas retornou ao reduto de descanso. Pela força do desejo, algumas soluções floresceram em comunhão com seus objetivos. Caminhou até a varanda e ficou horas ali, numa total reflexão. Relembrava aquele sorriso mágico enquanto fitava as estrelas. Parecia suplicar ajuda aos seres brilhantes que decoravam o céu. Talvez um auxílio para que pudessem nortear caminhos que o levasse a encontrar a jovem do ônibus.
Ao somar esforços com o intuito de amenizar sua agonia surgiu uma ideia concreta. A opção era percorrer, se necessário, toda a extensão daquela avenida movimentada. Somente assim, deduziu, poderia encontrar a proprietária do sorriso mais belo e atraente que alegrou o seu itinerário.
Romulo voltou para dentro do lar e diante da escrivaninha, arquitetou seu plano com minudência.
Bem cedinho foi ao escritório e conversou com o gestor. Informou que precisava se ausentar do trabalho alguns dias para dedicar-se a uma missão particular e de extrema importância. Não revelou detalhes, mas como bom funcionário, seu pedido foi atendido.
Adiantou suas tarefas e distribuiu outras. No final do expediente despediu-se.
Já a noite, acomodou-se novamente na poltrona na varanda. Olhou para as estrelas e implorou assistência.
- Ajudem-me damas da noite! – fechou os olhos e continuou – ao menos desejem-me boa sorte. Obrigada e boas cenas aí de cima.
Entrou novamente na casa. Estava decidido. Conferiu todo o planejamento sob a escrivaninha. Afirmou para si mesmo que levantaria e partiria para o seu tento, sem importar com as condições atmosféricas. Sem preocupar se despencariam partículas transparentes, mesmas as inofensivas ou aquelas com conteúdo voraz e excessivo, capazes de provocar tempestades e tumultos. Mas não escondeu sua preferência pela estadia do cidadão universal, que surge sonolento e caminha sem pressa. Outrora se exalta e torna-se um rojão de fogo e não perdoa. Estava disposto e nenhum empecilho climático teria capacidade suficiente para fazê-lo desistir.
Antes do precioso sono, voltou à varanda, sorriu para as estrelas e foi dormir.
Levantou-se ao som premeditado do despertador e após as tarefas matinais, Romulo partiu cheio de esperança.
Já na avenida movimentada, entrava e saia das mais diversas lojas. Despistava ao perguntar preços, endereços e informações sobre produtos. Sabia que seria demasiadamente difícil, mas precisava concluir sua maratona geográfica e sentimental.
Não encontrou-a, mesmo depois de alguns dias e muitos quilômetros percorridos. O tempo, aproveitando de sua fragilidade emocional, sufocava-o a cada instante, aumentando sua ansiedade. Tirava-lhe aos poucos a sua esperança. O desânimo tentava invadir seu mundo, mas era contido pela perseverança e persistência, disposição e coragem. E a cada instante, Romulo renovava suas energias e continuava a cumprir o compromisso que assumira com seus sentimentos.
Foram dias naquela longa, louca e enigmática jornada. Alguns quilos que recheavam o seu corpo se foram. Abandonara-o. Porém nada fazia-o desistir de sua incumbência.
E continuava à procura, quando ao longe, avistou um ser que chamou-lhe a atenção. Ela caminhava vagarosamente e olhava para os lados. Parecia perdida. Aquela face era conhecida. Romulo conclui que era a joia rara que tanto procurava.
Luiza não tinha o mesmo semblante que cativou-o quando a viu pela primeira vez. Pelo contrário, parecia infeliz. Mesmo assim Romulo não teve dúvida quanto a sua identificação.
Ao vê-la triste, preocupou-se. Sentimentos distintos começaram a borbulhar em sua mente. Em voz baixa, conversou consigo:
- O que será que tanto a aflige?
Em meio a dúvidas, Romulo decidiu não abordá-la. Poderia agravar seus problemas. Precisava ter paciência. Recompor-se. Decidiu segui-la. Descobrir onde trabalhava e no dia seguinte fazer-lhe uma surpresa. E começou a torcer para que ela não o rejeita-se.
Acompanhou-a de longe, com os olhos firmes na sua direção. Luiza dobrou uma ruazinha, exigindo que ele apressasse os passos para não perdê-la de vista. Conseguiu. Observou-a entrar numa farmácia. Esperou alguns minutos. Passou a frente do comércio, porém do outro lado da calçada. Esperou mais um pouco. Voltou a passar em frente para certificar-se que ali era mesmo o endereço provisório da jovem misteriosa. Teve a certeza pela semelhança dos uniformes das colegas de trabalho. E para selar o fim de sua busca, observou que ela já sorria, meio sem graça, mas com toda a pureza e encanto que cativou-o.
Foi embora feliz e contente, apesar de preocupado se ela o reconheceria. Indagou-se:
- Será que vai lembrar de mim? Por que estava triste? Talvez amanhã eu descubra.
Ao chegar em casa no final da tarde, Romulo refrescou-se com um desejado banho. Dirigiu-se para a poltrona na varanda. Aguardou ansioso o surgimento das primeiras estrelas encarregadas de ornamentar o céu. Fechou os olhos por alguns instantes e começou a refletir. Lembrava com júbilo o rosto lindo de Luiza. Ao abrir, observou que as partículas brilhantes estavam todas as postos. Emocionado, agradeceu-as. E pediu que torcessem por ele. Para ter sorte no seu encontro. Ditas as breves palavras foi repousar.
Acordou bem cedo sem a tradicional ajuda do despertador. Repetiu sua rotina com agilidade. Precisava passar numa floricultura. Logo partiu.
Já bem próximo da farmácia, o coração de Romulo palpitava de forma acelerada. Tentou se concentrar e ter equilíbrio, mas a medida que diminuíam os metros da jovem dos mais belos e radiantes sorrisos, não conseguia segurar sua emoção.
Enfim chegou. Parou na porta, cheio de ansiedade e pernas bambas. Observou que ela proseava com as amigas e tinha o mesmo sorriso largo e singelo de quando teve o encontro “mágico” dentro do coletivo.
Restabeleceu as energias das pernas. Firmou o resto do corpo e caminhou com passos seguros e lentos na direção da jovem. Olhou-a com carinho e cumprimentou-a. Ela sorriu e veio ao seu encontro. Retribuiu a saudação. Ele apresentou-se:
- Meu nome é Romulo e estas flores são para você.
- Eh, ah, oh... Luiza. Muito prazer! Humm! São belas e cheirosas! Como sempre muito gentil! Admiro pessoas aprazíveis.
Continuaram com as trocas de olhares e risos. Pareciam repetir o filme de quando se encontraram no ônibus. Passaram alguns minutos até uma voz quebrar aquele silêncio:
- Muito bonito este encontro! Digo, reencontro! Mas Romulo, desculpe a intromissão, sou amiga da Luiza e sei de toda a história. Só acho que já chega de ficarem aí com esta troca de olhares. Precisam conversar. Se não daqui a pouco se perdem de novo.
- Janete, o que é isso? Assim você deixa-me sem graça.
- Sua amiga tem razão Luiza. Precisamos conversar.
Todos ali presente sorriram. Até mesmo os clientes da fila que desconheciam a história.
Luiza, aliviada e contente, desabafou:
- Rominho, que bom vê-lo de novo! Achei que aquele encontro foste uma miragem. Só tenho uma pergunta: como chegou até mim?
Ele respirou fundo. Sentia-se tranquilo e feliz pela recepção. Pensou nas noites em que pedira ajuda as estrelas. Não podia deixá-las de fora daquele momento de alegria. E respondeu-a em meio a palavras entrecortadas:
- Luiza, entre tantos sorrisos escondidos entre as estrelas, lá, em destaque, com um brilho inconfundível, estavam os seus. Segui a luz da noite, as pegadas do seu sorriso durante a tarde e cheguei até você.
Nos olhos de Luiza, lágrimas teimavam em não descer, mas o excesso de palmas das amigas e alguns clientes, ajudou-as a rolar intensamente.
Romulo, educadamente, com um pequeno lenço, enxugou o rosto de Luiza e abraçou-a.
Ela fez um pedido a colega de trabalho:
- Janete, por favor, quando a Elenice voltar diga que precisei ausentar-me alguns instantes. Vou até a praça com o Rominho. Explique-a o motivo. Ela vai entender.
- Tudo bem amiga. Não se preocupe. É uma ocasião especial. Vá tranquila. Romulo, desejo que sejam felizes. E certamente serão! Você deu muito trabalho para esta menina.
- Há Janete, antes que eu esqueça, antecipe os agradecimentos a Elenice. Informe-a que seus sábios conselhos foram de extrema valia. Tive fé, calma e paciência, como ela orientou-me. E agora, veja só quem está aqui na minha frente.
- Dou o recado. Agora vão. Precisam conversar.
Sem entender, Romulo segurou as mãos de Luiza e caminharam rumo a praça, localizada a alguns quarteirões da farmácia.
Ao sentaram, ele, curioso, foi direto ao assunto:
- Por que estava triste ontem? E por que Janete disse que dei trabalho para você?
- É porque há dias estou a sua procura. Primeiro tratei de embarcar no coletivo em horários alternados e não deu certo. Depois decidi caminhar por toda a extensão da avenida e de forma ininterrupta. Desembarcava no final da rua e vinha de lá pra cá no intuito de encontrá-lo. Entrava e saia das lojas. Despistava ao perguntar informações, com a intenção de vê-lo de novo.
- Puxa vida! Que interessante. Fiz o mesmo, porém comecei no início da avenida.
Após as confissões, ambos sorriram contentes.
- Por que fizeste tudo isto por mim?
- Luiza, não vou negar: foi principalmente por seu belo sorriso. Uma das coisas mais preciosas da humanidade. E você, por que tentou encontrar-me?
- Simplesmente por considerar que valia a pena. Foste muito gentil. E de forma natural e espontânea. Ceder lugar no acento do ônibus, por mais que seja uma ação simples, faz parte da lista de gentilezas e virtudes que andam desaparecidas na sociedade. Quando aparece é preciso valorizar.
Ainda de mãos dadas, Romulo fez-lhe um convite:
- Assim que puder, gostaria que fosse até minha casa e conheça meus filhos.
- Filhos? Parece ser tão jovem! Quantos filhos?
- São muitos e tenho imenso carinho por cada um deles.
- Tem uma creche ou algo assim?
- Não. Todos descansam em minha estante. São meninos cheios de história para compartilhar e quem se habilita, delicia tamanho privilégio. Curtem uma viagem, fruto da amizade, entre o escritor, linguagem e inspiração.
- Já sei. Tem uma biblioteca pela qual tem o maior zelo, correto?
- Acertou em cheio! Sou um dos clientes assíduos da livraria onde trabalho, no terceiro andar de um prédio comercial no final da avenida.
- Está explicado! Terceiro andar. Por isso não o encontrei em minhas andanças.
- Luiza, o importante agora é que estamos aqui. Bem juntinhos para quem sabe começarmos a escrever um novo e agradável capítulo em nossas vidas.
- Rominho, tenha certeza, é o que mais desejo.
- Agora que encontrei-a, peço-lhe, quer namorar comigo?
- Considerando-me encontrada, aceito com maior prazer!
Abraçaram-se e novamente ficaram calados. Por longos minutos. Porém já não precisavam se preocupar em um possível desencontro. A longa e incessante busca teve um final feliz.