A MÃO QUE LHE DEI PARA BEIJAR

Conhecer um cara legal é ótimo. Depois de alguns dias surge o convite para jantar. Claro que eu aceito. Escolho aquele vestido que realça com o pingente de ouro e com os sapatos de salto. São oito horas. A buzina toca, uma borrifada do meu perfume e estou descendo. -Você está linda! Ele diz ao abrir a porta do carro. Sorrio e me acomodo. Enquanto ele dá a volta, confiro minha bolsa. Batom, espelho, celular, chaves, carteira (mulher nenhuma deve sair desprevenida)...é, acho que está tudo aqui. Ele abre a porta, senta, olha para minhas pernas e delas para o volante. Vinte minutos depois, chegamos. O restaurante é maravilhoso. O garçom nos leva para o segundo andar, a mesa fica ao lado da janela com vista para a cidade.

-O que quer beber, Princesa? Pergunta ele.

-Vinho branco. Digo, sem deixar de admirar a vista.

-Traga-nos uma garrafa do seu melhor vinho branco! Ordena ele ao garçom.

-Salada de aspargos?

-Desculpe. Digo ao voltar meu olhar para ele.

-Posso pedir salada de aspargos como entrada para nós dois?

-Sim, claro.

-O que aconteceu? Não gostou do restaurante? Pergunta preocupado.

-Pelo contrário. A vista é linda. Não consigo parar de olhar. Digo, tranquilizando-o.

-Concordo. Sempre escolho esta mesa, mas como venho sozinho à vista não é tão bela.

-Por que diz isto?

-Porque diante da tua beleza qualquer vista é a melhor.

-O senhor é muito gentil.

-Me chame de você ou melhor, me chame de Rodrigo!. Quero ouvir meu nome sair destes belos lábios.

-Está bem, Rodrigo.

-Ouvir meu nome em tua boca é como ouvir uma sinfonia angelical.

Sorrio, meio sem graça. Rodrigo é muito galanteador. Um senhor de meia idade, de mais ou menos 1.80, cabelos e barba grisalhos, muito bem vestido, culto e que diz me amar. Pena não poder correspondê-lo.

Terminanos a salada. Rodrigo e eu escolhemos salmão com molho pesto como prato principal. Enquanto nossos pratos não chegam e o garçom recolhe os da entrada, Rodrigo segura minha mão que estava sob a mesa.

-Será que algum dia realizarei meu sonho?

-Sonhos se realizam, basta acreditar. Qual é o seu?

-Beijar-te!

Engulo em seco e puxo a mão que ele segura.

-Desculpe meu atrevimento. Diz sem jeito.

-Rodrigo, é melhor eu ir embora...

-Não! Por favor. Prometo não lhe incomodar com meus devaneios.

-Não incomoda. Apenas não quero iludi-lo, não sinto o mesmo que você.

-Eu sei, mas você ter aceitado meu convite para jantar já me conforta.

-Deduzo ter feito mal em aceitá-lo.

-Claro que não. Me fez o homem mais feliz do mundo. Diz e volta a pegar minha mão, agora as duas.

-Sei que não me ama, mas sei esperar. Esperarei a vida toda se for preciso. Sonho em poder te encher de beijos e como você disse: Basta acreditar.

Uma vida toda, sendo que ele já não é um jovem rapaz. Sinto pena de sua persistência. Ele sonha com um beijo meu. Ah não, não posso beijá-lo, não o amo. Não na boca. É necessário sentir algo que faz as mãos suarem, o coração bater forte. Infelizmente o que sinto agora não se parece nada com estes sentimentos.

-Rodrigo, você me ama tanto assim, a ponto de sonhar em poder me beijar?

-Muito mais que você imagina.

-Então...creio que posso realizar um pouco deste sonho?

-Como?! É sério. Diz, eufórico.

-Sim. Vou lhe proporcionar um beijo. Poderá beijar uma parte do meu corpo.

-A que eu quiser?

-Menos a boca. Precisaria sentir o mesmo para retribuir um beijo na boca.

-Agradeço sua sinceridade. Mesmo idealizando um beijo na boca, tocar uma parte do seu corpo já é o paraíso. Escolho a mão. Diz ao pegá-la mais firme.

-Tudo bem.

Rodrigo leva minha mão com cuidado aos lábios. Beija demoradamente parte do dorso, os dedos até virar a palma. Volta para o dorso e paralisa seus lábios como se sentisse o gosto da minha mão. Enquanto roça os lábios na pele da minha mão, o garçom chega com nossos pratos e começa a encarar Rodrigo e minha mão.

-Rodrigo, nossos pratos chegaram. Digo tentando puxar a mão de seus lábios.

-Tão rápido? Diz soltando minha mão com um beijo estalado.

-Licença, vou ao toalete. Preciso retocar a maquiagem.

-Você está lindíssima assim, além do mais a comida vai esfriar.

-Não vai. Está bem quentinha.

-Tudo bem. Estarei te esperando.

Dou meia volta em direção ao toalete e sigo rumo a escada que dá para a saída.

Já na rua, respiro fundo e aliviada ao acenar para o taxi. Abro a bolsa, desligo o celular e sorrio por ter trazido a carteira. Aí então, encosto a cabeça no vidro da janela.

-Para onde Srta?

-Para a minha casa, por favor!

Chegando em casa. Abro a porta e lá está o meu amor me esperando com um beijo daqueles que fazem meu coração bater mais forte e minhas mãos suarem e também, com um lencinho para limpar os resíduos dos beijos do velho Rodrigo que sobraram em minha mão.