Entre as linhas que cruzam o horizonte
Aqui nesse universo paralelo onde não se habita, todas as manhãs são iguais. De longe se avistam os dias passando diante dos olhos. As lentes das câmeras são como lupas, porém enxergam tudo menor. Os sons ecoam como numa caverna e ficam ali até serem captados, ou esquecidos. Todos os instantes são infinitos, apesar de nunca mais serem lembrados. Todas as noites são infinitas, apesar de nunca mais serem lembradas. Nada mais tem valor real, tudo é mutável. A vida acontece sempre no futuro ou no passado, o presente é um universo paralelo inabitado. -vale dos sonhos- foi como Tommy apelidou aquele lugar inexistente. Ficava entre as linhas que cruzam o horizonte, num pequeno espaço de tempo, dentro da memória ou da imaginação. Foi la onde eles se encontraram a primeira vez. Ela disse "vamos nos casar", ele bobo aceitou. Pegaram na mão um do outro e nunca mais soltaram. Com frequência, quando queriam conversar, se encontravam no vale dos sonhos. Ele disse " nós nos encontraremos outro vez", ela boba concordou. Desde então nunca mais se esqueceram um do outro, porém não mais se viram, desde a última vez. Ele disse " quando tu olhares para o céu e veres a lua, saberás que estou contigo". Ela disse "quando tu olhares para o céu e veres as estrelas, saberás que estou contigo". E se perderam em milhares de escolhas erradas e caminhos distintos. Marcaram de se encontrar no vale dos sonhos novamente daqui há dez anos. Já que os caminhos da vida lhe puseram em direções opostas e não mais puderam adentrar no vale, decidiram criar universos paralelos. Um paralelo ao outro, entre as linhas que cruzam o horizonte. Inabitados, com longas madrugadas à esmo, esperando as noites tornarem em dia as manhãs, observando pela lente de uma lupa a câmera filmar à distância suas vidas. Ouvindo ecos intermináveis de vozes que nunca calam. Desperdiçando as horas e os dias em seus universos vazios e solitários, atribuindo valores medíocres a fatos da vida, se perdendo em memórias e momentos infinitos que nunca mais serão lembrados assim como as noites e os dias também não. Olhando os dias passarem diante dos olhos como montanhas que vão se modificando às forças da natureza durante os séculos. E daqui há 10 ou mais, quando já tivessem esquecido um ao outro, tornariam, por obra do acaso( ou de escolha), após longos anos habitantes de universos paralelos, acabariam, dentro de uma memória do passado ( ou imaginação do futuro), cruzando pouco a pouco a fina linha do horizonte, onde de repente encontrariam-se, sem que percebessem, num lugar mágico, num pequeno espaço-tempo: o vale dos sonhos - foi como Tommy apelidou aquele lugar, onde se encontraram pela primeira vez.