WADDY, A MAGIA DO AMOR
PRÓLOGO
 
Waddy olha as duas sepulturas lado a lado, sem poder acreditar que sua vida acabou. Um terrível acidente tirou a vida do seu marido e do seu filho.
Rodolfo e Reinold, marido e filho, viajavam no crossfox preto, ano 2014, vindo de Aqueduque, o município em expansão do interior do Brasil.
Um velho caminhão, vindo em sentido contrário, quebrou a barra de direção e o motorista nada pode fazer. Todos que lá estavam morreram instantaneamente.
Waddy, com os olhos secos e apertados, pois acredita que todas suas lágrimas foram derramadas nos últimos dois dias. Não há pensamentos, não há som nem imagem que lhe comuniquem qualquer coisa que seja. Apenas sente um vazio infindável no peito.
Atirou uma única flor e voltou-se para o carro onde as irmãs do convento a esperava.
Em silêncio, percorreram a estrada que as levaria ao convento e Waddy vai refazendo sua vida, em memórias.
 
 
Capítulo I
 
O Casamento de Waddy e Rodolfo
 
O meu namoro com Rodolfo sempre foi quente. O nosso amor, cheio de paixão, colocava fogo em nossos corpos. Quando nos conhecemos, no início não gostava muito dele, pois o achava cheio de si e muito metido. Mas com o passar do tempo, fui vendo que era apenas um rapaz bem nascido e um  pouco diferente dos outros.
O nosso primeiro encontro foi para ir ao cinema, onde assistimos um filme de amor, que nem me lembro o nome. Ficamos de mãos dadas todo o tempo e ao final nos beijamos.
Depois passamos a namorar em casa, pois meus pais muito rígidos, não aceitavam que nos encontrássemos fora.
Na parte de trás da casa tinha uma varanda bem protegida dos olhares da vizinhança e lá podíamos nos beijar com vontade. Nessa época eu já terminava o curso de Formação de Professores e Rodolfo estava no meio do seu curso de Engenharia Civil.
Três anos após nos casamos e fomos morar numa pequena casa perto de meus pais. Rodolfo conseguiu um emprego na prefeitura de nossa cidade para comandar a construção de prédios e pontes.
Mais tarde, prestou um concurso para uma prefeitura maior, numa cidade mais distante, que ainda está em desenvolvimento, para comandar a construção das cercanias.
A situação financeira da cidade não é das melhores e a nossa vida segue o seu rumo.
Conheci o convento das freiras, que são responsáveis por ajudar a comunidade e é a única escola que funciona totalmente.
Para virmos para a cidade de Lagartos, interior de Minas Gerais, vendemos tudo o tínhamos e compramos um crossfox preto para a viagem. O dinheiro que sobrou foi colocado no banco para as nossas despesas mais urgentes.
No início pensei que nunca fosse me adaptar, pois lá falta tudo, tudo está ainda em construção, dando a impressão de fim e não de começo.
Sentia muita falta de papai e mamãe, que faleceram no período que sucedeu a nossa mudança e sentia um vazio muito grande.
Quando engravidei de Reinold, foi uma imensa felicidade, apesar de Rodolfo ficar muito tempo fora de casa, às vezes mais de uma semana, mas a construção da ponte maior da localidade precisava de vigilância constante, pois ao menor sinal de fraqueza, os trabalhadores cruzavam aos braços e abandonavam a obra.
Quando Rodolfo chegava em casa era uma festa e nos amávamos com muito amor e fogo. Depois Reinold nasceu e Rodolfo conseguiu trazer o seu trabalho para perto de casa, na construção do posto de saúde e de uma pequena escola.
Nossa vida era simples, mas feliz. Aguardava ansiosamente a volta de Rodolfo, lá pelas dezoito horas para o jantar.
Reinold cresceu e juntos fomos para escola. Ele pra o Pré-escolar e eu para lecionar numa turma multiseriada. Na parte da manhã ajudava as freiras na educação das crianças do orfanato, uma atividade voluntária.
O salário não era muito, mas com o que Rodolfo ganha e com as nossas economias fomos vivendo bem.
 
 
Capítulo II
 
A Roda da Vida
 
Em nossa vida, a maior dificuldade era com o clima aqui em Lagartos. Dias de muita chuva enlameavam o lugarejo, deixando-nos ilhados grande parte da semana. Costumávamos deixar a despensa sempre cheia e até óleo para as lamparinas, pois a baixa tensão da energia não resistia aos temporais e ficávamos no escuro por muitas horas.
Nesses dias a leitura era nossa única distração. Ainda bem que Reinold sempre gostou de desenhar e escrever. Assim nunca deu grandes problemas por ficar confinado. Durante esse período ficávamos sempre sozinhos, pois Rodolfo não podia abandonar as obras.
Reinold também gostava de pipas e construíamos muitas, que soltávamos quando o sol aparecia radiante. Uma pequena elevação nos permitia subir e soltar nossas pipas ao vento. O sorriso de Reinold rivalizava-se com o sol.
A vegetação luxuriante a nossa volta completava um cenário de beleza e perfumado ambiente.
Após a escola dávamos longas caminhadas e colhíamos flores para enfeitar a casa. Quando Rodolfo voltava sempre encontrava flores pelas jarras a enfeitar e perfumar tudo.
Num feriado prolongado, Rodolfo e Reinold foram até Aqueduque para comprar uns suprimentos que faltavam em casa. Enquanto isso, aproveitava para fazer uma faxina e adiantar o almoço, que seria completo quando os ingredientes chegassem com os dois.
Mas, eis que a roda do destino girou ao contrário e tirou-me tudo o que tinha, estupidamente.
Um caminhão, vindo em sentido contrário, quebrou a barra de direção e o motorista avançou para o nosso carro, pegando de frente. Rodolfo, ao volante, mesmo com cinto de segurança, bateu o peito com violência no volante e Reinold, também com cinto, mas esse se rompeu com a violência da batida.
Perdi os meus amores, a minha vida e agora estou aqui diante de suas sepulturas, numa cena derradeiramente triste.
 
 
Capítulo III
 
Em casa
 
Waddy, seguiu com as freiras para o convento, ficando lá dois dias para descansar. Depois negou-se a atender qualquer pedido que lhe fora feito para ficar mais tempo.
_Irmã Célia, minha quase mãe, eu preciso ir para casa. – disse a moça, com voz sumida em lágrimas. – Preciso enfrentar a minha dor sozinha. Caso não agüente ficar só, eu volto. Assim fez Waddy, despedindo-se com um abraço apertado nas cinco mulheres que ficam no convento, tendo Irmã Célia como superiora.
_Então vá, minha filha, que Deus a abençoe e sabe que pode contar conosco sempre for preciso.
_Vou arrumar as coisas aos poucos e tenho todas as providências a serem tomadas junto à prefeitura e para o recebimento do seguro por acidentes. Tenho que procurar alguém que possa me ajudar. Mas farei tudo devagar, de acordo com as minhas forças. Infelizmente nem Rodolfo nem eu temos mais parentes. Assim, além de vocês, minha família do coração, não tenho mais ninguém.
_Sim, filha, sabemos de tudo, por isso estamos a sua disposição para o que precisar. Para lhe ajudar, lá na prefeitura, há o Sr. Orlando, um advogado já idoso, mas muito competente. Fale em meu nome e ele vai lhe ajudar em tudo.
Waddy foi para casa e chegando lá chegando, suspirou profundamente e girou a chave na porta. Quando abriu, sentiu o perfume das últimas flores que tinha recolhido, no dia que Rodolfo foi fazer as compras com Reinold. As lágrimas banhavam seu rosto e uma tristeza profunda tomou conta do seu coração.
Colocou uma chaleira para ferver e fazer um chá. Tomou-o lentamente, sentindo-se aquecer e refazer o seu interior. Comeu uns biscoitos e levantou-se para fazer o que precisava e não podia adiar.
Seguiu para a sala, onde Rodolfo tinha uma escrivaninha pequena abarrotada de papéis. Começou separando o que não mais precisava, jogando fora e selecionando os documentos necessários. Tudo estava bem arrumado, os documentos da casa, do carro, do emprego, tudo junto, como se ele soubesse que não fosse viver muito. Waddy colocou em uma pasta tudo o que precisaria levar à prefeitura.
No dia seguinte, chegando lá, procurou pelo Sr. Orlando, que muito gentilmente a atendeu e disse que solucionaria tudo o que ela precisava e disse-lhe que quando tivesse uma resposta a procuraria.
Passados alguns dias, o Sr. Orlando comunicou-se com Waddy e disse que as quantias as quais ela tinha direito já estavam depositadas em sua conta e que ela poderia passar para retirar os documentos comprobatórios.
Assim Waddy o fez, comprovando que o dinheiro a ajudaria a viver folgadamente por um bom tempo. Além disso, a pensão pela morte de Rodolfo a sustentaria bem.
Quando voltou para casa, antes Waddy comprou flores e foi ao cemitério levá-las para o marido e o filho.
 
 
Capítulo IV
 
E a vida continua
 
Passados três meses de luto, Waddy seguiu para o orfanato para conversar com as freiras sobre sua vida. Depois do período de licença por luto, ela tirou uma licença médica que estava para acabar.
Chegando lá, Irmã Célia a estava esperando, já com os planos todos prontos. Sua intenção é enviar Waddy para uma comunidade bem pequena, onde nenhum professor deseja ir, pois lá é tudo improvisado, educação, saúde, tudo falta e a população precisa de alguém forte e corajoso para levar um pouco de vida para aquela região.
_Mas irmã, como poderei viver lá, assim nessas condições?? – perguntou a moça nervosa.
_Waddy, trabalho intenso é justamente o que você precisa nesse momento. Lá você não vai ter tempo de pensar em tudo o que aconteceu. Vai continuar recebendo o seu salário de professora e terá casa para morar. Pode alugar a sua, ou deixar para vir nos fins de semana e feriado, até resolver se volta para cidade grande ou se vai ficar aqui mesmo.
Waddy ficou olhando para irmã Célia com as mãos delas entre as suas e lágrimas nos olhos.
_Olha, irmã Célia, vou pensar na sua proposta e depois dou uma resposta.
_Sim, querida – disse sorridente a freira.
Waddy foi para casa com a cabeça em polvorosa, pensando no que faria.
Dois dias mais tarde, voltou ao convento e disse para irmã Célia que aceitava sua proposta. E que se por acaso não gostasse voltaria para ficar.
Arrumou o que levaria, apenas suas roupas e material didático, pois foi informada que lá nada existia, pois ninguém se preocupa com a comunidade.
Organizou livros de colorir, estórias infantis e folhas soltas para diversas utilidades.
Finalmente, colocou os papéis coloridos de pipa e as varetas, que Reinold tanto gostava. Nesse momento parecia ouvir a gargalhada feliz e farta do menino, sentiu uma dor como uma faca cortando seu coração.
Pela manhã, a perua do convento já estava esperando para ser carregada e a própria irmã Célia para levá-la a Pocinhos, sua nova comunidade e lar.
 
Capítulo V
 
Pocinhos, uma nova vida
 
 
Quando lá chegaram, Waddy nunca podia imaginar tamanha desolação. As casas, de pau à pique, com muito lixo a volta e água parada e suja. O lugar mais limpo na região é aonde fica a igreja e a escola, entre elas uma pracinha com duas árvores quase secas e uns bancos quebrados.
Waddy entendeu porque nenhum professor quer trabalhar naquele lugar. Há muita coisa a ser feita e pouca ajuda para tal.
A casa ao lado da escola é pequena, de madeira e tem um aspecto novo, apesar de muita poeira e folhas mortas na varanda.
Dirigiram-se para igreja e foram falar com padre Inácio para cumprimentá-lo e apanhar a chave da casa. O padre, um senhor já idoso, abraçou Waddy com carinho, dando-lhe as boas vindas.
_Minha filha, espero que seja muito feliz em nossa comunidade. Já deve ter visto que a vida aqui não é fácil, mas vamos vivendo.
_Padre, obrigada pelo seu carinho. Preciso realmente de muito trabalho para preencher a minha vida vazia.
_Sim, minha filha, já estou sabendo de tudo pela nossa querida irmã Célia. Com certeza teremos muito trabalho por aqui.
Apanharam a chave e foram todos juntos descarregar os pertences de Waddy.
Depois de tudo descarregado, todos foram a casa do padre para tomar um café. Após as despedidas, irmã Célia voltou para o convento e Waddy ficou em companhia do padre Inácio.
Em seguida, Waddy disse ao padre:
_Olha, vou para casa fazer uma limpeza rápida para jantar e tomar banho e amanhã procurarei alguém que possa me ajudar e colocar tudo em ordem.
_Vá, querida e venha jantar comigo, pois assim não ficará tão cansada logo no seu primeiro dia aqui.
_Obrigada, padre Inácio, virei com prazer. – disse Waddy retirando-se.
Waddy chegou em casa e foi percorrer os cômodos. A casa é composta por dois quartos, sala, cozinha, banheiro e uma varanda nos fundos, bem graciosa. Diante da porta da sala, uma pequena varanda apenas para resguardar a porta do sol e da chuva e um espaço que cabe apenas uma mesa com cadeiras.
A varanda dos fundos abre-se para um pequeno terreiro com árvores frutíferas quase secas. Nada de flores, nada de horta, nada de verde. Waddy percebe que pelo menos água tem bastante, o que já é de grande ajuda.
No final da varanda há um quartinho onde ela encontra material de limpeza, vassouras, panos de chão e espanador.
A mulher começa a faxina e em pouco tempo a casa toma uma outra forma. A vizinhança começa a se aproximar, curiosa de saber quem é a nova professora. As crianças olham de longe, mas não se aproximam.
Após o banho, Waddy dirige-se para a casa do padre que já a espera com a mesa posta para o jantar. Míriam, a moça que cuida de tudo recebe Waddy com carinho e a convida para entrar.
_Padre, porque as crianças não se aproximam daqui da casa e da igreja? – pergunta a mulher.
_Minha filha, a comunidade aqui é muito difícil, as pessoas são muito pobres e todos trabalham no plantio. Tudo o que produzem vai para a cidade grande, levada pelos grandes mercados, ficando apenas o que não é vendável. As famílias não podem nem mesmo escolher o que comer. A saúde é precária e ninguém quer ensinar na escola. Assim as crianças ficam perdidas pelas ruas enquanto os pais trabalham para lhes dar o que comer. Como podem ter interesse em religião ou mesmo por alguém que chega aqui, sabendo que logo vai embora??? – diz o padre abanando a cabeça com tristeza.
_Compreendo, padre. Mas com certeza, estou disposta a fazer algo por essa gente, para que melhorem de vida.
_Que bom, filha. Precisamos de alguém com coragem para enfrentar essa situação e a pobreza dessa gente.
 
 
Capítulo VI
 
O Carisma de Waddy
 
Dois dias depois de sua chegada, era sexta-feira e Waddy foi fazer uma limpeza na escola. Uma casa um pouco menor que a sua, dividida numa sala grande, com quadro de giz, uma cozinha, dois banheiros e um depósito onde ficam guardados os materiais de limpeza de um lado e os materiais para aulas no outro, se bem que ambos estão quase vazios.
Limpou tudo, aproveitando o óleo de móveis de eucalipto, deixou tudo com cheirinho muito bom.
Contou vinte carteiras ao todo, com suas respectivas cadeiras, uma mesa para a professora. Nas paredes uns mapas do Brasil, com várias indicações e pesquisas.
Após a limpeza foi para casa pensando no que faria para atrair as crianças para a escola.
No sermão de domingo o padre faria uma chamada para os pais, mas como sabia que a freqüência nas missas é pequena, precisaria ter mais alguma idéia.
Quando chegou no quarto que transformou num pequeno escritório para o seu trabalho, Waddy viu os papéis de pipa de Reinold e uma grande idéia passou-lhe na cabeça, a de atrair as crianças com as pipas.
O fim de semana ficou por conta da confecção das pipas. Todas muito coloridas, com lindas rabiolas como o menino muito gostava. Às vezes, era preciso parar para secar as lágrimas, mas no final o quarto estava lindo e colorido, como o mais perfeito arco-íris.
Na segunda-feira após o lanche da tarde, Waddy foi para a escola e num terreno vazio ao lado, encontrou algumas varas de bambu que fincou uma ao lado da outra, guardando uma certa distância. Notava que ao longe algumas crianças a olhavam, curiosas com o que estava acontecendo, mas não se aproximaram.
Waddy, fingindo que não as estava vendo, continuou sua arrumação e ao terminar de fincar as varetas no chão, foi em casa buscar as pipas.
Aos poucos, começou empinar uma a uma e conforme subiam ia amarrando nas varas fincadas pelo chão. Aquela atividade encantou tanto as crianças, que elas foram se aproximando devagar. Ela foi passando as linhas para as mãos das crianças, sem olhar para elas, como se nada tivesse acontecendo.
E foi desamarrando as pipas e entregando para as crianças.
E uma linda reunião de meninos e meninas formou-se ao lado da escola.
O sol vai se pondo, dourando toda a campina com os seus últimos raios, e a criançada feliz vai recolhendo suas pipas devagar. Ainda há algumas no ar, sustentadas pelos mais velhos, mas os menores já estão cansados.
Quando todas as pipas estavam no baixo e nas mãos das crianças, Waddy começou a falar:
_Boa tarde, meu nome é Waddy e sou a nova professora. Hoje tivemos a nossa primeira aula, onde aprendemos a união entre as pessoas, a solidariedade e a capacidade de trabalharmos juntos.
Amanhã será o nosso primeiro dia na escola. Quero todos vocês as 8:00h para começarmos os nossos estudos. Todos os dias, quando estiver sol e vento, podemos tirar um momento de recreio para soltarmos pipas. Cada um vai levar sua pipa para casa e trarão amanhã.
Avise a seus pais que vocês começarão a estudar e quem quiser falar comigo, estarei aqui na escola para atender a todos.
Agora vão para casa e até amanhã.
Todos responderam e foram felizes para casa.
Waddy foi até a escola e apanhou alguns documentos que lá estavam para tomar ciência da situação dos alunos ali registrados.
 
 
Capítulo VII
 
O Primeiro Dia de Aula
 
Sete da manhã em ponto, Waddy dirigiu-se para a escola e começou a tomar as providências para receber os alunos. Pelos documentos que encontrou, apenas 10 alunos estavam registrados, todos com a idade entre 10 e 12  anos. Quanto aos menores não havia nenhum registro. São seis meninos e quatro meninas.
Pela idade, achou que poderia colocá-los no mesmo núcleo de aprendizado, pois com certeza já sabiam alguma coisa, de onde ela pudesse começar.
Fez uma lista de chamada com os nomes registrados e aguardou a chegada dos alunos.
Oito em ponto, ouviu os pezinhos no degrau e uma batida na porta. Waddy levantou-se, abriu a porta e os convidou para entrar.
_Bom dia, meus alunos. Sejam muito bem-vindos. Vamos sentar.
_Bom dia, professora. – responderam todos juntos.
Waddy ficou muito satisfeita com a presença de algumas mães e um pai junto com as crianças.
_Entrem, por favor, vamos nos acomodar.
_Meu nome é Waddy e sou a nova professora. Agradeço a presença de todos e quero dizer que estou a disposição de todos sempre na parte da tarde para podermos conversar melhor. Os seus filhos ficarão até as 11:30 h. Temos leite e biscoito para a merenda e receberemos uma entrega da igreja e depois da Prefeitura de Lagartos. Agora os pais podem ir e seus filhos ficarão bem.
Enquanto falava, Waddy sentiu um olhar fixo sobre ela e quando levantou a cabeça viu um negro alto, forte, com um sorriso luminoso e um cabelo encaracolado negro e brilhante. Pela primeira vez, desde a morte de Rodolfo, sentiu um pulsar diferente no coração. Na mesma hora veio os seus amores na sua cabeça e a imagem se desvaneceu.
Os pais despediram-se e ficaram de voltar pela tarde para uma rápida reunião.
Os alunos acomodaram-se nas carteiras e Waddy contou mentalmente vinte crianças de diferentes idades e tamanhos.
_Crianças, agora vou fazer a chamada para saber quem já está matriculado na escola.
Iniciou a chamada e os 10 alunos matriculados estavam presentes. Os outros 10, mais novos, foram falando seus nomes e colocados na chamada.
Waddy os dividiu em duas classes. Os mais velhos foram avaliados na leitura e escrita e os menores começaram com os desenhos para completar  e pintar.
Entre as crianças menores Waddy observou um casal de negros lindos, com um sorriso muito branco e alegre, muito falantes e que gostam de pintar. Pela aparência acha que são filhos daquele homem que a olhou tão intensamente. Resolveu esperar pela reunião para saber os nomes e quem são os pais.
Quando eram 10 h, Waddy preparou um leite forte e serviu com os biscoitos que foram mandados pela igreja para os alunos.
Na reunião com os pais, conversaria sobre as refeições salgadas que deveriam ser servidas para eles até que a Prefeitura fizesse a entrega da merenda escolar.
Terminando o primeiro dia de atividades, os alunos foram para casa e os pais vieram para a reunião. Pegando cada um a sua pipa, foram para o campo aberto divertir-se um pouco.
 
 
Capítulo VIII
 
Waddy e sua comunidade
 
Quando os pais chegaram, Waddy já tinha um café fresquinho para servir a todos. Nesse horário apareceu um número maior e assim a conversa fluiu mais facilmente. O padre também foi chamado para participar.
_Boa tarde a todos, começou a professora a falar.
Primeiramente, meu nome é Waddy e com certeza, pretendo ficar aqui por muito tempo. A minha vida está na Educação e quero fazer algo por essa comunidade. Assim não irei embora tão cedo, disse sorrindo.
Tenho em mãos a lista dos alunos que vieram hoje e alguns, principalmente os menores, ainda não estão matriculados. Aqueles que eu citar o nome deverão apresentar os documentos da criança e a carteira de vacinação em dia para procedermos a matrícula.
Gostaria também de saber como podemos fazer para servir a merenda a eles enquanto a Prefeitura não faz a entrega da merenda escolar. Acredito que até o final dessa semana a entrega seja feita. Caso não consigamos alimentos suficientes, serviremos leite com biscoito enquanto tiver e eles sairão mais cedo da escola.
Os pais começaram a conversar entre si e um pai levantou a mão e pediu a palavra.
_Com licença, professora. – pediu a palavra Pedro o pai dos gêmeos.
_Sim, senhor, pode falar – disse a professora, sentindo sobre si aqueles olhar penetrante.
_O meu nome é Pedro. Somos uma comunidade pobre, mas acho que juntos podemos resolver a merenda para essa semana. Somos plantadores e podemos pedir aos armazéns que cedam parte da produção para a escola. Assim acho que uma sopa vai estar garantida. – disse Pedro, sorrindo.
_Muito bem, senhor Pedro, fico muito feliz em saber disso. – disse Waddy, sorrindo também, achando boa a reunião.
O padre tomou a palavra e disse que o macarrão seria enviado pela igreja e Waddy incumbiu-se dos temperos. Assim ficou resolvida a merenda escolar da semana. As mães fariam um mutirão e se revezariam no preparo da comida.
No final da reunião os pais retiraram-se e Pedro ainda ficou um pouco, perguntando sobre o material necessário para os gêmeos estudarem. Enquanto falava, Waddy olhava fixamente par ele como que hipnotizada com aquele sorriso.
_Pode ficar despreocupado, Sr. Pedro. As crianças não precisam de nada. Temos tudo aqui que precisamos. Quero apenas a presença deles e dos pais, quando for preciso.
Pedro,sempre sorrindo, agradeceu e foi embora.
 
Capítulo IX
 
E a vida continua
 
Passados os dias, Waddy lançou-se no trabalho e as crianças foram desenvolvendo muito bem. Waddy foi à Prefeitura e acertou sua estadia permanente em Pocinhos. A prefeitura fez a entrega da merenda escolar e o material pedagógico necessário.
A leitura e a escrita dos pequenos melhoravam a olhos vistos e todos estavam felizes.
O ano letivo ficou restrito a nove meses apenas, tendo em vista que o começo já estava atrasado, em março. Quando chegou dezembro, Waddy preparou a festa de fim de ano para os alunos e os pais.
Na semana final, recebeu a visita de Pedro, que veio oferecer-se para ajudar na organização da festa.
_Dona Waddy, vim me oferecer para ajudar na festa. Estou pronto para o que for preciso. Subir em escadas, colocar lâmpadas, bandeirinhas e o que for. – disse o sempre sorridente Pedro.
Waddy sentiu um aperto no peito ao imaginar aquele sorriso somente para ela, com amor. Assustou-se, pois em novembro fez um ano que perdeu sua família, como pode estar pensando em outro homem??? – Mas ainda assim o sentimento vai tomando um vulto muito grande.
_Professora, o que a senhora vai querer para a comemoração??? – perguntou Pedro.
_Ah, Sr Pedro, vou querer uma árvore de Natal bem grande, com muitas lâmpadas e aqueles fios brilhantes e coloridos. No sábado pretendo ir a cidade para comprar o que vamos precisar.
_Se a senhora me permitir, sábado é minha folga e tenho um carrinho velho, mas bem conservado, e posso levá-la para fazer suas compras.
Waddy olhou para ele e disse:
_Mas o senhor não sai com sua família, sua esposa???
_Professora, eu sou um homem viúvo e vivo para os meus filhos. Os gêmeos tomam todo o meu tempo junto com meu trabalho. Não tenho tempo nem vontade de namorar ninguém. – disse encabulado o homem.
_Então, está certo, Sr Pedro, eu aceito.
_Apenas gostaria de pedir uma coisa, pode me chamar pelo nome, Waddy e eu o chamarei de Pedro, pode ser???
_Claro, Waddy, disse o homem saboreando as letras com seus lábios grossos e sorridentes.
Quando Waddy ouviu o seu nome ser pronunciado sentiu aquele frio na barriga de sempre.
No sábado, Pedro, Waddy e os gêmeos Paulo e Ana Paula, foram até Lagartos para as compras para a escola e para a casa dela.
As crianças que quase nunca saem de casa, ficaram de olhos arregalados com tudo o que viam e apontavam para tudo, rindo felizes.
Aos olhos de quem via pareciam uma família em compras de natal.
Encontraram tudo, para preparar uma linda festa. A árvore será feita de um galho verde de pitanga plantada no terreno de Pedro.
Foram para casa felizes como nunca.
 
Capítulo X
 
Natal na Escola
 
A escola está muito bem arrumada. Pedro fez a maioria dos trabalhos pesados, deixando tudo pronto, após o seu horário de trabalho.
Waddy ensaiou com os alunos várias músicas e poesias para a apresentação para os pais. A igreja e a prefeitura enviaram presentes para serem distribuídos para as crianças.
Após a festa fui para casa para preparar a ceia de amanhã. Pedro e as crianças aceitaram cear comigo, assim como o padre Inácio. Tenho um bom pernil, um tender e vinho, assim como refrigerante e suco para as crianças.
Sei que parece um pouco de exagero de comida, mas sempre aparece mais alguém para participar. Aqui vivemos como uma família, depois que conseguimos melhorias para a comunidade. Agora as pessoas me acolhem em tudo. A limpeza das ruas melhorou muito e ninguém mais joga lixo no chão. As crianças tornaram-se guardiães da limpeza e da praça que estamos construindo com nossas próprias mãos. Está ficando muito bonita.
Hoje, vinte e três de dezembro, começo a cozinhar . Quero deixar tudo pronto para amanha, assim terei somente que aquecer. Deixarei apenas a sobremesa para fazer amanhã cedo. Será o segundo natal sem Rodolfo e Reinold. No entanto, sinto essa dor amenizada pela presença de Pedro, as crianças e os vizinhos aqui em Pocinhos. Aquilo que passei nunca se apagará, mas hoje vejo uma luz em meu futuro, pois sinto que posso amar novamente. Pedro tem me lançado uns olhares radiantes e o seu sorriso me enche de calores. As crianças Paulo e Ana Paula me aceitam com carinho, sempre me beijam e abraçam.
O cheiro dos assados invade a casa e o calor do fogão deixa a casa aquecida. Apesar de estarmos no verão, a chuva e o vento têm sido insistentes, deixando o ambiente frio.
Sigo fazendo as receitas até que me dou por satisfeita e tomo um bom banho para me deitar.
 
Capítulo Final
 
Uma Linda Noite de Natal
 
Amanhece e levanto-me bem contente. Tomo um bom café e lanço-me no preparo das sobremesas. A chuva deu uma trégua, mas o friozinho permanece.
Hoje Pedro vai para as últimas entregas dos alimentos para os mercados e depois está de folga até o dia vinte e seis.
Daqui a pouco as crianças vão chegar para me ajudar na arrumação da casa para a ceia. Deixarei que durmam mais um pouco e depois os buscarei para que fiquem aqui.
Penso em Pedro, enquanto preparo a massa para as tortas. Farei uma de limão e uma de morango, que é a preferida pelas crianças. Espero que hoje ele tome coragem de falar comigo, rsrsrsrsr.
Ele é muito tímido e apenas aconteceu um beijinho simples e ele logo se afastou e não o vejo de perto desde aquele dia. Mas, mesmo de longe sei o que o meu corpo me diz. Quero esse homem para mim, para sermos felizes juntos.
Vou buscar as crianças enquanto as tortas assam. Já coloquei as bebidas para gelar e terminei a limpeza da casa.
(...)
 
Enquanto faço as entregas, penso em Waddy. Essa mulher maravilhosa em tão pouco tempo mudou a minha vida. Desde que minha Anna morreu, nunca havia me interessado por mulher nenhuma, apesar de muitas terem tentado. Preferi cuidar dos meus gêmeos, que se tornaram minha vida.
Mas agora acho que a vida está me dando uma nova chance e quero agarrá-la com unhas e dentes.
Vou pedir a Waddy em namoro e quem sabe, mais tarde, em casamento.
Finalmente termino as entregas e volto para deixar a caminhonete na fazenda de produção.
Chego em casa, tomo um banho e visto minha melhor roupa. Está na hora de ver minha mulher e meus filhos, penso sorrindo.
 
 
_Tia Waddy, o papai chegou. – disse Ana Paula correndo e gritando.
_Entre Pedro. – digo encabulada. Pareço uma adolescente recebendo o primeiro namorado.
_Waddy, trouxe essas flores para enfeitar a mesa da ceia. – diz o homem sorrindo.
Pego as flores e abro melhor a porta para ele entre. As crianças estão vendo um filminho de Natal na TV e comendo um lanchinho.
_Veja, Pedro, já preparamos tudo, comida, bebida, sobremesas, tudo pronto. – digo sorrindo como boba.
_Puxa vida, vocês prepararam comida para um batalhão e eu estou com muita fome.
Venha, vou servir algo para você na cozinha, pois aqui na mesa é proibido mexer antes do Papai Noel. – digo para ele.
 
Quando chegamos na cozinha, Pedro me leva bem perto da porta e me beija apaixonadamente.
_Waddy, você me aceita como seu namorado, parceiro, amante, tudo??? – pergunto nervoso.
_Sim, meu amor, meu Pedro, meu amante e amigo. Quero ser uma segunda mãe para os nossos filhos, e nunca vou deixá-los esquecer de sua mãe Anna.
_Obrigada, meu amor. Eu não esperaria outra coisa de você. Depois que as crianças dormirem vou  mostrar o quanto a amo de verdade.
 
FIM 

Regina Madeira
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Regina Madeira
Enviado por Regina Madeira em 11/12/2015
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