Amor de Pé de Manga
Existem lugares onde não há complexidade no amor, principalmente, se for onde os prédios e a rotina ainda não consumiram. Uma escritora decepcionada com o amor e farta de tudo, deixou papéis e grampeadores, e partiu em rumo a zona rural em busca de campos e de melhores perspectivas. Instalou-se na pequena cidade, em frente a uma praça e uma igreja que tocava música sacra para marcar a cada hora que o relógio contava.
Tomando uma xícara de café na singela pousada, avistou da janela do quarto 5, um casal na pracinha de mãos dadas e com o rosto encostado, olhavam um para o outro e sorriam sem dizer uma palavra, e quis entender a inocência e profundidade desse amor. Encerrou seu café, pegou o gravador e saiu em direção a pracinha com algumas perguntas, ansiando para que eles lhe dessem uma nova reportagem ou uma nova perspectiva do amor. Conversou com os dois que sorrindo não se importaram em responder as perguntas.
Primeiro perguntou a ele o que ele achava que era amor, e docemente ele respondeu: “_Ah, o amor é quando você sobe lá em cima do pé manga, e pega a mais bonita para moça, é quando o sorriso duma pessoa vai lá no fundo do peito e dá uma torcida que parece que vai lhe faltar o ar. Talvez o amor seja um cadinho de ternura mais uma porção de carinho, que juntando dá um tantão de sorriso. É que nem quando cê come uma tainha de queijo com um pedacinho de goiabada, se você se comer o queijo sozinho, é bão, mas cum goiabada é melhor ainda, e os dois juntos não tem combinação mais perfeita!"
E ela completou que “quando você ama o coração dá um monte de pulo, dá vontade de olhar para o céu todo dia abraçadinho com ele, fora que você custa a falar, e quando fala vem um tanto de assunto que às vezes céu acha até meio bobo, mas quem diz que você consegue falar doutras coisa? Tem coisa mais linda que vê o olho dele com a luz da fogueira, pertim, quietim, abraçadim com cê? E debaixo da árvore na sombra, depois de correr no meio do pasto, brincando de pegar e conversando sobre os filhos que quer ter, aí a gente põe nome nos bichos tudo, nas vaquinhas, cavalos e galinhas. O tempo vai passando e a tardezinha vai caindo, e você pensa que nunca foi tão feliz...”
Olhando para o rapazinho, ela segurou com mais força suas mãos e contou que “o amor dá frio na barriga, treme os pés, sua as mãos, perde a voz, e te dá uma vontade rir a toinha. Mas quando ele não te quer, você pensa que não passa daquela noite, parece que tá vendo sua tristeza no reflexo do rio, acha que as coisas não têm mais cor, e a brisa do pasto nem te refresca mais, porque ele não percebe a sua tristeza.
O ar te aperta à garganta, dá vontade de chorar e de largar tudo, quer pegar o cavalo e correr até que ele e nem você, tenham mais força. A vontade é somente de ficar na beira do rio e até anoitecer, esperando que quando for dormir, possa sonhar que ele venha te ver, e contar que você é a coisa mais linda que ele já viu, e que nunca mais vai te deixar.”
Ele sorriu embaraçado com alguma dor recente, mas já superada, e disse que “cada música que toca no rádio parece feita para você, às vezes quer dormir para sonhar com ela, e quando ela não está, volta aquele vazião que todo mundo percebe porque você está no meio do povo, mas com os pensamentos longe. A mãe percebe o que você sente e só ri, e diz que quando se é menino as coisas são mais bonitas, mas sempre diz que tem que tratar a moça bem, porque moço educado recebe qualquer carinho.
Depois você vai se acostumando com a vida, mesmo assim, ela consegue lembrar das florzinhas do casamento, da música que tocava e do jeitinho embuchado do pai olhar para ela, e que amou mais quando ele disse que ela era morena do sorriso mais bonito que ele já tinha visto. Ela conta que o pai era um rapaz forte, que gostava de ajudar todo mundo, não gostava de má criação e que pediu ela em casamento com uma flor amarelinha que tinha apanhado.
Ah, o amor é isso, é quando ocê passa a gostar mais de alguém do que de você mesmo, quando cê deixa alguém tomar conta da sua vida e das suas coisas, porque ocê sabe que ela vai cuidar bem. Sabe que quando a chateação bater, ela vai estar lá com os braços abertos te esperando, e naquela hora você vai perceber porque que nasceu, e a bondade de Deus te dar tanta alegria de poder ver ela, de saber que ela sempre vai estar lá, e saber que o melhor disso tudo, o que mais te conforta, é que o sorriso mais lindo que ela tem, agora é por você.”
A jovem da cidade tinha todas as suas perguntas respondidas em uma só, sentia que a simplicidade a conquistara, não poderia ter pedido melhores respostas, principalmente porque seus olhos agora iluminados, pareciam refletir sua cura. Não havia amado ainda, tudo fora complicado, tudo havia sido maior que o suposto amor, carreira, hobbies e tempo.
Agradeceu o casal, que despediu dando a ela uma florzinha do jardim, ela sentada na praça com a flor na mão, pode entender que não queria nada complicado. Enquanto isso na pousada, no quarto 6, um rapaz sorridente recém-chegado da exaustiva cidade grande, observava a linda moça que brincava com uma florzinha na praça.