O ÚLTIMO SOLDADO - 6 de 10
No intervalo de cada conversa, um momento de silêncio para Aura derramar lágrimas de seus olhos e para o olhar de Luan se perder nas mesas alheias.
- Deixa eu te ajudar, por favor...
Ele disse, colocando as mãos sobre a mesa e fitando o rosto molhado de Aura. Chegou mais perto dela e passou a mão em suas bochechas, secando as lágrimas.
- Deixa eu fazer isso... Não quero te assustar, apenas estou querendo te tirar deste mundo triste para o qual você correu.
Aura passou os dedos na margem dos olhos e levou o olhar até o janelão do outro lado, de onde dava para se ver a cor da noite e algumas luzes coloridas. Luan continuava olhando para o rosto dela, em sigilo. Depois recostou na cadeira e disse:
- Vamos?
Aura olhou para ele e assentiu. Luan pediu a conta e enquanto retirava o dinheiro da carteira Aura foi ao banheiro retocar a maquiagem. Lá, ela refletia em frente àquele objeto de vidro... E lembrava das palavras de Luan, aquelas que lhe fazia refletir por horas.
Luan a esperava lá fora, quando ela saiu do banheiro e sorriu para ele.
- Vamos.
Ela disse.
De volta ao carro, os dois não deram uma palavra por trinta minutos, até Luan estacionar o carro de frente à casa de Aura e eles descerem.
- Eu te acompanho até a porta.
Luan disse e a levou até a porta de casa. Aura agradeceu, dizendo:
- Obrigada pelo jantar... Me sinto bem melhor.
- Que bom saber disso. Bom... Vou te deixar descansar agora, pois acredito que não foi nada fácil para você suportar a minha presença.
Os dois sorriram. Luan chegou perto de Aura e tocando com a mão em seu braço, lhe deixou um beijo demorado de despedida bem na beira de seus lábios... Aura sentiu aquele beijo um pouco molhado, e sua pele rapidamente arrepiou. Luan sussurrou no ouvido de Aura:
- Tenha uma boa noite...
- Você também.
Ele voltou para o carro e se foi, deixando Aura imóvel em frente à porta.
Ao entrar, Aura jogou a bolsa no sofá e passeou pela sala, deslizando a mão nos móveis e objetos. Depois andou até a cozinha e reparou no vaso de flores sobre a mesa. Tocou suas mãos nas rosas e sentiu o perfume. Respirou profundamente e se sentou, ficou relembrando o jantar... Era a primeira vez que chegava a noite e as lembranças que vinham não eram de James. Quando foi para o quarto, se concentrou no espelho, era difícil não repará-lo, sempre se sentia obrigada a enfrentá-lo. No outro lado da cidade, neste mesmo momento, Luan também estava entrando em seu quarto e parando de frente ao espelho.
- Que linda...
Ele dizia, lembrando-se de Aura. E ela em seu quarto, nesse instante, dizia pensando em James:
- Você precisa esquecê-lo...
Luan encostava a cabeça no objeto de vidro e dizia:
- Eu quero você, Aura...
E Aura dava as costas ao espelho e deitava na cama. Pegava uma foto de James junto a ela... Luan deitava na cama e pegava o celular no criado-mudo, pensando em ouvir a voz de Aura pela última vez naquela noite, só mais uma vez... Aura olhava para o lado e via o celular vibrar. Ela atendeu, dizendo:
- Alô, Luan?
- Oi, Aura... Eu sei que não faz muito tempo que nos falamos, mas, eu precisava te desejar mais uma vez uma boa noite e dizer que amei nosso encontro.
- Eu também gostei...
- Espero que possa acontecer mais vezes.
- Se eu não tiver que comer peixe crú outra vez...
(Os dois riem).
- Você não gostou do prato, Aura?
- Estou brincando...
- Hahaha! Mas, falando sério, tá, sem brincadeira... Você estava linda...
- Obrigada mais uma vez (riso), você também estava bem elegante!
- Ops! Acho que tem alguém batendo na porta... É a dona Morgan. Caramba...
- Andou aprontando?
- Não, não... Mas, não sei se você me verá vivo amanhã (riso).
- Então boa sorte e boa noite!
- Até mais, Aura... Você desliga...
- Até.
Enquanto na cidade as ruas eram iluminadas por postes acesos, as trilhas da mata eram pretumes. De cima dos morros, onde se escondiam James, Dalton, o comandante Helton e um outro soldado de nome Fernando, dava para ver toda a região de baixo da mata e algumas luzes lá longe, decerto, as luzes das fogueiras dos acampamentos inimigos. Esses inimigos se tornaram alvo principal das forças do exército por sequestrarem e matarem cruelmente pessoas que não respeitavam e ignoravam seus costumes, religiões, origens e principalmente por explorarem demais seu espaço. Eram um tipo de grupo de terroristas e estavam sempre se arrastando para diversas áreas e fazendo novas vítimas, montando acampamentos e planejando novos ataques.
O comandante já tentara comunicação com a unidade militar pelo rádio, mas era inútil.
- Não consigo me comunicar com ninguém da unidade.
Ele disse. E Fernando falou:
- O comandante acha que também foram mortos?
- Não, acho que não... A não ser que tenham se arrastado para lá depois de tentarem nos matar.
- E até quando vamos ficar aqui, se eles não nos escutam pelo rádio?
- Até parecer seguro descer pela mata. Ao amanhecer, talvez.
- Quando tudo estiver em vista e for mais fácil eles nos ver?
- Eles pensam que já estamos todos mortos.
- Mas, e se forem para a unidade militar?
- Pelos céus, soldado! Chega de perguntas! Se eu disse que vamos descer ao amanhecer então vamos descer ao amanhecer! Entendido?
- Sim, senhor.
O comandante foi até Dalton, e vendo ele relaxar encostado a uma árvore, perguntou:
- Como está?
- Bem. Só doi um pouco... Mas vai passar.
- E James?
- Está ali do outro lado, vigiando.
O comandante foi ter com James. Ele estava com um binóclio, observando de longe os acampamentos.
- O comandante conseguiu se comunicar com a unidade?
- Não. Eles não ouvem o rádio.
- Muito estranho...
O comandante, olhando para o outro lado de onde eles vieram, avistou fumaça e disse:
- Soldado, o que é aquilo?
- James se virou e observou com o binóclio. Disse:
- Vem da unidade militar!?
- Onde há fumaça há fogo, certo?
- Correto... É fogo!
- Deixe-me ver...
O comandante pegou o binóclio e observou além da mata.
- O que se passa lá?
- Deve ser por isso que não ouviam o rádio.
- Certamente.
- E o que faremos agora, comandante?
- Voltaremos ao campo ao amanhecer.
Eles não dormiram, apenas Fernando chegou a cochilar um pouco, mas logo foi despertado pelo comandante com ordem de se levantar.
- Vamos descer a mata, levante logo!
O céu já estava clareando e fazia muito frio ali no alto, os soldados se puseram de pé e estavam prontos para descer o morro. Dalton precisou se escorar em James para caminhar, devido ao ferimento em suas costas. Eles refizeram a trilha da mata e se arriscavam estando despreparados para enfrentarem qualquer inimigo. Mas não tinham escolha. Todo o percurso foi de pura tensão e adrenalina, até que enfim conseguiram chegar no campo. O cenário era assustador! Os acampamentos militares, a tenda de pronto-socorro, os carros do exército, tudo estava totalmente destruido. O fogo já consumia grande parte do campo de unidade militar e se arrastava para a mata e por onde o comandante e seus homens passavam viam soldados mortos.
- Como isso aconteceu?
Falou o comandante, abatido. e Fernando disse para ele:
- Não sei. Mas de uma coisa eu tenho a certeza: Conhecíamos muito pouco os nossos inimigos.
Continua...