A BUSCA POR MEIO DA DOR

                        Aclibes Burgarelli.


 
Pensamento. Ao andar por caminhos pedregosos, não reclame diante de obstáculos naturais no terreno, das pedras pontiagudas que ferem os pés e dificultam os passos. Agradeça a Deus por poder caminhar com os próprios pés, ainda que devagar, porque a dor dos ferimentos com o tempo desaparecerá e o benefício do percurso surgirá. É a cura Divina.


Aflição e tranquilidade. Estados da alma que se alternam no movimento da vida humana, porque existe comprometimento do espírito com a matéria. Trata-se de simbiose, ou vida comum por causa da qual tanto o espírito quanto o corpo humano recebem benefícios, ainda que em proporções diferentes. As aflições são benefícios, desde que sejam entendidos como ganho ou proveito.

Para uma pessoa enferma que está presa exageradamente aos desejos materiais, uma dieta alimentar, por exemplo, mesmo necessária para evitar um mal mortal, para essa pessoa a referida dieta é interpretada como sendo algo terrível e motivo de tristeza ou sofrimento; contudo, para o espírito que encarnou nesse invólucro humano dessa pessoa, o desregramento alimentar que se está a evitar, lhe proporciona oportunidade de aprimoramento. O aprimoramento do perispírito, em última análise, implica igualmente no aperfeiçoamento do corpo humano, de sorte que, ambos, serão beneficiados.

Não se conhece alguém que seja exclusivamente alegria e tranquilidade, ou somente aflição e tristeza. Há, por vigência das leis naturais de Deus, necessariamente, alternância de estados emocionais do ser humano, mesmo que um estado tenha duração de tempo maior do que o equivalente; mesmo assim tudo passa e aquele estado será substituído por outro, com aceitação ou não de quem está envolvido.

Esse fenômeno se manifesta em todos os seres humanos e certamente tem razão de ser; por isso a necessidade de se atentar para os acontecimentos que marcam o dia a dia das pessoas, ao menos no planeta terra.

Feita a introdução espiritual, passe-se ao caso concreto, verdadeiro, porém com mudanças de situações, por motivos óbvios. No plano da espiritualidade, não importam nomes, locais, datas ou pessoas, mas sim a mensagem útil.

Silvério Arruda, o Arrudinha, pessoa idônea, de conduta ilibada, preocupava-se bastante com o que fazia. Sempre foi atento na busca de como acertar, de que maneira agir corretamente, diante de circunstâncias que surgiam; assim procedia, conscientemente, desde o momento em que acordava e se punha em pé para as tarefas diárias até o momento de, novamente, descansar.

Preocupava-se – e muito – nos momentos em que reinavam desalento, desesperança, frustração infundada e forte sentimento de desprezo pela vida, apesar de não desejar perdê-la antes do momento apropriado. Tinha absoluta certeza de que renegar a vida é forma de suicídio e, Arrudinha, não era suicida; ao contrário, amava a vida.

Profissionalmente fora um homem que soube enfrentar todos os momentos probatórios da vida, impostos a todas as pessoas as quais não os compreendem devidamente e não sabem que qualquer prova é aferição do grau intelectual, moral e, acima de tudo, o grau de espiritualidade.

É comum, no ser humano, ocorrer preocupações com a intelectualidade, com a moralidade, com a segurança financeira e estabilidade profissional, porque esses requisitos estão relacionados com os sentimentos puramente materiais e não espirituais. Já, no tocante às necessidades espirituais, estas não se manifestam no plano dos desejos humanos, mas no princípio Divino do progresso de todos os seres e de todos os planetas dos cosmos. Por conseguinte, poucos são os que detectam as necessidades espirituais e, por meio de provas, que também se aplicam nesse terreno, buscam galgar uma instância superior, melhor do que a anterior.

Material e profissionalmente não há do que reclamar Arrudinha. Porque foi disciplinado e metódico quanto às exigências para o sucesso, logrou êxito em todas as empreitadas sem se preocupar com a qualidade das tarefas que lhe eram determinadas em cada momento da vida e, registre-se que começou a trabalhar com pouca idade e não se tem conhecimento de que reclamasse ou rejeitasse trabalho. Antes, sentia satisfação e útil para a sociedade.

Foi pelo motivo de dedicação e firmeza de propósitos que galgou posição estável e, outrossim, permanente suporte financeiro para lhe garantir os últimos anos de vida, na condição de auditor fiscal aposentado.

Quanto ao relacionamento, Arrudinha vivia em união estável com Elvira, junto de quem recebeu o presente do nascimento de uma filha; a ela dedicava todo amor e carinho, tanto quanto dedicava todo amor e carinho à Elvira. Ele, contudo, tinha personalidade diferente da de Elvira. A personalidade dele já foi traçada linhas atrás; a personalidade dela, de modo diverso, era diametralmente oposta: sem disciplina na administração de sua vida, displicente com relação à saúde física – e muito mais a espiritual – imediatista e despreocupada com o amanhã. Tudo era feito de improviso ou de maneira mecânica; por conseguinte, de modo diferente ao que agradava a Arrudinha.

Jamais, durante toda sua vida, despertou a preocupação de aprimorar conhecimento para justificar sua condição humana, tampouco para obter discernimento que a pudesse conduzir à busca de aprimoramento moral ou espiritual.

No âmbito da vida material, sua estrutura psicológica era a pior possível, visto como não se preocupava com as causas que trariam consequências financeiras desastrosas, quer para sua sobrevivência ou mesmo para servir de exemplo aos seus descendentes ou parentes.

Vivia para um dia apenas, sem buscar exemplos nas causas passadas e no amanhã. Pouco lhe importava o amanhã, importante era o dia presente e, ainda assim, muitas vezes o renegava.

Nunca se preocupou com um quadro que Arrudinha pendurou na cabeceira da cama do casal, com os seguintes dizeres: “Agradeça a Deus por poder caminhar com os próprios pés, ainda que devagar, porque a dor dos ferimentos com o tempo desaparecerá e o benefício do percurso surgirá. É a cura Divina.”

Viviam bem em termos, porque Arrudinha, sabedor de que eventual separação não traria benefício à filha – e mesmo à companheira instável – cultivava muita paciência, para evitar que a família houvesse de ser lançada nos escombros de um relacionamento em desarmonia. É evidente que, às vezes, sem conseguir segurar, explodia, no entanto, imediatamente, recompunha-se e buscava estabilidade no cultivo da paciência. Paciência, de sua parte, é dádiva de Deus de um lado e difícil de ser apreendida, por quem não está preparado a exercitá-la, mesmo sem culpa do despreparo.

Em regra, as pessoas reservam uma dose pessoal de religiosidade para momentos de dor e esquecem que essa reserva deve ser usada também quando do amor. Por esse motivo e porque quem sofre ou está aflito usa da reserva somente nesses momentos de dor, o uso restrito é inadequado. Inadequado já que qualquer sofrimento é consequência de causa anterior e não há possibilidade de se afastar a consequência sem afastar a causa; e como a causa já aconteceu não poderá jamais ser afastada. Por via de consequência, melhor é zelar pela aceitação das consequências como forma de resgate; como forma de aprendizado para não errar novamente.

Quanto a Arrudinha, bom, mas despreparado para o exercício pleno da paciência e da esperança, não restava alternativa senão aguardar a tormenta passar para desfrutar a bonança que a substituiria, como sempre acontecia. Viver assim, no entanto, era muito difícil e não havia expectativa de bons tempos.

Alguém, em certo momento do qual ele próprio, Arrudinha, já não se lembrava, o aconselhara a socorrer-se e desabafar o desalento, quando desse estado estivesse acometido, por meio de cartas endereçadas a Jesus e aguardar, porque, com toda a certeza o pedido seria atendido e a resposta viria de modo muito particular.

Foi dito que a escrita, o conteúdo e o pedido de socorro ou orientação, seguiria o procedimento normal de se escrever uma carta; entretanto, essa missiva não seria postada e sim acondicionada secretamente em um local reservado com acesso somente por parte de quem a escrevera.

Observou que, se o ato fosse cumprido com fé, a resposta viria de alguma maneira; contudo, caberia a Arrudinha interpretar a resposta de Jesus, dado que, obviamente, seria indireta ou por meio de uma demonstração qualquer, a respeito de algo, em momento oportuno e até inesperado.

Segundo recomendado, esse procedimento íntimo atrairia força positiva, de algum ponto qualquer para aliviar o estado aflitivo, porque sempre há uma força Divina na expectativa de atender a quem pede com fé.

Arrudinha guardou na mente e no coração o conselho do bondoso amigo; no entanto não estava convencido de que o procedimento traria, de fato, os efeitos balsâmicos do amor de Jesus. Em consideração ao amigo, limitou-se a depositar no coração, a semente oferecida, a fim de que, quem sabe, um dia, se estivesse convicto, pudesse lançá-la em terreno fértil e esperar o resultado. A verdade é que, ao ouvir o amigo, bem-intencionado, naquele momento não estava convicto de nada, tampouco sentira-se afetado pelo bom conselho.

O tempo passou os conflitos não cessaram e a vida do casal era mais de brigas do que de paz. Elvira piorava a cada dia e já não tinha paciência com a filha e passou a maltratá-la, para em seguida, pedir-lhe perdão e cobri-la de beijos. A filha, Toninha, não entendia esse procedimento e despertou, no seu íntimo, causas terríveis de depressão e conflitos perigosos para o futuro da menina. A partir de então a criança padeceu de alteração de personalidade e essa situação de desarmonia foi terrível para sua segurança emocional. Transformou-se em pessoa instável e assim seguiu seu caminho, com suas provas.

Em diversas oportunidades Arrudinha deixou, às pressas o trabalho, para atender à companheira que, sem responsabilidade, envolvia-se em discussões no trânsito; quase sempre, era conduzida à Delegacia de Polícia, onde não mostrava equilíbrio mesmo diante da autoridade policial que não agia rigorosamente porque percebia o desequilíbrio da infratora.

Arrudinha era obrigado a se submeter à humilhação da mesma autoridade por causa de Elvira e tentava-se desculpar pelo escândalo.

Nuvens negras pairavam sobre o lar da família Arruda; prenúncio de desagregação; momentos aflitivos intensos. Que fazer? Orar; recorrer a Deus ou buscar auxílio médico para tentar ajudar a companheira e salvar a família?

Conversou com amigos reservadamente; com médicos conhecidos e com pessoas que também estavam em situação semelhante.

Vários amigos de Arrudinha conviviam no mesmo problema doméstico e recorreram a atendimento médico, a análise, a psiquiatria e, alguns, foram obrigados a recorrer ao isolamento em clínicas especializadas, dado que a vida em comum era impossível. Segundo o relato desses amigos, o tratamento em clínicas era violento e não havia expectativa de cura. Na verdade, em vez de cura física, natural, o tratamento medicamentoso era agressivo, quanto aos efeitos dos remédios a ponto de tornar o paciente apático e perdido no ar.

Arrudinha afastou, de pronto, a ideia de procurar ajuda médica especializada, ao menos no campo da psicoterapia ou psiquiatria, porque a personalidade de Elvira, arredia que era, a conduziria, por certo, ao suicídio e ele não pretendia, de maneira alguma, levar esse remorso consigo e abater de vez a minguada estrutura emocional da filha.

Exercia o cargo de funcionário público municipal, nas funções de auditor, designado para uma unidade localizada ao lado da Federação Espírita de São Paulo. Da janela de sua sala, quando em estado reflexivo, visualizava o movimento de pessoas na rua sem qualquer preocupação específica. Um dia resolveu observá-las com olhos diferentes, ou seja, não eram transeuntes ocasionais, mas pessoas que se dirigiam à federação. Concentrou-se nesse fato alimentou a curiosidade quanto ao objetivo daquelas pessoas.

Em uma segunda feira, logo pela manhã, Arrudinha estava irreconhecível; barba por fazer, olhar triste, voz baixa, gravata em desalinho, tudo a indicar que não dormira bem. Um colega de trabalho indagou se ele estava bem, ao que recebeu por resposta, um gesto de educação dado que não queria conversa; mesmo assim, disse que havia dormido fora de casa, no escritório de um amigo Contador, na Rua Riachuelo, e estava arrasado, não apenas física mas mentalmente. O colega já sabia o motivo e evitou entrar no assunto específico, contudo recomendou calma e sugeriu a aplicação de um passe, na Federação, que ele ficaria um pouco aliviado. Afinal a federação era ao lado da repartição.

Embora necessitado, nunca sentira atração por casa espírita, mas tinha certeza de que a aplicação de passe, sem compromisso assumido com a doutrina espírita, mal não lhe faria e pior do que estava não ficaria; ao menos o número de pessoas que entravam e saiam da federação demonstrava essa realidade.

Dirigiu-se, no mesmo dia, à federação; submeteu-se a uma entrevista de orientação e, confiante na recepção bondosa de uma senhora, desabafou e justificou a razão por que estava ali em busca de um passe. Atendido com muito amor, a bondosa senhora o orientou não apenas quanto ao desejo de receber as energias do passe magnético, mas da necessidade de realizar um estudo específico, para saber algo mais sobre a atividade espiritual nos casos das aflições humanas. Com estudo poderia encontrar um caminho adequado para conhecer as verdades da vida humana. Alertou ainda que esse caminho não era suave ou confortável; ao contrário difícil e com muitas pedras pontiagudas, de modo que o caminheiro padeceria de momentos terríveis no seu ser. Ainda assim, observou a bondosa senhora, tempestade é anúncio de bonança, contudo, a cada latejar de dor, certo é que um passo fora dado. Concluiu que a chegada ao destino será possível se muitos passos forem dados, ainda que com muito latejar, com muita dor e, às vezes, com desespero. No final, a luz será feita na plenitude do amor Divino, do mesmo amor pregado por Jesus. Essa é a verdade.

Arrudinha ouviu com atenção e emoção e até aceitou, porém, naquele momento, apenas buscava um pouco de alívio; a orientação foi guardada para ao depois. Foi-lhe aplicado um passe energético, com o qual veio a sensação de alívio. Ele próprio acertou consigo que receberia mais alguns passes a fim de que, restabelecido o equilíbrio, levaria sua vida normal. Na sua ignorância moral não via necessidade de se tornar um estudioso da doutrina espírita; tinha outros afazeres com que se preocupar – e já eram muitos. Acreditava na mediunidade, nos resultados espíritas e na fala bonita dos orientadores, contudo daí a se tornar um estudioso a distância era grande.

De fato, os passes foram salutares ao equilíbrio espiritual, porém não alcançaram Elvira; continuava ela em desequilíbrio e, ao contrário do que supunha o companheiro, no alívio que sentia com os passes, as crises aumentaram e ela se tornou mais violenta, mais descontrolada, então com prejuízo da saúde que a deixava com a chegada de doenças do corpo e da alma. Acrescentou-se ao desequilíbrio da mulher a mania de reclamar de dores, visto que se tornou hipocondríaca, sem disciplina para tratamentos. Acontecia um paradoxo: enquanto Arrudinha sentia certo alívio, a companheira, na mesma medida, aumentava seu estado de desespero e alucinações.

Já era tempo de se refletir a propósito do conselho recebido pelo colega da Repartição, quanto a escrever cartinhas a Jesus. A ideia, em princípio parecia absurda, mas bem pensada considerou que sendo o Mestre um ente Superior e Divino, algum resultado o apelo poderia trazer.

Comprou um caderno e deu início às cartinhas. A redação enchia-se de lamentos, de dor e algumas páginas do caderno ainda hoje revelam manchas de lágrimas que fluíam no momento da escrita.

Ao final de cada cartinha sentia alívio e relacionou esse estado com a atenção do Plano Superior no tocante ao seu sofrimento, ao socorro que clamava e ao desespero de escrever secretamente.

Assim procedeu em todos os momentos de aflição e, ao menos, naqueles momentos, uma luz se punha a iluminar seu caminho, porque se sentia ao lado de um interlocutor invisível que somente poderia ser, de fato, Jesus.

Passou a se interessar por literatura espírita e, segundo recomendação, firmou-se de início, no Evangelho Segundo o Espiritismo, com mensagens captadas por Allan Kardec, cuja leitura era feita logo após a escrita das cartinhas. Reparou que alguns trechos do livro direcionavam algo para o que havia escrito. Esses acontecimentos melhorou a maneira de ver a doutrina espírita.

O lar de Arrudinha, entretanto, transformara-se em um circo romano, em cuja arena se debatiam os gladiadores com o objetivo de matar para viver. Se dentre dois lutadores um permanecesse vivo, a cena seguinte era a manifestação do imperador pela vida ou pela morte. O público vibrava com os momentos da carnificina e ficavam felizes.

Assim era o lar do sofredor companheiro de Elvira que parecia estar em contenda com algum adversário – ou adversários – na expectativa de um resultado que lhe daria vida ou lhe daria a morte. O público invisível divertia-se e o imperador era desconhecido.

Após mais um dia de circo, em seu lar, o sofredor moço não aguentava mais e decidiu procurar algo mais eficiente na federação espírita, mais eficiente do que se submeter a um passe comum. Para tanto procurou a pessoa que o entrevistara na primeira vez em que lá esteve e não a encontrou. Desanimado, porque sequer sabia o nome da bondosa senhora, insistiu com a atendente para que ela verificasse algum registro da primeira visita.

Diante da insistência e da impossibilidade de localizar a primeira orientadora, a moça que o atendera indagou do motivo pelo qual ele tanto insistia em voltar a falar com aquela pessoa.

Arrudinha abriu o coração e com essa abertura lágrimas jorraram de seus olhos e o aflitivo estado foi prontamente percebido pela atendente que, condoída, encaminhou o sofredor a um setor de atendimento mais especializado para o caso.

Em uma sala não muito espaçosa, mas também não pequena, sob tênue iluminação de lâmpadas azuis, várias pessoas (homens e mulheres) estavam sentados em posição de concentração absoluta.

Solicitaram que Arrudinha se sentasse, no centro da sala, em uma cadeira e elevasse o máximo o pensamento em Jesus. Um círculo foi formado, todos de mãos dadas; uma moça simpática evocava a proteção de mentores para, em nome de Jesus, intercederem em favor de Elvira com participação de seu companheiro ali presente. Chorava copiosamente e, no íntimo, manifestava firme vontade de que os fluídos benfazejos alcançassem sua companheira e a fizessem perceber quão bom e suave é viver em união.

Houve uma espécie de diálogo entre a moça que orientava o procedimento, mas não se ouvia o interlocutor. No momento em que essa moça solicitou a alguém que procurasse compreender que estava errado o que fazia, com sua irmã; que mesmo com o desejo de estar ao lado dela como parente, devia ele entender que havia desencarnado há muito tempo, por afogamento cujo óbito ainda não havia percebido plenamente. Muita oração foi direcionada a esse sofredor, de modo que, pelo menos naquele momento, tudo indicava que a notícia dada a ele surtira algum resultado.

Após o trabalho realizado, foi revelado o que se passara. Uma pessoa do grupo esclareceu que foi instalada uma sessão de apometria , na tentativa de se saber a razão pela qual, no relacionamento do casal, a sofredora era Elvira, cuja saúde física estava em abalo profundo.

Foi dada a notícia de que o irmão carnal de Elvira, falecido há muito tempo, por afogamento no Rio Paraná, sem ainda perceber o que se passara, segurou-se na companhia dela, não para vingança, mas para convivência, o que é impossível entre desencarnado e encarnado, sem consequências como as que martirizam a irmã.

De modo geral, tornara-se esse familiar falecido um obsessor desequilibrado a desequilibrar a irmã, não por maldade, mas com uma espécie de ciúme de Arrudinha e da própria filha do casal.

Recomendou-se que Elvira passasse a frequentar uma casa espírita e se submeter a tratamento específico de desobsessão , por quanto tempo fosse necessário, para, somente ao depois, compreender o fenômeno e seguir, conscientemente, seu caminho com os frutos colhidos ao longo do percurso.

Concomitantemente, foi revelada uma verdade que afetara o casal. Arrudinha e Elvira espiritualmente são dotados de mediunidade na fase que exige conhecimento prático e dedicação em relação à caridade voltada a pessoas espiritualmente necessitadas.

Naquele dia, ao chegar em casa encontrou a companheira bem disposta, alegre e receptiva. Entendendo ser o momento oportuno para falar algo a respeito de tudo o que estava a acontecer de bom, com ajuda do plano espiritual, discorreu a respeito do que acontecera, evidentemente deixando de falar tudo, para não gerar desinteresse sobre o assunto.

Elvira ouviu atentamente e até mostrou vontade de comparecer a uma casa espírita para ser avaliada e, quica, receber algum tratamento. Na semana seguinte e já estando Arrudinha a participar de cursos na casa espírita, a companheira foi orientada para um tratamento espiritual específico. Surpreendeu-se com as considerações feita pela orientadora que a recebeu e mostrou firme propósito de completar o tratamento e retornar para avaliação a respeito.

A frequência resumiu-se apenas em um dia e não mais retornou Elvira, embora não criticasse, de algum modo, a boa intenção tanto do companheiro quanto da orientadora. Já era um bom sinal, porém tudo ficou nessa única visita.

Arrudinha não suspendeu o endereçamento de cartas a Jesus; não deixou de frequentar a casa espírita, tampouco deixara de ler obras relacionadas com a doutrina espírita.

Nos idos de uma época natalina, enquanto jantava, com a companheira e a filha, uma reportagem foi exibida na TV a respeito de um caso de solidariedade humana. A reportagem era bem apropriada porque a semana era de Natal. A reportagem era sobre um acontecimento muito triste que envolvia um casal e uma filha, nascida prematuramente, e sem qualquer esperança de vida.

A criança permaneceu internada, na UTI, durante três anos, local em que ora o pai ora a mãe ali permaneciam, enviando energia positiva para que a filha reagisse, a fim de poder viver em sua humilde casa junto aos pais. O desfecho da reportagem foi no sentido de que a criança superou as provas, os pais enfrentaram-nas com amor a Jesus e, conquanto a higidez plena da menina fora comprometida, ela vivia sob os cuidados e amor da família.

Elvira, ao ser lembrada de que a fé dos pais atuou intensamente nos procedimentos médicos ao ponto de, ao longo de anos, a criança ter alta médica e deixar o tratamento intensivo que recebera, obviamente com sequelas previstas, mas com vida, ela concordou plenamente.

Certo de que se abrira uma porta para tentar demonstrar à companheira o quão importante é a fé, o amor e a caridade, Arrudinha tentou uma investida de amor Cristão. Aproveitou a oportunidade para enaltecer a fé das pessoas, sem importância o fato de ter a fé nascida por causa de se professar esta ou aquela religião. O que importava era a fé e o perdão. Fé, sem perdão, alertou, não era fé, mas egoísmo ou, na pior das hipóteses, orgulho.

Insistiu na palavra fé, porque em sua família seu irmão passara por prova até mais contundente do que a mostrada na reportagem e o irmão e a mulher, sua cunhada, souberam enfrentar a prova reencarnatória.

Ocorre que Elvira nutria sentimento de rejeição da cunhada e até com certa razão; foi nesse ponto (rejeição) que Arrudinha deu ênfase ao perdão, sem o que não se compreenderia o significado de solidariedade e da recomendação de amor ao próximo. Elvira concordou com a difícil situação do sobrinho, filho do irmão de Arrudinha, mas quanto à cunhada não queria saber de caridade alguma.

Por mais que Arrudinha tentasse realçar que não há amor ao próximo, sem aceitação da caridade, dúvida ficaria quanto ao entendimento da situação da sobrinha deficiente. Elvira discordava desse posicionamento e confirmou que a sobrinha era uma realidade, a cunhada outra; em seguida mudou o comportamento acessível para outro, agressivo; pior, colocou-se como vítima e o companheiro como algoz, intransigente e dono da verdade.

Ficou mais uma triste constatação, ou seja o desequilíbrio de quem se afasta de Jesus, ou de qualquer religião que pregue caridade, amor, fé e esperança. Não basta dizer-se religioso – e seja lá qual for a religião, o importante é que haja um porto seguro, na consciência das pessoas, porto esse construído de acordo com os ensinamentos de Jesus e nada mais será necessário, repita-se, seja qual for a religião. Se houver, na religião, dedicação e fé quanto ao amor ao próximo, a caridade e a esperança de que Deus é o Pai Eterno, nada há que se temer.

Infelizmente, mais um episódio desventuroso. Elvira ficou séria e o convívio do jantar foi rompido. Sem ter mais o que falar Arrudinha afastou-se com o pensamento em Deus. Elvira, agressivamente, foi para os afazeres do momento.

A recomendação feita na casa espírita, acerca dos tropeços do casal não foi levada em conta por parte de Elvira. Mais um episódio vencido pelo seu obsessor que, sentindo livre, sem interferências caritativas, não reunia esclarecimento sobre sua conduta. Prejudicava, mesmo bem-intencionado, sua irmã que, presa no erraticismo do irmão, ficava impedida de progredir, de prestar ajuda aos necessitados e a compreender que o perdão devia ser exercitado não somente em favor da cunhada, mas de toda a humanidade.

O lar continua um campo de batalha: Arrudinha e sua dedicação para trilhar o caminho das pedras, com esperança do porvir e Elvira, sem dedicação, a ser conduzida, por seu obsessor, pelo caminho das sombras, sem qualquer expectativa de luz.

Nesse gládio permanente, merece consideração, dois fatos importantes para a busca de Arrudinha e que se constituem em respostas, indiretas, do Mestre Jesus; portanto, atendimento das cartinhas. Em ambos os fatos, a cena fora de desequilíbrio total, de agressões, de destruição dos móveis e pertences da casa, gritos, palavras de baixo calão e a colocação de Arrudinha na posição de vilão.

Nesses dois momentos, conseguiu elevar o pensamento a Jesus, com fé e clamor, para que forças energéticas, vibrações do bem, fluídos de amor, de perdão atuassem em favor do obsessor o qual, se não estivesse disposto ou consciente de que seu caminho devia ser seguido melhor orientado, que pelo menos se abstivesse de sugar os fluidos vitais de Elvira.

Nessas duas oportunidades, após a invocação e a prece fervorosa, Elvira acalmara-se e parecia outra pessoa.

Esse fato é verdadeiro e permite que se formulem as seguintes indagações, porque a situação ainda não foi harmonizada.

Será que, um dia, esse obsessor deixará Elvira?

Será possível deixá-la sem sequelas de comportamento tanto em relação a ela quanto ao obsessor?

Não há como se responderem essas indagações, pela razão simples de que Elvira não quer, porque não quer, prosseguir no tratamento desobsessivo, nos esclarecimentos necessários a respeito dos ensinamentos de Jesus e sequer pretende aprimorar sua mediunidade em benefício de tantas pessoas que necessitam de ajuda.

Este caso não é isolado, é verdadeiro e encontra similares mais do que se imagina; no entanto considere-se que cada momento de sofrimento da humanidade é uma montanha pesada e, aparentemente, irremovível. Cada pessoa tem sua montanha e há possibilidade de remoção, contudo para que isso ocorra e se possa enxergar o outro lado, ofuscado pelo véu do egoísmo e do orgulho, os ingredientes são: disciplina, fé, caridade e amor a Deus e ao próximo, como se deseja para si. São procedimentos que removem qualquer montanha, nesta ou em outras vidas.

De outra maneira e por ser impossível compreender a vida humana sem existência de alma, ou seja, de algo que não é o organismo físico, há que se concluir que a alma, ou o espírito, por sua individualidade, terá muitas oportunidades de cultivar o progresso natural da ordem cósmica. Essas oportunidades significam a misericórdia Divina que está presente na oportunidade de reencarnar-se para continuidade do progresso, interrompido, às vezes, na simbiose com o corpo.

Um novo corpo equivale à continuidade da vida, sem consciência da anterior, para novas provas, novas avaliações e mais proximidade de conhecimento da verdade.

Dizer-se ateu é afirmar Deus, porque crer ou não crer é próprio do ser humano em relação a algo que existe. O inexistente não gera afirmação ou negação de crença; logo se se afirma ou se nega o existente (e o ateu menciona Deus, para negar o que mencionou), esse ato pessoal nada tem a ver com a verdade real. Negar o existente é desenvolver raciocínio contraditório, inconsistente e fruto de ignorância da lógica elementar. Se alguém desconhece o elementar, como pode pretender negar o absoluto.

A escolha natural do caminho a ser seguido é de cada um, ao longo da vida humana e de maneira voluntária, sem temor e sem necessidade de justificar o desejo; entretanto, há vigência de um princípio absoluto: toda causa (escolha) produz um efeito (consequência). Ocasionado o fato, este se torna irremovível e não poderá ser alterado, de sorte que ou se aceita a consequência, com responsabilidade, ou não se aceita. Nesta hipótese, de não aceitação, não há outro culpado pelo que está a acontecer senão a própria pessoa que deu causa ao acontecimento. Consequência desfavorável à vontade ou aos desejos da pessoa humana, não é castigo de Deus, tampouco haverá o encaminhamento ao inferno como pena. O inferno é a própria consequência nefasta, decorrente de ato voluntário, querido e assentido pelo ser humano na esfera de sua ignorância, ou má vontade em buscar o caminho correto para a Verdade.

Por todas essas considerações é que se invoca a Divindade do Mestre revelada no ensinamento da fé, isto é a fé remove montanhas. Não, evidentemente, montanhas geográficas, mas a montanha própria de cada um que sofre e não busca a Verdade.
aclibes
Enviado por aclibes em 21/07/2015
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