O ÚLTIMO SOLDADO - 1 de 10
- Eu vou te esperar.
- Não, não quero que me epere!
Disse o soldado à sua mulher, se despedindo na porta de casa. E disse ainda:
- Estou partindo para a guerra e não sei o que pode acontecer comigo. Vi muitos companheiros serem mortos e na paisagem das estradas de frente às suas casas eu surgi para dar a notícia às suas mulheres de que haviam morrido.
O soldado olhou para além da porta e paralisou seus olhos na estrada deserta que se arrastava para longe. Ele continuou a dizer:
- Lembro até hoje, quando aquela mulher ouviu os meus passos e correu para a porta. Ela estava esperando por Nelson, mas me viu surgir quando me libertei da neblina... Ela soltou a maçaneta e seu braço deslizou até sua coxa. Seus olhos estavam cheios de esperança e de repente se escureceram. Quando alcancei sua porta, ela me perguntou: "onde está Nelson?"
O soldado respirou fundo e abandonou o cenário de fora. Sua cabeça baixou e seu olhar caiu até às botas. Ele prosseguiu, dizendo:
- Eu notei que ela estava exprimindo a mão e que seus olhos se enxeram de água... Eu não sabia de que forma minhas palavras poderiam ser menos agressivas e senti medo de responder-lhe. Ela sacudiu meu ombro e gritava em meu rosto: "diga! Onde ele está? Diga! Diga!" acho que ela percebeu o que eu tentava dizer com o meu silêncio e caiu de joelhos no chão. Eu a assistia chorar diante de meus pés e nem sabia o que fazer, foi quando ela se ergueu e me empurrou para fora, fechando a porta brutalmente. Quando eu já estava no meio da estrada ainda pude ouvi-la gritar e quebrar louças.
O soldado subiu o olhar até o rosto aflito de sua amada esposa e segurou seu rosto, dizendo bem diante de seus olhos inundados:
- Por isso, não almejo a tua espera por mim. É melhor que não penses para onde me retirei e se algum dia eu entrar pela aquela porta apenas me abrace e diga tudo o que aconteceu enquanto eu estive fora. Mas, se eu não voltar nunca... Bom, você já terá construido uma nova vida com outra pessoa e não deverá lembrar-se de mim.
Ele retirou suas mãos do rosto de sua mulher e apanhou sua mochila. Ela, por sua vez, o segurou pelo braço e o beijou intensamente.
- Não quero mais ninguém além de você, James!
Ela disse, a chorar desesperadamente. O soldado lhe deu um último beijo na testa e saiu, fechando a porta. Melancólica, a mulher se deita na cama e fica a chorar, sem pressa de animar-se, porque sabia que seu amado marido não voltaria aquela noite.
Dias, meses, se passam e o soldado não regressa à casa. Sua mulher ainda se sente sua, porque apesar de tantos dias já sozinha, ela ainda tem esperanças de revê-lo. Durante o dia a porta fica sempre entre-aberta e ela está sempre sentada à mesa depois de um solitário almoço, em que ainda serve um prato a mais que sempre continua cheio ao final. E o soldado nunca está entrando pela porta depois das cinco. A mulher, lamentavelmente, tem que fechá-la mais uma vez e enfrentar o medo de passar mais uma noite sozinha.
- É lamentável, sim, admito... Mas, não acha que depois de tanto tempo de espera, a resposta para a ausência dele seja óbvia?
Dizia um amigo de James para a mulher do soldado.
- O que quer dizer? Que ele está...
- Aura, não tenho a quem enganar, veja o tempo que passou... Quantas noites você já disse para si mesma "amanhã ele estará aqui" e ele não esteve?
A mulher ficou em silêncio e baixou a cabeça. Seu olhar estava em suas mãos, quando o amigo envolveu as suas mãos sobre as dela e falou:
- Esqueça-o, ele não vai voltar.
Ela sentiu uma revolta com aquelas palavras, mas não soube como reagir, realmente estava muito abatida e fraca. Reparou no silêncio que se fez e quando subiu o olhar viu que o amigo se submeteu a alcançar sua boca, mas, ela se afastou ligeiramente e disse em fervor:
- Está muito eganado! Ele vai voltar! Ele vai... Logo...
- Não seja boba, Aura! Será que não vê? Quantos deles já não morreram? Não me surpreenderia se ele...
Aura se revoltou e não ipermitiu que ele levasse a diante seus pensamentos e o empurrou para fora, dizendo-lhe:
- Vá embora! Você só está querendo alimentar essa incerteza que há em um pedaço de meu coração... Mas eu não vou me deixar levar por esses pensamentos ruins!
Depois de escolher a solidão como única companheira em seus dias, Aura continuou esperando pelo soldado, seu marido. Dois anos e meio já se passavam e nada dele voltar. As palavras do amigo de James começavam a fazer sentido. Mesmo assim, Aura não perdia a esperança e sempre estava abrindo e fechando a janela e com sua expressão abatida ela voltava a se sentar na mesa. Estava cada vez mais triste, as marcas do cansaço se desenhavam em seu rosto e a insônia sempre vinha à noite.
Numa tarde comum, Aura lia no quarto um livro de auto-ajuda e como um relógio psicológico ela sentiu que era hora de correr para a janela e olhar lá fora, como sempre fazia. Ela se pôs de pé e caminhou até a sala. Sem nenhuma ansiedade, abriu a cortina da janela e deixou que seus olhos passeassem na paisagem do lado de fora. Eis que os olhos de Aura se concentram em um só lugar... Alguém parecia se aproximar por trás das neblinas. A mulher estufou o peito e segurou firme a aba da janela, esperando descobrir quem vinha chegando. Imediatamente seu cérebro imitiu um único pensamento "é ele... James" Aura abriu um sorriso e lágrimas molhavam suas bochechas. "Deve está muito frio lá fora... Será que ainda tem café? Ele vai estar com muito frio" ela pensava.
De repente, a neblina foi se desmanchando e Aura viu as botas que ele calçava, "são iguais à de James! Meu Deus, é ele!" ela pensou. Mas, logo veio a decepção... Quando já não havia mais neblina, quando tudo estava bem nítido, ela viu... Um andar que não era de James, um rosto que não era de James, um soldado... Que não era o seu. Abalada pela decepção, Aura fechou a janela e correu para o quarto. Abraçou suas pernas dobradas e apoiou sua cabeça sobre os joelhos. Ela sentiu medo. Sabia que alguém vinha bater em sua porta, ela não queria ver, não queria ouvir... Não queria, não tinha forças para o enfrentar. Ouviu as batidas na porta e o soldado chamava, mas Aura não quis se mover, estava congelada, em prantos. Depois de quase vinte minutos a insistir, o soldado desistiu e se foi. Aura sentiu o silêncio... E chorando, se perguntava em murmúrios:
- Onde está James? Onde ele está?
Continua...