Meu primeiro amor.
Não importa quantos anos se passarem, sempre lembrarei do meu primeiro amor. Eu tinha seis anos quando, pela primeira vez, me deparei com aquele sentimento. Ele era um daqueles meninos inteligentes que bastava um furtivo olhar para notarmos a sua inteligência. Com cara e jeito de inteligente. Ele sempre usava a camisa da farda por dentro do short, o que realçava a magreza de um menino no auge dos seus seis anos.
Como minha mãe sempre custava a me buscar na escola, todos os dias eu e ele brincávamos de jogar dado. Pelo que eu consigo me recordar, tratava-se de um grande e colorido dado, que tinha a textura de uma almofadinha, que ficávamos jogando para o alto, cada um devendo pegá-lo na sua vez.
Nunca assumimos um namoro e nem nada do tipo. Naquela época, crianças de seis anos eram apenas crianças de seis anos, não eram tão precoces como hoje em dia. Quer dizer, pelo menos por mim posso afirmar com certeza. Quanto aos demais, sabe-se lá... Mas, mesmo sem nada assumido, eu falava para as pessoas que ele era o meu namorado. Meus primos me chateavam tanto... Até hoje pergunto porque diabos fui abrir a minha boca.
Desde cedo, noto que o drama corria em minhas veias.
Nas tardes após a escola, eu tinha o costume de escutar Bruno e Marrone e Zeze di Camago e Luciano e chorar pensando nele. Nem sei porque eu chorava. Acho que saudade (?).
Além de dramática, outra característica também sempre se fez presente em mim. Eu falo além da conta. Sou aberta até demais.
Na mesma época em que eu sentia meu primeiro e puro amor, outro menino apareceu na história. Um era o exato oposto do outro. Se um era todo comportado e inteligente, o outro só queria saber de brincar e aprontar. A prova de que mulheres (e porque não meninas? Eu tinha apenas seis e a coisa já estava aflorando) são mesmo contraditórias.
Pois bem, eu e minha boca grande resolvemos compartilhar o coração dividido com ninguém mais ninguém menos que meu ciumento pai. Lembro bem das minhas palavras e das dele:
- Papai, eu gosto de dois meninos e não sei o que fazer.
(e aí vem o melhor conselho da história)
- Pois se afaste dos dois.
Simples, não?
Sempre valorizei muito as coisas que meu pai me falava. Então, no dia seguinte na escola, na hora da saída, ele (o inteligente) me chamou para jogar dado. E eu, com toda a seriedade que uma garota de seis anos pode ter, respondi, breve:
-Não quero.
E no momento seguinte eu fui pega. Frise-se que até hoje isso me pega. Ele exclamou um desleixado:
- Tá bom, então. Tu que sabe...
Eu fiquei tipo "como assimmmmm?". Como ele poderia desistir do nosso amor tão facilmente? Bateu um medo de perdê-lo, então deixei de lado o conselho do meu pai e saí correndo para alcança-lo.
Assim, continuamos brincando de dado por muitos anos ainda. Não sei ao certo o que foi capaz de determinar isso, mas lembro bem que o amei da alfabetização até a terceira série. E, o outro menino, bem... Não lembro muito dele. Então, concluí que ele foi apenas uma paixonite relâmpago, se comparado ao meu amor que durou três longos anos, regado à muito Bruno e Marrone e Zeze di Camargo e Luciano.