817-O PRIMEIRO ADEUS- Auto-biográfico

Para melhor entendimento deste conto, capítulo de "Amor Sem Limites", recomenda-se a leitura dos seguintes contos, já postados neste site:

807-Amor à primeira Vista

810-Amor Platônico

813-Amor de Namorados

814-Amor e Poesia

782-E O Vento Levou

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Aquele, sim, foi o ano das primeiras mudanças importantes para nossas vidas.

Foi em 1954 que servi o Exército, fazendo o Tiro de Guerra. As manhãs de domingo estavam comprometidas com o treinamento militar que nós, recrutas, recebíamos no Stand, que ia de sete até meio dia. Por isso, poucas vezes Enny e eu nos encontramos para assistir a missa das nove e meia na Igreja Matriz, que era uma obrigação religiosa e que se transformava, à saída da igreja, em um evento social. As pessoas permaneciam na escadaria da igreja ou circulavam conversando pelos jardins da praça. Noivos e namorados tinham então uma ocasião a mais para estarem juntos.

Bastante diferente de hoje em dia (também, pudera! lá se vão quase sessenta anos!) quando os fiéis saem rapidamente da igreja, entram em seus carros e em menos de dois minutos, a praça está deserta.

Enny, assim que se formou como Técnica em Contabilidade, passou a ser responsável pela contabilidade do Curtume Santa Cruz, de propriedade de seu pai, Alípio Mumic, e dois irmãos Alberto e Rodolfo. Começou a ministrar aulas na Escola Técnica de Comércio, onde era também tesoureira. Frequentava a academia de Musica da professora Edyna Maldi e participava de espetáculos de acordeom promovidos pela mestra no Cine São Sebastião, em beneficio de obras sociais da paróquia.

Era uma moça que se realizava inserida na sociedade.

Eu, contudo, tinha preocupações com relação ao meu futuro: desejava estudar, ser dentista, e para tanto, teria de mudar de Paraíso. Teria também de conseguir um emprego melhor, que remunerasse mais, a fim de custear os estudos. Era o que eu pensava, na ocasião. Por isso fui, em julho de ‘54, a Belo Horizonte prestar um concurso para funcionário público federal.

Não tive sucesso naquele concurso. Tratei, em seguida, de obter uma transferência no Banco de Credito Real, onde já trabalhava há tgrês anos, para uma das agências no Rio de Janeiro, o que consegui com certa facilidade.

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Enny e eu vivemos aquele ano um namoro intenso e ao mesmo tempo melancólico, pois o término do serviço militar, no mês de novembro, seria o marco da minha mudança para o Rio de Janeiro.

Nós dois já sabíamos que nosso namoro seria posto à prova com uma separação. Uma nuvem de preocupação começava a se formar no horizonte de nossas vidas.

Nos nossos encontros, fizemos juras de amor eterno e promessas de cartas todas as semanas. Eu via nos olhos de Enny uma nuance de saudade antecipada, que bem se traduziram nos seus sonetos de amor.

Os últimos acordes do Hino à Bandeira, na cerimônia de encerramento do serviço militar, em 19 de novembro, mesclaram-se com o barulho dos motores do avião que me levou para bem distante do meu amor.

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No ALBUM DE POESIAS DO NOSSO ROMANCE ficaram registradas a apreensão e a tristeza de Enny quando escreveu em novembro, às vésperas de minha partida, o soneto

POR QUE PARTIR?

Porque partir, se somos tão felizes

Vivendo uma vida toda esplendorosa

Que é para nós, risonha e esperançosa

E o nosso amor já criou raízes?

Por que partir se os nossos corações

Vivem batendo a um só compasso

E eles tão juntos ocupando um só espaço

Vivem as mesmas alegrias e as mesmas aflições?

Por que partir, eu te pergunto. Em suma

Eu não conheço razão alguma

Que te levasse à decisão de agora.

E se partires, a vida perde o encanto,

Restará, amor, apenas o meu pranto

E a saudade que o meu coração devora.

Eu, animado com a partida, respondi-lhe com o acróstico, escrito alguns dias antes de viajar:

DESPEDIDA

Através dos tempos, temos amado,

Dia a dia, momento a momento

E hoje chegou a despedida

Ultimo olhar, derradeiro abraço

Seremos dois seres sós ao relento.

Embora pra longe eu hoje parta

No meu coração serás perene

Navegarei firme ao meu leme

Indo até achar o final porto.

Amada, não chores. Voltarei

Muito em breve. Sei que as horas

Arrastam-se quando longe ficamos.

Deusa tu és, e me guiarás.

Adeus, amor, adeus... Parto agora.

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ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 12 de Dezembro de 2013

Conto # 817 da Série Milistórias

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 04/06/2015
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