De volta a felicidade.

O vento soprava forte através de mim. A porteira, pendurada na última dobradiça de borracha que restava, balançava como se fosse cair a qualquer momento. Eu estava ali parado em frente a cancela que contruíram ao lado da porteira, para tentar fechar a passagem que antes era fechada pela porteira. Já pregaram a porteira algumas vezes, mas alguns vândalos arrancam os pregos para invadir a chácara.

Meus filhos não tem o menor talento pra cuidar da terra. Era eu quem vinha aqui e cuidava pessoalmente da chácara, da fazenda e até da casa. Aqui não tem mais caseiro. Ele partiu há mais de quinze anos. Foi se encontrar com a esposa no andar de cima. Desde então eu venho aqui só pra matar a saudade. Olho a casa de longe, o mato quase cobrindotudo e o telhado precisando de reparos urgente. A grama cresceu tanto que não se pode andar nela. Há risco de cobras. Olhando a casa e a porta eu tenho certeza de que ainda a vejo. Ela está em pé na frente da porta. Receio que se mandar podar a grama e arrumar tudo ela possa desaparecer. Não deixo ninguém entrar lá. (só entram quando eu não estou vendo, é claro.) Aquele vestido azul claro com flores pequenas espalhadas pela frente do avental a deixa linda. Seu sorrizo me chamando e eu sem forças pra sair dessa maldita cadeira de rodas. Fui muito feliz aqui. Lúcia era meu sol e minha vida, e agora que ela partiu, não sei viver sem ela. O AVC tirou meus movimentos, mas não tirou minhas lembranças. Não sei porque hoje senti a sua presença mais forte e aqui estou.

De repente ela caminha ao meu encontro. Eu consigo me levantar da cadeira e posso caminhar para ela. Posso correr para ela. Estou finalmente livre.

Ouço a voz do meu filho a me chamar. E então eu paro, olho pra trás e vejo meu filho sair do carro e se encaminhar para a cadeira de rodas. Mas, o que é isto? Estou lá também. Estou sentado na cadeira e meu pescosso pende para o lado esquerdo. Meus braços estão pendurados.

Não quero ver isso. Deixo tudo para lá. Quero apenas estar com Lúcia de novo. Lá estão também o Armindo e sua esposa . A casa parece nova e há festa nela. Não é passado é presente. Neste presente eu sou feliz como no passado.

Nilma Rosa Lima
Enviado por Nilma Rosa Lima em 11/05/2015
Código do texto: T5237981
Classificação de conteúdo: seguro