Lisérgica
- Você viu a Ana por aí?
- Quem?
- Ana?
- Nunca vi.
- Claro que viu, chegamos juntos.
- Ah, porra, aquela garota estranha. Sei lá, vi ela indo lá pro jardim.
- Valeu.
Não me valia de nada gritar, o rock estourava alto pela festa. Gente bêbada, gritando, usando drogas, se comendo de fato. Eu sabia que iria ser assim, mas Ana não. E como ela gostou desse clima insano que nos consome, que já me consumiu em outras épocas. Quando eu era mais jovem e inconsequente. Corro até a piscina, e se ela decidiu por um mergulho? Ela não sabe nadar. Cristo. Mas a água está relativamente calma, alguns casais se beijando e outros nus. Olho para o céu, em busca de uma luz e o telhado me revela Ana. Sentada na borda, o rosto voltado para a lua, em adoração. Como diabos essa maluca subiu ali? Meu coração falseia umas mil batidas. Ando desesperado em torno da casa e vejo a escada que deve ser a culpada de qualquer tragédia. Subo resfolegando por ela. Eu morro de medo de altura. Meus passos torpes pelo telhado da casa, as mãos abertas para manter o meu medroso equilíbrio. Os segundos se tornaram horas. O medo de ela pular e o meu medo de cair. Não sei quanto tempo demorei, mas foi o suficiente para pegá-la onde a vi.
- Ana?
- …
- O que você está fazendo aqui? - Sentei-me ao lado dela.
- …
- Ana?
- Você sentou no rabo do coelho.
- Desculpe, senhor Coelho.
- O.K. Ele não liga, disse que tem bastante pelo no rabo.
Sinto vontade de rir.
- Ana? Podemos descer?
- O senhor Coelho está me chamando para a cova dele, lá embaixo.
- O Senhor Coelho pode se foder, no que me concerne.
- As estrelas estão pertinho dos meus olhos. Sabia que elas estão mortas?
- Não.
- Tô com vontade de mijar.
- Ótimo, vamos descer.
- Posso fazer aqui mesmo. Tem uma privada ali embaixo.
- Ali é a toca do senhor Coelho. Ele não vai gostar. Vamos no sanitário lá embaixo, dentro da casa.
- Que casa?
- A que estamos em cima.
- Legal. Nunca estive em cima de uma casa.
Ela me olhou. Seus olhos puros de pupilas dilatadas.
- Eu te amo, Ana.
- Obrigada.