Corpo da Roupa
Na sua vida conjugal banhada de samba, Manuela era infeliz e solitária. Farta de ser ignorada e destratada por seu marido, Alberto, que se importava apenas com jogo, cerveja e os amigos do bar, Manuela comprou a passagem só de ida para a liberdade.
Colocou na mala apenas a coragem, a ânsia por felicidade e seus objetos de beleza, saiu com a roupa do corpo ou o corpo da roupa, sem ter pra onde e como ir, agora sem a chance de poder vir.
Parou no primeiro boteco e encheu sua cara. Vodca, gin, conhaque, veneno, garapa, aspirina... Tudo, menos cerveja;
Toda noite era essa boemia, subia na mesa, gritava ao microfone, cantava junto com os músicos, conhecia rapazes e moças, amigos e inimigos, o samba agora era ela que fazia. A alegria (falsa ou plena) era o que ela sentia, longe de Alberto, sentia-se bem, como negra alforriada, ou um passarinho que recuperou as asas. Seus casos manavam de garçons à médicas, de advogados à professoras.Deixou em casa apenas uma rosa atrelada a um bilhete desaforado, escrito em letra maiúscula e vermelha, que ordenava que Alberto tratasse a rubra rosa como havia lhe tratado, nesse momento, em que o farrista lia aquele cartão, a rosa, já estava murcha sob a cabeceira da cama, do mesmo modo que foi deixada.