Amor na Cidade do Sol cap 4/6

Assustada diante da possibilidade de ser verdade o que a menina disse Atilde ficou pálida de terror. Nunca lhe passou pela cabeça que pudesse ter uma cria dentro de si. Será que fora fecundada? Algumas crianças são descendentes de Kay, afinal as moças são preparadas por ele. Será que herdam seus poderes?!?! O fato é que essas crianças tem uma sensibilidade maior do que as outras. Disfarçou e disse pra ela não dizer isso outra vez. A menininha inocente concordou e como elas estavam acostumadas a obedecer, estaria livre desse susto.

Por via das dúvidas comeria algo urgente. Passou a fazer tudo com muito cuidado e não despertar suspeitas. Quanto as três meninas loiras que estavam com elas na moradia, evitaria estar perto e ser observada por elas.

Uma anciã viu a conversa que ela teve com a menina e veio ao seu encontro. Não disse nada a respeito mas começou a tratá-la diferente. Atilde ficou com medo mas ela tentou acalmá-la dizendo que a mãe natureza sempre fala mais alto e que ela não precisava se preocupar. Seu nome era Dhil e ela passou a ser a companheira que Atilde precisava. Sempre a salvava de situações embaraçosas.

As tarefas que eram mais pesadas, Dhil fazia com destreza e sempre dava um jeito de Atilde sair para colher frutas e flores na hora exata dela ter que fazer uma tarefa mais extasiante, e fazia tudo para deixá-la longe das meninas especiais. Fora uma excelente reprodutora e sabia tudo de uma gestação. Não queria ver a moça em apuros.

Nunca acontecera de o Vento da Maldade levar alguém fecundada, mas, mesmo assim, tinha medo que isso pudesse acontecer com Atilde. Ela era uma menina ingênua mas muito obediente e prestativa com as crianças. Tinha um certo talento com elas. Sentia também que esse ser que ela carregava era especial. Parecia que alguém lhe dizia isso dentro da mente. Dhil era anciã mas, as anciãs da aldeia tinham muitas luas. Não envelhecemos muito fácil por causa de nossa alimentação e por causa da água da fonte. Vivemos cerca de 8 mil luas e deixamos de viver quando o vento nos leva. Se completamos 8 mil luas somos levadas e nunca mais somos vistas. Pra muitas isto é a glória, mas eu tenho dúvidas. Nunca se viu alguém perder a vida de outra forma.

Os homens da aldeia saem logo cedo, antes das mulheres e crianças acordarem. Antes mesmo do Deus Sol aparecer no horizonte. São fortes e musculosos e tem segredos entre si que não revelam nem para suas dádivas. Não são questionados. Algumas dádivas são tratadas como princesas, outras como escravas. Depende delas e de seus Senhores.

Algumas mulheres nunca foram escolhidas pelo prefeito para serem doadas. Ficaram para cuidar das crianças. As mulheres sem Senhor não sabem nada a respeito da vida de ser dádiva a não ser que tenham perdido seu Senhor por ele ter completado muitas luas. Temos remédios para curar qualquer mal, menos o mal da idade.Apesar de ultrapassarem o tempo elas não aparentam a idade mas vão embora um dia. Penso que ninguém quer ultrapassar 8 mil luas de qualquer maneira.

Kay voltou pra casa se sentindo esquisito. Estava levitando. Quando ele levitava não era bom sinal. Havia perdido a pulseira que seu pai inventara para prender o menino ao chão. Pensando em onde poderia ter perdido a pulseira, lembrou-se de sentir um solavanco no braço quando fugiu da caverna da montanha. Um objeto gigante estava plantado na entrada da caverna. Seria aquilo capaz de arrancar a pulseira de seu braço? Voltaria para lá imediatamente. Foi difícil voltar lá levitando a todo instante e caindo em seguida. Mas chegou e observou que era mesmo verdade. Sua pulseira estava grudada no tal amuleto gigante da entrada da mina. Havia correntes grossas grudadas nele também. Quase instantaneamente, Kay se lembrou das meninas que voavam montanha acima que Atilde havia lhe falado e pensou então era assim que seu pai fazia.

Retirou a pulseira com dificuldade e entrou na mina. Avistou seu pai e gritou para ser visto por ele. O mesmo se elevou em um aparelho esquisito que era movido por homens que puxavam as cordas. Não questionou o pai e fez de conta que já sabia de tudo desde sempre. Agiu com naturalidade. Mas disse que tinha um assunto pra tratar com ele naquele momento. Não poderia perder uma jarda de tempo.

Disse a seu pai que cansara de ser o preparador sem família e que sentia falta de uma dádiva só para ele. Não abriria mão disso.

O pai de Kay, era um cientista brilhante e embora não tivesse os poderes dele era muito esperto. Disse-lhe que voltasse pra casa pois não queria que ninguém o visse. A noite voltaria pra casa e conversariam.

Kay voltou pra casa e subiu a casa sem ser notado pois sabia se camuflar. A altura da casa nunca havia sido percebida por ele pois estava sempre ocupado em se camuflar mas desta vez fez questão de ser visto por algumas pessoas. Fez um gesto de Deus todo poderoso e eles ajoelharam-se no chão. Nunca tinham visto alguém com os olhos tão azuis e os cabelos longos tão loiros. Eram rapazotes que faziam sacolas de sementes para a lavoura. Kay soprou sobre eles e o vento foi tão forte que suas túnicas voaram de seus corpos. Enquanto a confusão se instalou entre eles, subiu a escada rindo muito da cena. Mais alguém viu a cena e não riu.

Kay chegou em casa e esperou por seu pai. Não sabia seu nome. Sempre o chamara de pai. E assim continuou a chamar. Deve ser este seu nome. Todos o chamam de prefeito ou sacerdote. Seu espírito abandonou seu corpo físico e foi para o mundo dos sonhos, enquanto esperava. Lá encontrou Atilde que estava muito gorda. Sua cria gritava dentro dela: _Socorro! Estou em perigo!!! E ela apenas olhava pra ele.

Acordou assustado e viu que era apenas um sonho. Uma imagem falsa da vida. Aquilo não era possível de acontecer ainda. Mas seu pai estava a seu lado e ouviu-o gritar palavras desconexas.

E perguntou-lhe o que queria dizer com as palavras: Cria, ainda não e socorro.

Kay resolveu abrir o jogo com seu pai sem dizer quem era a moça. Nem pensou no nome dela pra ele não ler a sua mente e saber. Contou-lhe tudo o que fizera e que gostava da moça. Disse que não queria que ela fosse levada pra trabalhar na montanha. Então ele ficou mudo de espanto. Brigou muito com o filho até que ele o levantou do chão e colou no alto da torre. O velho começou a gritar e ele avisou pra ficar calado. Abaixou ele e disse que quem dava as cartas agora era ele.

O pai fingiu aceitar e quis saber quem era a moça, mas ele não disse e avisou que era melhor não acontecer nada com ela, pois do contrário nada seria como era agora. Sentindo que isto era uma ameaça, o velho não prosseguiu e saiu do ambiente.

Uma das festas mais sagradas para todos os moradores da aldeia era o “Batismo nas águas sagradas da cachoeira do riacho transparente”. Ali acontecia uma cerimônia que envolvia a todos os moradores com mais de 800 luas. Ninguém poderia ficar de fora. Apenas ele era deixado de fora da cerimônia pois estava atrás da cachoeira e usava seus poderes para que a água ficasse poderosa também. Os aldeões não sabiam o que havia ali mas se sentiam mais fortes a cada cerimônia dessa. Isto só acontecia, quando o Deus Sol e a Deusa branca da lua cheia se uniam e se tornavam um só.

Durante o tempo em que eles estavam juntos, os adultos estavam dentro da água e passavam em frente da cachoeira em filas que iam se desfazendo do outro lado do rio. Depois que todos haviam passado por lá, voltavam pra casa e no outro dia ninguém tocava no assunto.

O prefeito sabia que aquela água era uma espécie de fonte da juventude mas nunca diria a ninguém. Quando um ancião ou anciã era levado até lá em noite de lua, se tivesse completado 8 mil luas voltava a ser um bebê. A menos que ele rejeitasse a ideia.Então era levado pras minas de diamante azul e ficava lá até morrer sem a “água milagrosa”.

A população da Cidade do Sol crescia em proporções menores pois o prefeito mandava plantar uma erva com poderes anticoncepcionais. Todos se alimentavam dela. Mas ela só tinha efeito nas mulheres em idade fértil, caso contrário era apenas uma delícia culinária.

As mulheres tinham que ter uma cria quando se doavam a seus senhores, mas não era pra ter mais nenhuma. Ninguém sabia disso a não ser o prefeito. Não havia outro cientista lá.

Quando a população masculina superava em muito a feminina, ele tomava as rédeas da reprodução e fazia com que elas se alimentassem de uma certa erva, que fazia as crias nascerem masculinas ou femininas ao seu comando. O único que descobrira isto foi levado a trabalhar nas minas. Era o único homem escravo de lá.

Continua...

Nilma Rosa Lima
Enviado por Nilma Rosa Lima em 02/10/2014
Reeditado em 18/08/2015
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