Com que roupa?
A lavagem de roupas era a tarefa mais exaustiva e desgastante das obrigações domésticas. Implicava várias fases e a mais chata delas era a esfregação. O sabão em barra, fosse o Santa Luzia, aquele amarelinho, de pintinhas marrons, ou o róseo Minerva, eram mesmo soda! Deixavam as mãos descoloridas e podia levar até ao sangramento.
E à mana Labelle é que cabia essa pesada desincumbência, além de partilhar com LaToya a arrumação da casa, e o fogão. Eu, o terceiro em linha cronológica, me ocupava das vasilhas. E dos sapatos, onde contava com a assessoria ainda menos interessada dos manos menores, Beu e Cashi. E ainda sobrava a pajeação dos petizes, feita em mutirão.
Com mamãe e papai devotando oito horas diárias à fapa - que era como chamávamos a companhia de tecidos - de segunda a sábado, a chiação não achava argumentação e o negócio, sem ócio ou sócio, era meter as mãos à obra.
Compadecido do fardo mais pesado de Labelle, papai, que à época já trabalhava na terceira turma, das dez da noite às seis da manhã, não se fazia de rogado, e muito menos se incomodava em fazer coisas que homem geralmente não fazia: no quintal, com a bacia de roupa ao centro dum banco, sentava-se numa ponta, com Labelle na outra, e botava os muques a funcionar naquela faina ingrata e repetitiva.
E foi numa tarde dessas, ensolarada e arrastada, así como añorada, que bateu à nossa porta algum mascate ou visitante ocasional. Atendido o chegante, acomodado num sofá, servido um gór d´água, esperou por papai. Num par de minutos, ei-lo que chega: quando o visitante lhe estende a mão, papai exibe às suas, branquésimas ainda que sob uma uma napa de terra solta, fresquinha, e se escusa: lamento não poder lhe apertar a mão, estava lidando com terra no quintal...
O visitante não retornou. Mas deve estar ainda encabulado tentando decifrar aquela cena: mãos tão alvas, por terra salvas...