Fertin a vida e os espelhos- III

No caminho pra escola Beatriz fazia muitas perguntas, e Fertin mal respondia a primeira ela já tinha mais três a fazer.

Ao chegar em frente ao colégio Fertin ficou admirada com o tamanho e a altura.. Com os monumentos antigos ao redor. Era tudo maior do que sua escola anterior.. Se sentiu engolida quando subiu as escadas e adentrou com Beatriz.

Ao passar pelo corredor principal tinha muitos pais levando os filhos para o primeiro dia de aula. As mães abraçando e despedindo-se dos filhos nas portas das salas.

Fertin nunca sentiu tanta falta de ter uma mãe antes. Ela sentiu o tanto que a vida poderia ser diferente se tivesse pais como todo mundo, ela sentia um vazio, e uma angustia pelas faltas de respostas de seu tio. Mas logo que chegou ficou feliz em saber que sua amiga que acabara de conhecer seria da mesma sala que a sua.

Ao chegar em casa Fertin ficou em silêncio.. Lembrando das perguntas que Beatriz lhe fizera no caminho para a escola.. E se perguntando porque durante tanto tempo não tinha feito a si mesmo tais perguntas. Era como se ela tivesse sido congelada durante quatorze anos e hoje os primeiros raios de sol derretesse todo aquele gelo denso. Apesar de ser grata pelos cuidados de Gede

Ela tinha a mania de ficar horas em frente ao espelho olhando pro próprio rosto enquanto imaginava uma vida diferente da sua.

Do quarto dava pra ver a escrivaninha de seu tio. Ele estava lá.. Sentado como sempre. Com sua velha lupa preta e dourada. Era alto, forte e de ombros largos. Do tipo que levaria vantagem em qualquer briga. Tinha uma tatuagem na mão esquerda.. Uma numeração pequena no pulso. (7689-G) tinha cabelos abundantes e grisalhos. Sempre trabalhava escutando música clássica no seu radinho antigo mas que ainda fazia barulho, o bastante pra ser ouvido da cozinha a varanda.

Fertin se aproximou de Gede, Em silêncio.

Ele escutou seus passos leves pelo velho piso de madeira da cozinha que fazia barulho até com o pisar de baratas.

- Não gostou da nova escola?

fiquei feliz que conseguiu uma amiga nova antes mesmo de chegar lá.

- Ela, me fez algumas perguntas.

- que tipo de perguntas?

O semblante de Gede mudou um pouco.

- A minha mãe... Ela morreu não é mesmo?

- Gede colocou a lupa sobre a mesa, suspirou.

- Fertin.

Antes de Gede responder ela saiu correndo de volta pro quarto e fechou a porta. Fertin passou a tarde chorando baixo..sentada no chão encostada na porta. Na verdade Fertin ja sabia, varias vezes Gede respondera essa pergunta e ela sempre se contentava, negava a si mesmo a falta que lhe fazia ter uma mãe e um pai, mas ao mesmo tempo não queria magoar Gede.

Gede encostou na porta.. -Eu fiz sanduíches... O silêncio continuou.

-Sabe, ela era linda.. Tinha seus olhos, seu cabelo, e até seu dedinho torto do pé esquerdo. Acho que se devolvesse tudo que tem de sua mãe só restaria seu vestido.

Fertin parou de chorar enxugou o rosto com as mãos, prestou atenção no que Gede dizia.. Ela olhou para o seu dedinho torto.. E sorriu. Gede fez silêncio, sentou se a mesa da cozinha. Fertin abrio a porta e caminhou lentamente até lá e sentou se a mesa.