Uma História de Amor

O sol raiou timidamente na bela Petrópolis, Região Serrana do Rio. As nuvens e o sol ainda se beijavam quando a luz do dia ensaiou as primeiras poesias. Os pássaros aproveitaram para flertar com o ar de asas abertas, em queda livre - Nada como o voo das andorinhas!

Carmem, uma estudante de Direito de 19 anos estava feliz: era mais um aniversario, e a lembrança de sua infância ainda fervilhava em sua mente - "como o tempo passa rápido", indagava a moça sorrindo.

O dia seria longo: nas primeiras horas iria ver Lúcia, sua melhor amiga, aliás, daquelas que revesavam os dias em que uma dormia na casa da outra quando crianças. Estudaram juntas, e no fim do colegial, Carmem escolheu o curso de Direito, Lúcia preferiu se dedicar ao esoterismo: estudou todo tipo de oráculo e tornou-se vidente na rua das Garças, número 115. Era pra lá que Carmem iria nos primeiros raios de Sol daquela manhã sedutora - "preciso ver o que o futuro me revela, indagava Carmem".

O maior sonho de Carmem era conhecido de Lúcia, desde a infância esta sabia: “encontrar a minha princesa encantada”, lhe dizia a amiga desde sempre com os lábios largos. Carmem amava mulheres, assim como Lúcia, e ambas, desde a infância, comungavam do mesmo sonho: encontrar um amor verdadeiro, a sua amada, afinal, o amar é um dom divino, não?

Aquele abraço longo de Lúcia em Carmem saudou a amiga que era dona daquele dia. Após as caricias e sorrisos dos cumprimentos, Carmem expressou o desejo de jogar os oráculos ciganos, o popular baralho do povo indiano, para saber se Deus ainda demoraria em lhe presentear com a sua alma gêmea: “-onde está minha metade, Lúcia?”, indagou Carmem sorrindo.

Lúcia fez o ritual de sempre antes de jogar as cartas. Uma vela acesa sobre a mesa, uma música suave ao fundo, palavras em forma de mantra, e pronto, cartas lançadas!...

Ou há imensas coincidências cósmicas ou o universo conspirava para a felicidade de Carmem justamente no dia do seu aniversário. Digo isto porque no jogo de lúcia a Carta que saiu foi a número 24 do Baralho cigano, ou seja, A Carta do Amor.

Significado? Claro!: amor à vista! Era chegado o dia em que o destino colocaria na vida de Carmem o amor que a mesma aguardava desde a infância, a sua mulher. A sua amada se revelaria naquele mesmo dia, interpretou Lúcia, enfatizando que as forças universais dos Astros haviam contemplado Carmem: “chegou a sua hora de amar, amiga!”, disse Lúcia com os olhos cheios de lágrimas, convicta de que aquele dia era o dia do Amor. Carmem se emocionou na mesma proporção. Aproveitando a oportunidade, Carmem confessou a Lúcia que estava apaixonada por uma moça de sua sala de aula, Marina, e indagou com os olhos brilhantes: “será que ela é o meu grande amor, Lúcia?”. Lúcia franziu a testa e olhou para baixo, como que consultando entidades de luz em busca de resposta...após três segundos de silêncio enfatizou:” Os astros me responderam, amiga, mas não posso te disser agora quem é ela, mas na festa, eu te direi, a sua amada estará lá, isso posso te garantir”. Mesmo com a insistência de Carmem, Lúcia nada falou, apenas repetiu o que acabara de dizer.

Após abraços apertados e a promessa de que Lúcia iria (aconteça o que acontecer) no seu aniversário, Carmem deixou a sua amiga e foi direto ao cabeleireiro se produzir, afinal, já que naquele dia encontraria a sua amada, não podia estar de outra forma: como princesa, vestida de vida.

Passado a manhã no Salão Estético, Carmem seguiu para o seu apartamento, no 16º (décimo sexto ) andar do edifício Dom Pedro II. Já estava tudo arrumado! O buffet à brasileira para os amigos e familiares já estava pronto, em menos de duas horas seus amigos e familiares estariam presentes para a comemoração íntima que iniciaria no começo da tarde e não tinha hora para acabar. E claro, a ansiedade bailava no interior de Carmem, afinal, Marina, a quem amava, estaria entre os presentes.”Mais um final feliz”, pensou Carmem radiante, confiando na promessa dos Astros.

Passado o tempo, todos os convidados foram chegando, e Carmem, bela como um diamante, recepcionava um a um, afinal, eram todos queridos. Porém, aguardava Lúcia, que lhe diria quem era sua amada, aquela por quem sempre aguardou. Na mesma proporção, aguardava Marina, o seu provável amor.

Enfim despontou Lúcia, e que coincidência, acompanhada de Marina: “olá, meus amores, estava ansiosa por recepcioná-las”, enfatizou Carmem em meio a um largo sorriso de alegria. Neste mesmo instante conclamaram Carmem para que que se achegasse junto a mesa principal, era chegada a hora de cantar os parabéns, afinal, o aniversário não é nada sem parabéns, discurso e a entrega do primeiro pedaço de bolo.

Junto a mesa, antes do parabéns, Carmem agradeceu a todos e enfatizou que aquele era o dia mais feliz de sua vida, justificando isso por tudo o que aconteceu, e ainda mais, por tudo que iria acontecer. Explicou que aquele parabéns seria atípico, ou seja: após todos cantarem os parabéns, ela iria até a sacada do apartamento com Lúcia, ouvir-lhe um segredo, e em seguida retornaria para partir o bolo e dar, mediante o segredo que lhe seria revelado por sua amiga Lúcia, o primeiro pedaço de bolo a alguém muito especial.

A energia no ambiente era a melhor possível, realmente os astros haviam abençoado aquele dia, o dia do amor, tudo estava perfeito. Champanhes estouravam, gritos elogiosos eram ouvidos, e a curiosidade pelo segredo que Lúcia revelaria a Carmem alimentava ainda mais a felicidade dos presentes: “hoje o dia será eterno”, gritou o pai de Carmem do meio da multidão” .

A cantoria começou e findou, e o tradicional “com quem será que ela vai se casar” foi ouvido. Neste momento Lúcia tomou Carmem pela mão e se dirigiu para a sacada, para a varanda do apartamento mais alto do edifício. Era chegado a hora da revelação, de contar a Carmem quem era a sua amada, de levá-la ao encontro de sua alma gêmea. Carmem tremia de felicidade!.

Olhos nos olhos, Lúcia abraçou Carmem fortemente e disse que sempre estaria com ela, como duas estrelas no alto céu, como luzes que jamais se apagam. Enquanto todos observavam pelo vidro e conclamavam a volta de Carmem com a revelação do segredo dos Astros e a entrega do pedaço de bolo a quem de direito, Lúcia levou Carmem para o fim da sacada, para o limite, e disse:

“amiga, desde crianças estivemos juntas, e sempre estaremos...agora, eu seguro a tuas mãos e te digo com a permissão divina dos santos astros ciganos que a tua amada é Marina, e que o destino tramou para que vocês estejam eternamente juntas, e agora, eu te levo ao encontro dela...”

Enquanto as lágrimas começavam a jorrar como uma fonte de vida dos olhos de Carmem, Lúcia a abraçou pela cintura, e diante de todos: dos familiares, dos amigos, de Marina (o amor tão sonhado e esperado de Carmem) saltou para a morte de ambas do alto do edifício, levando, em queda livre, a sua amiga aos braços de Marina, para sempre, pois sabendo que o amor de Marina era reciproco por Carmem, não suportou a ideia de perder quem sempre amou em sigilo para uma desconhecida qualquer. Assim, o amor triunfou, prevaleceu, soberano que é.

O Amor casou duas almas em meio aos gritos desesperados de quem assistiu os corpos caírem pelos andares rumo a explosão da sarjeta suja lá de baixo.

Eis o final feliz, os astros estavam certos: foi revelado a Carmem o seu grande amor, foi lhe entregue a sua amada, e estão juntas para sempre, unidas pelo que há de mais forte na vida: a própria morte.

Lui Jota
Enviado por Lui Jota em 19/07/2014
Código do texto: T4888641
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