Pequenas histórias 43
O cigarro.
Ele tomou café e deixou o copo sujo dentro da pia.
- Não sou sua empregada, sujou o copo vê se lava. – gritou esganiçada a mulher ao passar pela cozinha.
No dia seguinte, tomou um suco, e o copo sujo foi para dentro da pia.
- O idiota. Não ouve, não. Vê se lava esse copo que não vou lavar merda nenhuma sua, ouviu cretino?
No outro dia, foi uma cerveja e, consequentemente, o copo sujo acabou dentro da pia. Assim, seguidamente deixava dentro da pia um copo sujo. No fim de um mês a pia estava abarrotada de copos. Um em cima do outro. No quarto mês a pilha de copos chegava quase até a metade da parede. No quinto mês, alcançava o batente da janela.
Já não dava pelota para os gritos da mulher. Surdo aos xingamentos continuava deixando copos sujos dentro da pia. Riu do absurdo. Como pode uma coisa dessas acontecer? Quem é o errado? Eu? Não sei, respondeu intimamente.
- Se você não tomar uma atitude, exigirei que saia dessa casa. – esganiçava a voz de taquara rachada da mulher.
Tudo bem! Faça o que quiser, estou para o que der e vier. Pouco se importava consigo mesmo, quanto mais com o que pudesse lhe acontecer hoje, amanhã ou depois de amanhã. O que desejava é que tudo fosse para o fim do mundo. Precisava de sossego, de paz, calmaria.
Finalmente um dia, ao passar pela cozinha e, ao ver a pilha de copos monumental dentro da pia, tomou a decisão. Escreveu um bilhete e colocou no centro da mesa.
“Vou até a esquina comprar cerveja – como não fumo, não vou comprar cigarro – e já volto.”
Passou-se dez anos. E quem lhe perguntasse:
- E o seu marido?
Ela respondia:
- Foi até a esquina comprar cerveja e não voltou mais.
- O que? Cerveja? Não seria cigarro?
- Não, é cerveja mesmo, ele não fuma.
pastorelli