Querido Diário 5
Diário do Vinícius
Quinta-feira, 10 de julho
- E aí, cara, beleza?
Nicolas se aproximou, do mesmo jeito de sempre: com o casaco na cintura, os fones de ouvido plugados e com aquele belo sorriso que fazia meu coração dar saltos no peito. Hoje o dia estava lindo, mas mesmo assim, ele tinha os cabelos molhados. O cheiro do Kaiak se misturava com o cheiro de shampoo e de banho recém-tomado.
Inebriado, quase me esqueci o que eu tinha para falar com ele.
- Não tá nada beleza! Você me deixou ontem na parada com uma bomba daquelas e sem nenhuma explicação! Eu to curioso, cacete! Quase não dormi. Você é do mal!
Ele começou a rir. E sua risada é sempre tão doce e tão musical, que não adianta o quão sério eu esteja falando, sempre acabo sorrindo quando a escuto.
- Você vai ter que me dizer quem é! - por causa do meu sorriso, aquela fala não saiu persuasiva como eu esperava.
- Eu não! Nem adianta, não vou dizer nada. - ele também sorria.
- Isso não é justo!
- Ah é? Então me diz você! De quem é que você gosta?
A pergunta me pegou de surpresa e me fez corar instantaneamente. Eu podia sentir meu rosto ferver e meu coração bater feito um louco. Não dava nem para responder que eu não gostava de ninguém numa situação daquelas.
E, por um momento, eu até pensei que essa seria uma ótima hora para revelar tudo.
Desviei o olhar.
- Não vou dizer nada.
Ele pareceu satisfeito.
- Então é mais do que justo.
No intervalo, uma coisa no mínimo estranha aconteceu. Num momento, eu estava saindo da sala tranquilamente em direção à cantina. No momento seguinte, estava sendo arrastado por uma loira de olhos claros, rosto angelical e andar felino.
Tenho certeza que poder dizer essa frase seria motivo de orgulho para qualquer outro garoto.
Mas, adivinhe. Não para mim. Não mesmo.
- Me larga, Elisa!
Tenho que admitir. Para uma garota magrinha daquelas, a loira era até bem forte. Ela me arrastou até a sala vazia mais próxima e fechou a porta atrás de si.
- O que ele disse? - ela perguntou. E diante do meu olhar confuso, perguntou novamente. - O Nicolas! O que ele disse sobre mim? Você perguntou pra ele, não perguntou?
Finalmente lembrei do que ela estava falando.
- Ah! Perguntei.
Ela sorriu, excitada.
- Ele disse que gosta de outra pessoa.
Seu sorriso desapareceu.
Só eu sei o quanto me segurei para não rir da cara dela.
- Como assim?! Quem?! - ela estava indignada. Balançava a cabeça de um lado para outro, processando a informação e se recusando a acreditar. Aposto que ela estava fazendo uma lista mental de quais garotas poderiam ter mais chances do que ela e planejando como se livrar de cada uma.
- Não vou dizer. - eu sorri, presunçoso. Decidi que brincaria um pouquinho com Elisa. Esperava que ela me implorasse pela resposta àquele enigma.
Mas, a loira não mordeu a isca. Apenas estreitou os olhos, me encarando com desconfiança. Por fim, pareceu ter uma revelação.
- Você não sabe. - não era uma pergunta, ela estava afirmando com certeza inquestionável.
Aquilo fora tão inesperado da parte dela, que eu não soube como reagir. No fim, me indignei.
- Claro que sei! Só não vou dizer.
... Mas eu era um péssimo blefador.
- Você está mentindo.
Ela sorriu. Pareceu ter outra revelação.
- Você está mentindo porque não quer que eu fique com o Nico.
Eu me senti entrando em pânico. Minha garganta ficou seca. "Ela descobriu tudo.", pensei.
-... Na verdade, você está apaixonado por mim!
Então o pânico passou instantaneamente, e eu tive um ataque de riso.
- Eu, Vinícius? Apaixonado por você? - eu não conseguia me conter, a ideia era tão absurda que chegava a ser hilária. - Me poupe, Elisa!
Ela manteve um sorrisinho na cara e um olhar superior. Estava completamente convencida de sua própria teoria.
- Não adianta negar, Vinícius. Eu já entendi tudo. - e eu continuava rindo, não conseguia ficar sério olhando para ela naquela situação. - Foi até meio fofo da sua parte tentar me separar do Nico. Mas eu não estou interessada, OK?
Dizendo isso, ela saiu rebolando da sala. E tudo o que eu conseguia pensar era: coitada. Tenho pena de gente que acha que tem o Sol a seus pés.
Bem, mas o fato era que, até o final do dia, Elisa tinha conseguido espalhar sua teoria mirabolante por todo lado. E todo mundo vivia em função dessa novela armada. Era tanto boato idiota, que diziam até que eu e o Nico tínhamos marcado de duelar por ela na festa de sábado. Quem veio me contar foi Larissa, minha fiel escudeira, da turma do lado. Ela era uma garota tão meiga e divertida que, se eu fosse capaz de me apaixonar por garotas, muito provavelmente me apaixonaria por ela. Infelizmente, outros garotos pareciam não pensar como eu.
Enquanto isso, Nicolas não falou comigo uma palavra sobre o assunto. Também, nós tínhamos nos sentado em lugares distantes um do outro - o que gerou ainda mais boatos por parte dos nossos colegas imbecis. -, Nico sentara mais a frente para prestar atenção à aula de Física.
Quando o sinal finalmente tocou, ao meio dia, ele veio ao meu encontro.
- Então... Você gosta da Elisa, é?
Nico não estava me zoando, a pergunta era séria. Eu nunca tinha dito a ele o que realmente pensava sobre aquela garota, então ele não sabia que eu a desprezava do fundo da minha alma. Por isso, tive o cuidado de deixar esse desprezo bastante evidente na minha resposta.
- Pff... Claro que não! Não sei de onde ela tirou essa ideia ridícula.
Então, aquele sorriso que eu tanto amava se abriu.
- Acho bom. Eu estava começando a ficar com ciúmes.