O monstro e a Fada II
Por entre as paredes dessa caverna fria e solitária, eu o monstro me pego chorando pelos cantos debruçado pelas poças de água que escorrem da parede pelo chão.
A falta que ela me faz aterroriza meus sonhos noturnos, não consigo distinguir a realidade dos meus sonhos mais.
As vezes vou em busca do seu olhar pelos bosques e vilarejos, volto aos lugares por onde minha fada passava e ainda existe o brilho se apagando de suas asas que ao levar uma pancada caiu ao chão, o seu rastro ainda permanece nas areias do vilarejo, e todas as vezes que me deparo com o restante do brilho que ficou, caído ao chão meu pranto caí por cima do brilho, e é o que o faz apagar lentamente, um pedaço da sua varinha de condão ainda está enfincado ao chão.
Eu realmente fui o monstro que aparento ser, mas não posso ficar aqui a lamentar as perdas, estou morrendo aos poucos nesse lugar.
Caminhando pelos trilhos de terra, no meio de arbustos, arvores, teias e galhos, cheguei ao jardim mais lindo que existe na aldeia mais próxima, era nesse mesmo jardim que minha fada me costumava a levar quando os demônios me aterrorizavam durante as madrugadas, sempre na manhã seguinte me cobria com suas bênçãos e seus cuidados, me deitava em seu colo e acariciando-me os pelos e segurando minhas garras me falava de coisas bonitas e de como o mundo poderia me trazer boas coisas, tentava me convencer que nem todas as pessoas daquela aldeia eram ruins, e que logo eu poderia andar sem medo de ser atacado.
Sentado embaixo de um pé de algodão foi onde tive as melhores lembranças.
O céu parecia tão limpo, os pássaros passeavam de um lado para o outro, o vento soprava contra meu rosto e passava entre minhas presas... Eu poderia sentir o cheiro da minha fada ali.
Brincávamos no meio dos algodões que estavam no gramado verde, soprávamos e soprávamos bem forte para ver quem conseguia com o sopro levar o algodão para mais longe.
Ao tocar novamente o algodão no meio daquele gramado verde, senti a mesma sensação de como se ela estivesse com as suas mãos entrelaçadas entre as minhas, fechei meus olhos e com um sorriso bobo e perdido aproveitei a sensação.
Ouço pegadas de longe, e rapidamente abro meus olhos escondendo-me o mais rápido possível, ainda não estou preparado para o mundo, mas não vejo ninguém.
Tento farejar ao ar aquele perfume doce, que vinha lá de longe do caminho do jardim, e não vejo ninguém. Isso começa a me incomodar.
Espere, eu conheço essa pequena luz que se apaga, sim é o brilho das asas da minha fada! Corro e subo na árvore mais alta e escondida do jardim com o coração acelerado, com os olhos bem abertos e trêmulo, minhas pernas quase não conseguem apoio no meio dessas galhas mas consigo me firmar, até que...
Eu a vejo de longe, andando distraída e devagar observando cada passo que dá, e eu? eu não acredito que estou aqui de longe a observar minha fada!
Cautelosamente eu observo seus passos indo embora e sumindo da minha visão, e outra vez minhas lágrimas não cansam de cair por dentre as galhas, escorrendo pelas folhas até chegar ao chão.
Uma vontade imensa de correr e falar, falar sem parar, de rasgar o meu peito e me declarar, uma enorme e incontrolável vontade de correr para os seus braços e me perder nos seus abraços... Mas não dá, eu a perdi.
Todos os dias então eu passo a frequentar o Jardim na esperança de me deparar com ela, na esperança de encher de ternura novamente o meu olhar e coração. E foram muitos dias assim, até perder novamente a esperança de um reencontro.
Em um certo dia ao sair da caverna para buscar lenha para me aquecer nas madrugadas de frio, em um lugar bem próximo de onde eu estava ali também estava ela, ela não me viu, mas resolvi tocar em seu ombro e lhe dar o que ela costumava tirar de mim com facilidade e de verdade, o meu sorriso, ela correspondeu assim com um singelo e tímido sorriso enchendo o meu coração de sentimentos, e uma inexplicável felicidade tomou conta de mim, a abracei forte e não a quis soltar, ela tentou se esquivar mas a prendi no meu abraço, tentando demonstrar toda a falta e a saudade que estava dela, tentei demonstrar em um abraço tudo o que em palavras eu não poderia dizer, tudo aconteceu tão rapidamente, mas em minha cabeça aconteceu como que em câmera lenta.
Seu rosto envermelhado e tímido me deu um sorriso de canto e vergonhoso, sem dizer uma palavra ela se virou partiu.
Fiquei ali parado, anestesiado, inconformado e em choque. Ela estava aqui, mas partiu em questão de segundos. E ali fiquei sem saber se o meu coração se espedaçava em mil ou se sorria por dentro, uma mistura de lágrimas e sorrisos tomou conta da minha alma.
E ali parado no meio do nada fiquei sozinho olhando ela partir.