Um dia marcado.
Luz, muita luz, mais por que raios havia luz? Pisquei, tentava me acostumar com aquela maldita luz diretamente na minha cara, eu imaginei que era alguma brincadeira dela e logo sorri, mais não era, era apenas a maldita luz do sol invadindo pela janela, mais quem foi que abriu a droga das cortinas? Ela? Não, ela não, ela provavelmente não faria isso, ela me deixaria dormindo, então quem foi? Repassei uma lista de quem possuía a chave de casa em minha cabeça, Mary, exato, então eu posso deduzir que hoje é uma segunda-feira, que maravilha, odeio segundas-feiras. Demorei um bom tempo – pelo o que presumo – para levantar. Sorri ao ver a foto dela na cabeceira e fui em direção ao banheiro. Eu estava horrível, olheiras profundas, a barba por fazer e o cabelo de um jeito que nem um tornado conseguiria deixar igual, ignorei e fui em direção à cozinha, estava um frio gostoso, principalmente lá que a calefação estava precisando de um concerto há um bom tempo, mais eu não me importava, eu gostava do frio, e aquele vento estava até que sustentável… Mary estava lá, ah, a adorável Mary, esteve comigo desde que me mudei para aquele apartamento meia boca no centro de Londres, ela sabia cuidar daquele apartamento e de mim como só a minha mãe sabia fazer. Dei um beijo na bochecha dela e como resposta ela me envia um olhar de preocupação e um sorriso meio forçado, ah meu querido, eu detesto esse olhar, significa que eu devo ter feito uma bela de uma burrada ontem ou algo muito ruim aconteceu. Analisei seu rosto e vi que ela havia chorado recentemente, não perguntei, só a abracei e ela, de vez de desabar, se fez de forte e sorriu. Peguei a garrafa de Whisky na geladeira que estava só até a metade e ela me olha com reprovação, mostro a língua pra ela e volto em direção ao quarto, minhas roupas estão jogadas em todo o canto do quarto, menos o sobretudo, esse está no gancho atrás da porta como se nunca tivesse sido tocado, o que é engraçado, porque depois daquilo, eu o uso quase todos os dias. Peguei a primeira calça Jeans e camisa que eu achei e vesti, peguei o antigo e surrado chapéu em cima da escrivaninha, o sobretudo impecável e sai do quarto, acho que nem avisei Mary que eu ia sair, não me recordo direito, provavelmente não. O vento era mais forte na rua, e o céu dava indícios de que choveria logo, o que era bom, fazia tempo que não chovia. Eu caminhava pesadamente, sem um destino, apenas gostava de caminhar, me fazia pensar um pouco, bati a mão no bolso e senti a caixinha do cigarro, peguei, estava vazia, tomar no cu, quando eu preciso nunca tem. Entrei no primeiro bar que eu encontrei e pedi um maço enquanto via o jogo que passava na tevê. Pera ai, jogo, hoje? Não era possível, esse jogo era daqui a 3 semanas, eu me lembro, pois era na data, naquela data. Perguntei a data para o senhor mais próximo de mim e ele respondeu o que eu temia “ 16 de novembro”. Parei em choque, não era possível, eu não fiquei tanto tempo sem tevê assim, no mínimo uns 4 dias – que eu me lembro –, não era possível já ser dia 16, dei uma nota de 20 pro balconista, peguei o cigarro e sai. Eu alternava entre um gole na garrafa de Whisky e uma tragada no cigarro, eu andava agora para um destino certo, era horrível, enquanto eu andava eu lembrava de tudo, da chuva forte, do caminhão, a luz forte em meu rosto e do grito, ah, isso era o pior. Tentei encher a minha mente com outra coisa, não deu tempo, eu já havia chegado. Cheguei em frente a um portão de ferro, era velho, você percebia, pelos muros do lado quase caindo aos pedaços, entrei no local com o costumeiro rangido que me dava um vazio na alma do portão, eu não precisava andar muito, uns 30 metros e eu já estava em frente, em frente da lápide, havia um buquê de rosas vermelhas lindas ao pé da lápide, agora eu sabia porque Mary estava chorando, ela esteve aqui antes de ir pro trabalho. Eu olhava para a foto dela que eu havia trazido logo após o acidente, ela estava linda, radiante, com os cabelos loiros quase encobrindo o olho direito, eu me permiti sorrir nesse momento. Eu lia a lápide dela repetidas vezes. “Alice Cooper – Amada esposa, filha e amiga.” Logo em baixo a frase de vida dela. “ Que seus sonhos sempre prevaleçam todas as dificuldades.” Eu chorei, chorei feito um bebezinho, um ano, um ano sem ela, um ano que eu tentei ser forte e dizer que estava tudo bem quando na verdade eu estava morrendo por dentro, e o pior, eu não trouxera nada pra ela. Eu precisava entregar algo pra ela, ela merecia, ela merecia tudo no mundo, mais eu não possuía nada, apenas o sobretudo que ela tanto amava, eu o tirei, dobrei e coloquei cuidadosamente do lado do buquê de flores, eu sabia que ela iria gostar, ela o adorava, estava sempre o usando dentro de casa quando saia, não importava se cabia 4 dela dentro, ela usava sem vergonha. Me agachei e dei um beijo na foto e fui embora, deixei Alice descansando, pois apesar de tudo, ela precisava disso.