O ANIVERSÁRIO DE HELENA

Seu sonho estava prestes a se realizar: a maior festa de aniversário no dia em que completaria 40 anos. Nunca tivera uma festa de aniversário com a família. Um pouco por culpa dela mesma, que sempre preferiu passar seus natalícios em fins-de-semana fora de casa. Pelo menos, assim foram todos os seus aniversários depois de casada. Evitava o rebuliço e a trabalheira que dava fazer uma festa de aniversário. Aliás , achava muito chato preparar uma festa para a comemoração do próprio natalício. Muito pernóstico, pensava Helena.

Mas neste ano a data era especial, 40 anos era uma bela data, ainda mais que se sentia realmente com 18, 19 anos. Com plena saúde e disposição, a família praticamente criada ( o caçula de 5 filhos estava com 18 anos), o marido cada vez mais atencioso e gentil, estava feliz, enfim. E queria que todos soubessem de sua felicidade, de sua alegria de viver. Que melhor ocasião do que uma festa bem preparada, para os amigos e a família ?

Gente é que não ia faltar. Tinha 8 irmãos e seu marido era o mais novo de uma irmandade de 6. Todos casados, com filhos, de tal forma que entre irmãos e irmãs, cunhados, cunhadas, sobrinhos e sobrinhas, era para mais de 60 pessoas. Todos muito festeiros, gostavam de fazer e de participar de festas por qualquer motivo que fosse.

— Então, vou fazer a MINHA FESTA ! — decidiu-se Helena, e começou os preparativos. Mandou a faxineira caprichar na limpeza, telefonou para fornecedores de salgadinhos, fez uma lista dos amigos que ia convidar. Comprou um vestido novo, clássico, cujo decote dava um toque sensual, na justa medida em que queria impressionar principalmente o marido.

A festa seria no sábado, dia do aniversário. No começo da semana, falou com o marido:

— Carlos, no sábado vou fazer uma festinha para comemorar... coisa só para os parentes, sabe como é... — Falou assim como quem não dava importância. Queria fazer uma surpresa também para o marido.

— Acho melhor não. — A resposta de Carlos bateu-lhe no espírito como um balde de água gelada. — Vai dar muito trabalho. Olha, vamos fazer assim, vou fazer uma reserva para nós dois no Restaurante Senador, você já conhece. É o melhor da cidade e quando se trata de um jantar especial, eles então capricham: à luz de velas, champanhe, o quarteto de cordas vem tocar à nossa mesa. Que tal?

— Mas, Carlos...

— Não tem mas nem meio mas. Já estamos combinados, certo?

Helena, embora decepcionada, achou ótima a idéia do marido. Entretanto, não ia mudar de idéia assim tão de repente. Aliás, já tinha feito uma série de telefonemas para as amigas e ia ficar muito chato cancelar tudo. No decorrer da semana tinha certeza de convencer o marido para sua idéia.

Na quinta feira, voltou ao assunto. O marido insistiu no seu convite para um jantar de gala. Como argumento final, Helena revelou:

— Sabe, Carlos, há mais de 15 dias já falei com a Mara, a Conceição e mais umas 20 amigas que vamos nos reunir aqui em casa e agora não tenho como desmarcar tudo.

— Deixa comigo. Mando minha secretária explicar tudo, sem problema.

Agora, Helena ficou mesmo chateada. Mas se conformou. Na sexta feira continuava aborrecida e desanimada, quando Lucinda lhe telefonou.

— Tá lembrada de mim? Nós cantamos juntas no coral da igreja, lembra-se?

Ah, sim, a Lucinda. Lembrou-se da antiga companheira, passaram bons momentos juntas, mas Helena deixou o coral e nunca mais viu a amiga. Era para dar os parabéns antecipados, pois Helena nunca ficava na cidade no dia do seu aniversário.

— É, mas este ano vai ser diferente. — E Helena passou para Lucinda sua decepção com relação à comemoração que pretendia fazer.

— Pois então, querida, anime-se! Faz de conta que vocês são sempre namorados, e curta mais esta!

— Não sei não, tou numa fossa danada!

— Olha, vamos combinar o seguinte: vou telefonar pro Antoâine, meu cabeleireiro, marco uma hora pra você. Amanhã pela manhã. Você toma um banho de beleza e sai maravilhosa com seu marido.

No dia seguinte, dez horas, Helena e Lucinda encontram-se no Antoâine. Abraços, beijinhos, aquelas coisas de amigas que há muito não se vêem. Helena acomoda-se na cadeira que lhe estava reservada enquanto Lucinda promete:

— Enquanto cuidam de você, vou ficar aqui rezando pra que tudo dê certo.

Helena compreendeu. Lucinda sempre fora de rezar muito, era devota de Nossa Senhora de Fátima e parece que conseguia da santa tudo o que pedia.

De volta ao lar, Helena passou a tarde descansando, preparando-se para o jantar com o marido. Pelas oito da noite, tanto ela quanto Carlos já estavam prontos, mas ainda era cedo para saírem.

— Vamos sair agora, subimos até o Mirante. A vista da cidade lá de cima deve estar maravilhosa hoje. Tomamos um drinque naquele barzinho romântico e descemos para o restaurante. Que tal?

Saíram. Carlos dirigindo cuidadosamente, aliás bem devagar mesmo. Foram ao Mirante, tomaram uns drinques e já passava das nove quando desceram rumo ao restaurante. De repente, Carlos falou:

— Puxa, temos de passar em casa, esqueci o cartão de crédito e o talão de cheques.

Helena achou que o marido estava mais emocionado do que ela. Ele nunca se esquecia nada ! E foram, Carlos ainda dirigindo com vagar, sem pressa. Helena observando e estranhando.

Ao chegarem em casa, Carlos pediu-lhe que entrasse também em casa, não gostava de vê-la sozinha num carro estacionado, à noite. Achando graça em toda a situação (os drinques tomados no bar estavam fazendo efeito) Helena acompanhou o marido. De braços dados encaminharam-se para a porta principal. A casa estava às escuras, só a lâmpada do pórtico acesa. Mas quando Carlos abriu a porta, um clarão se fez na sala, todas as luzes da casa acenderam-se ao mesmo tempo.

Helena, ofuscada e assustada, deparou-se com uma pequena multidão de parentes e amigos que, a uma só voz, cantaram com alegria e entusiasmo:

Parabéns pra você, nesta data feliz...

Lágrimas de felicidade rolaram pelas suas faces enquanto ouvia o coro . Ali estavam todos os parentes e amigos, Lucinda e as colegas do coral, enfim, todas as pessoas que Helena pensara em convidar — e muitas outras de quem sequer lembrara.

A festa foi até de madrugada. Serviço de bufet de primeira, companhia alegre e agradável de todos e o permanente sorriso maroto do marido.

Uma festa de aniversário da qual Helena vai se lembrar pelo resto de sua vida.

ANTONIO ROQUE GOBBO

BELO HORIZONTE = 24.AGOSTO.2000

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 09/03/2014
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