Mais uma loucura de Bárbara

Livros e livros pela janela, aos montes, por arremessos, por raiva, melhor dizendo; por tédio! Mais um ato de rebeldia sem sentido, bem como era de seu feitio, do conhecido descontrole emocional da tão apaixonada, e por ora enfadada de romances, Bárbara. A próxima remessa seria de filmes, ah se ela pudesse jogar pessoas, talvez os pobres livros estivessem salvos. Bárbara tinha muitos problemas, às vezes todos, que sempre curava com suas manias de amor, fantasiava namorados, amigos, visitas, tudo, pois o que tinha de realidade estava cada dia mais distante de seus bem planejados sonhos românticos. Ia da realidade ao sonho em um passe de mágica, como um ato de necessidade, insana ora desesperada, não via muitos problemas, enquanto também não encontrava outras soluções, cada dia mais sozinha, desgostosa, sem saber o porquê. A tristeza do dia veio após um copo de danone, meio distraída, menos infeliz, pobre Bárbara, a tristeza sempre a visitava quando menos esperava, sempre a encontrava despreparada, não havia muita coisa a fazer que não parecesse, ora realmente fosse, uma loucura. Se havia alguma explicação para os disparos da parte mais intima de seu quarto, de seus sonhos, era a fadiga, talvez ciúme, que tinha pelas historias que lia, em comparação com as que ela vivia, ou melhor, não vivia. A casa estava de pernas para o ar, tudo que pudera lembrar amor estava prestes a ir janela abaixo, até seus coitados ursos de pelúcia que cuidava com tanto zelo, tanto amor, para ela, naquela aquela, inútil amor. Estava cega, de tristeza, não percebia, preferia não perceber, isso a traria ainda mais tristezas, se ainda fosse possível, e se tinha algo que a menina estava mais farta do que amor, era certamente de tristezas. A brilhante ideia era que se livrando dos amores, nada mais poderia lhe causar tristezas, estava tão desesperada, insana, que havia esquecido a única coisa no mundo que lhe fazia sorrir. Compreensível, há tempos a menina não sorria de verdade, com amor. Mudança feita, das gavetas para a calçada, da cabeceira da cama ao chão da rua, e seu coração continuava só, tudo havia ido pela janela, metade da casa estava na rua, inclusive ela... A menina era louca, completamente louca, mas não erra burra, apenas mimada, enfastiada, impaciente... Seu romance estava demorando, enquanto lia dezenas e dezenas de ‘finais felizes’, não via nem um sinal do seu começo, no cinema sua companhia ainda era apenas a pipoca, e no máximo um casaco, ai dela se não levasse um casaco... O jornaleiro do outro lado da rua tinha certeza, foi posta para fora de casa, alguma besteira daquelas havia aprontado, outros pensavam que ela era maluca, como muitos no bairro já achavam, e alguns passaram a ter certeza ao ver a menina recolhendo seus pertences do chão da rua, de joelhos, nervosa, minutos depois de terem sido atirados pela janela... Ah, se soubessem quem os jogou, se soubessem da besteira que a menina havia feito, de abrir mão da sua felicidade, sem saber o porquê. Que dia. Agora a menina estava cansada de verdade, desarruma tudo, joga pela janela, desce escada, sobe escada, recolhe tudo, arruma de novo, dessa vez com mais carinho, mas com a mesma tristeza, seu problema era esse, fazia tudo diferente, inventava diversas coisas todos os dias, mas fazia tudo com a mesma tristeza. Um beijo em cada urso, em cada livro, em cada filme, nos presentes que deu a si mesma, nas cartas românticas escritas de próprio punho, e prometeu que cuidaria melhor deles, de tudo... Pena não ter feito a mesma promessa a seu coração... Era mais fácil arrumar e cuidar da casa. Por hora chegava ao fim mais um de seus desatinos, a menina ia dormir, não sem antes dar um boa noite bem carinhosos ao seu grande amor, e lhe fazer um pedido: ‘por favor, apareça logo’. Prometeu que leria novamente todos os livros e que jamais deixaria de desacreditar no amor, mesmo que isso a cansasse como a tanto tempo vinha fazendo. Pobre Bárbara não tinha um segundo de sossego, e a qualquer momento estaria a surtar, pedindo carinho, beijos, um ‘eternamente’... Assim eram seus dias, tristes surpresas, bastava abrir um danone, não podia fazer nada, sem que lembrasse, que lhe faltava amor.

Luís Moreira
Enviado por Luís Moreira em 09/01/2014
Código do texto: T4643111
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