ANDANÇAS - A HISTÓRIA DE MALENA (Vida e Superação de Vida) PRIMEIRA PARTE - CAPÍTULO 12
Eu já estava começando a me entediar com a rotina mansa e sem objetivo que vinha levando. Ainda que tendo tudo do bom e do melhor não me via satisfeita. A mulher tinha uma vida social relativamente intensa. Em algumas saídas suas eu a acompanhava. Boas roupas e caras joias eram coisas com as quais eu não precisava me preocupar. Seu guarda roupa ficava a minha disposição e embora não fossem exatamente as mesmas as nossas medidas eu sempre encontrava algo que me agradava e me cabia perfeitamente. Raramente via, nos amigos que me apresentava, um cuja conversa fosse do meu interesse ou que me acrescentasse algo de novo. Os assuntos não saíam da esfera dos altos negócios fechados no estrangeiro, das lucrativas transações comerciais, carros de luxos e da corrupção política. Por esta e por outras razões não menos significativas passaram a ser mais frequentes as minhas recusas do que as aceitações a seus convites para sair. Limitava-me a acompanhá-la em suas compras. Foi, contudo em um desses eventos fastidiosos que conheci uma pessoa que mexeu com meus sentimentos.
O mundo da moda e da alta costura era o negócio desta mulher cujo destino fizera com que entrasse no meu caminho. Como já mencionei, em seu círculo de amizades imperava muita inveja e muita concorrência. As pessoas eram puramente materialistas em sua grande maioria. O dinheiro parecia ser o seu deus e por ele não mediam esforços. A impressão que me passavam era que mentir era a arma do poderoso e o vencedor seria o mais habilidoso em elaborar e fazer prevalecer as suas mentiras. Tripudiavam com tamanha facilidade que se faziam heróis aos olhos dos que foram manipulados. Conheci um senhor que se apresentou a mim como um cliente assíduo e fiel de minha amiga. A introdução foi feita por ela mesma, mas nunca o perfil completo de sua personalidade ou de seu mundo particular. Não que ela se negasse a me fornecer esses dados, mas por lhe serem eles completamente desconhecidos, também. O que lhe interessavam, em primeiro plano, eram os lucros que as transações com ele lhe pudessem proporcionar; o resto passaria a ser mero detalhe. Deixei-me levar, contudo, por sua personalidade magnética e seu charme como cavalheiro. Mostrou-se atencioso ao extremo com a minha pessoa desde o momento em que fôramos apresentados e não é nada difícil para uma mulher perceber quando está sendo do agrado de alguém do sexo oposto.
Não existe uma conversação, especialmente aquela que se trava com quem nos foi apresentado recentemente, em que não pairam assuntos de âmbito profissional de ambos os lados. Quanto a mim não tive o que esconder e muito menos motivos para fazer isto. Mas, não sei se fui levada pela desconfiança própria dos ambientes que me estavam sendo apresentados; o fato é que pressentia a leveza de suas palavras à medida que conversávamos. Isto não tirava dele a enorme simpatia e capacidade de prender alguém na rede da argumentação. Os elogios são o ponto fraco de uma mulher e como ele fazia em muitos aspectos o meu tipo de homem fui deixando me envolver por suas palavras encantadoras. Caí como uma presa na armadilha de sua conquista. Passamos a nos ver outras vezes. Como não tinha muito com que preencher meu tempo era com ele que passava quase todos os fins de semana e um e outro dia útil, em função do impedimento que seu trabalho lhe imputava. Era considerável nossa diferença de idade. Ele já ia próximo dos quarenta e, segundo me contou, já fora casado por duas vezes, possuía duas filhas da primeira esposa e vivera os últimos sete anos nos Estados Unidos onde fora casado mais por uma questão burocrática a fim de conseguir sua permanência no país. Os negócios que tentou empreender por lá foram totalmente aquém de sua expectativa e ele abandonou tudo, voltando a tentar sua sorte em nossa pátria.
Impressionou-me o respeito que tinha por mim em todos os sentidos. Demonstrava um amor quase puro. Saíamos com frequência; ele era um aficionado por cinema e era raro um fim de semana em que não nos encontrássemos assistindo a um sucesso de bilheteria ou alguma estreia na cidade. Mesmo na sala escura sua atenção voltava-se concentradamente para a película, embora me abraçasse terna e suavemente. Os beijos não passavam de bicotas inocentes nos lábios e em minha face. Foram meses de convivência que me trouxeram muito bem estar e satisfação; pela companhia agradável, de um homem super cavalheiro, que sabia tratar como ninguém o sexo oposto. Se algo nele me incomodava era o delicado tom de mistério que fazia de sua vida, pois muito pouco ou quase nada falava de si. Se há uma coisa que inculca uma mulher é não saber verdadeiramente as intenções de um homem para com ela. Por ser grande nossa diferença de idade e por nossos momentos íntimos serem praticamente inexistentes não me era difícil sentir-me como uma filha ao seu lado.
Quando eu mencionava essas coisas para ele obtinha respostas evasivas do tipo “sinto por você grande amor e admiração”. Eu insistia no assunto, tentando arrancar dele frases mais concretas, mas ele conseguia sair pela tangente e mudar de assunto. Quando eu perguntava o que achava do sexo ele me respondia que não existia, na vida, momento mais sublime e especial do que uma relação de amor entre um homem e uma mulher. Eu repetia a pergunta, frisando que sim, que o amor era muito importante, mas que eu estava falando de relação íntima entre um casal. Então ele me respondia que gostava imensamente de sexo, contanto que fosse na ocasião certa e com a pessoa certa. Eu perguntava se me achava atraente, se me considerava a pessoa adequada para ele. Ele me respondia que não tinha dúvidas quanto a isso. O interessante é que ele não demonstrava quaisquer sinais de desconforto, tampouco timidez diante das minhas indagações. Era sempre seguro e convicto em suas respostas. Nunca perdia a oportunidade de me elogiar e dizer o quanto me amava e quão puro era o seu amor por mim. Era tamanha minha admiração por ele que passei a tê-lo como conselheiro toda vez que me surgia algum problema, ou quando desejava uma opinião recorria a sua sabedoria; não nego que me foi útil em inúmeras situações em que precisei da ajuda de outra pessoa.
Desde que me instalei em Cabo Frio até o dia em que de lá parti a fim de iniciar uma outra etapa de minha vida foram decorridos pouco mais de três anos. Durante todo esse período de tempo o cavalheiro apresentado por minha amiga foi o único homem que tive. Mesmo depois de já estar conhecendo muito bem a cidade eram raras as vezes em que eu saía sozinha. Ela era uma mulher viúva há anos. Embora tivesse uma vida social intensa, adorava a minha companhia. Seus divertimentos ou reuniões de amigos, quando não estava em seu ateliê de costura eram quase sempre à noite. Fiz com que compreendesse a necessidade que eu sempre tivera de dormir um bom número de horas para me sentir bem; sendo assim, jamais consegui acompanhar sua rotina noturna. Para não dizer que era totalmente caseira não dispensava meu banho de mar duas ou três vezes por semana. Diferentemente dos dias de hoje as moças do meu tempo não eram tão assediadas. Não chamavam tanto a atenção em trajes de banho; estes eram discretos, resguardando todo e qualquer pudor. Mas não deixavam de ser apreciadas e cortejadas por isso. Por mais comedidas que fossem em suas formas de se trajar e se comportar não conseguiam esconder belas curvas, tampouco impedir os olhares maliciosos dos homens. Para um homem se aproximar de alguém do sexo oposto sem conhecê-la havia todo um ritual. Na verdade, tudo acontecia naturalmente.