NA FLORILÂNDIA
O ano era 1977, e o mês, junho...fazia poucos dias, passara meu aniversário, e a então mulher da minha vida me sugeriu que passássemos o lindo domingo ensolarado em Petrópolis, passeando....ela me ligara ainda cedo e eu prontamente concordei, embora no íntimo soubesse que as coisas não iam bem entre nós, ela estava estranha, distante, meio que comigo por obrigação, bem diferente da mulher que fora, há pouquíssimo tempo. Mas, em nome do amor, uma oportunidade de estar a sós com ela era sempre uma oportunidade, longe de sua mãe autoritária e que vez ou outra, nos impingia sua companhia desagradável, e que eu tolerava apenas por amar demais.
Apanhei-a em casa por volta das dez horas, e saímos...peguei o Aterro do Flamengo, passando pelo entorno da baía da Guanabara, tão linda como um cartão postal...e naquele dia, parecia-me ainda mais bonita...e enquanto dirigia, pensava em como tinha sido especial a moça sentada a meu lado, eu a conhecera no inicio de 1972, apresentada por um amigo comum, (na época tb apaixonadíssimo por ela) e a partir daí, passara a povoar os meus mais pueris sonhos...
Ela era muito bonita, muito parecida com Sônia Braga, (fato constatado na novela Gabriela, 1975), estudante de biologia, e desde que a conheci, fomos ficando amigos, e ela se tornara quase uma ideía fixa, ou seja, a vida seguiu seu fluxo normal, mas meu objetivo principal era um dia conquistar o coração daquele linda menina.
Mas, o fato é que a vida ia acontecendo, e demorou bastante tempo para isso ocorrer...nos tornamos amigos, e eu virei uma espécie de confidente...passaram pela vida dela outros valetes de copas, antes de um dia especial, em 1975, estávamos na Praia Vermelha, conversando dentro do carro, e de uma maneira peculiar, sem que eu esperasse, ela colocou a mão sobre meus olhos e tascou-me um beijo delicioso, do qual me lembro até hoje...e eu fiquei extasiado, paralisado, custando a acreditar no que acontecera...mas acontecera.
Depois desse dia, foram mais seis meses meio indefinidos, ela tinha um namorado e só terminou isso em março de 1976, quando assumiu o nosso namoro.
Agora, estávamos ali, passeando em Petrópolis, trocando beijos, de mãos dadas...ela gostava de explorar lugares novos, e justamente quando passávamos por uma rua estreita próximo à Samambaia, uma placa chamou a atenção dela, e me pediu para parar o carro...uma placa dizia "FLORILÂNDIA". estacionei e descemos...era um lugar muitíssimo bonito, com um jardim amplo e totalmente repleto de flores, com stand de vendas, uma floricultura, mas especialmente linda...
Andamos pelo jardim, e nos sentamos em um banco. Reparei que havia uma serie de bonequinhos, que à medida que o vento entrava em ação, rodavam um pequeno moinho de vento, esses bonecos estavam ao longo desse jardim...um cenário perfeito para juras de amor eterno...mas exatamente nesse momento, ela me disse que queria terminar, que se encantara por outro, e que não achava justo continuar comigo e acabar me enganando, o que fatalmente ocorreria...e por mais bizarro que possa parecer, nesse exato momento um som ali instalado começou a tocar "As rosas não falam" de Cartola...
"Volto ao jardim, na certeza de que devo chorar, pois bem sei que não queres voltar, para mim..."
Depois desse dia, entre idas e vindas, passou-se mais um ano e três meses, até o adeus definitivo...o que será isso, que faz as pessoas alimentarem um sonho, fazerem com que ele crie vida própria, voar na asas do desejo e depois a vida faz com que ele caia ao chão, apesar da esperança de que desse certo...
Claro, o tempo passou e me curei, nada há que o tempo não seja o melhor conselheiro e não cure...por isso penso que deve-se viver a vida, em toda a sua plenitude, emoção, loucura, prazer, tristeza, alegria, pois quando me recordo da Florilândia, me vem à mente aqueles bonequinhos rodando os moinhos, num lugar tão belo, e mais uma vez me vem à mente os maravilhosos versos do mestre Cartola, quando diz.."preste atenção, o mundo é um moinho..." e ele tinha razão...