Dois Amigos e Um Segredo- Final
Eles pensavam que seu relacionamento era um segredo absoluto. Mas, na verdade, não era bem assim. Os demais companheiros de banda desconfiavam, embora não tivessem certeza, e outras pessoas próximas também. Principalmente pelo fato de que Leon praticamente se mudara para o apartamento de Andrei, e os dois eram vistos juntos por toda parte, e as mulheres que os cercavam eventualmente pareciam meros acessórios para disfarçar uma situação. Mas, tudo eram apenas desconfianças, e muitos acreditavam que eles fossem apenas como dois irmãos. Prosseguiam com sua agenda de shows, por cidades e estados diferentes do Brasil, sempre com muito sucesso. Suas canções eram dirigidas principalmente ao público jovem e adolescente, e eram tidos como ídolos e modelos dessa geração mais nova.
Já fazia um ano que Leon e Andrei estavam juntos. Eram felizes, embora Andrei nunca tivesse dito a Leon o que de fato sentia por ele. Mas o guitarrista não se importava com isso, entregava-se sem reservas, era suficiente para ele que Andrei se deixasse amar. E isso ele deixava... e gostava muito de fazer amor com Leon, de sentir os carinhos de sua boca molhada e quente, como se estivesse tomada por uma espécie de febre...
Havia, porém, um problema; Andrei estava cada vez mais dependente da cocaína. Para atingir o mesmo efeito de antes, tinha de aumentar cada vez mais as doses. Leon se preocupava com isso, mas não queria abordar esse assunto com o amigo, pois sabia que ele se aborrecia e não queria repetir os mesmos erros da ex-mulher de Andrei. Ele mesmo estava bastante viciado, cheirava várias vezes por dia, mas ainda se baratinava com pequenas doses. Sempre que cheiravam, Andrei lhe dizia que aquela tinha sido a última vez, que iria parar. Mas depois saía para uns lugares suspeitos, e voltava com saquinhos de pó branco...
Naquela noite eles viajariam para uma série de shows no Norte do país. Leon fora buscar seu carro que deixara no conserto, e ao abrir a porta do apartamento, chamou o amigo.
- Andrei! Cheguei! Como demoraram pra consertar essa bosta de carro... e a gente tem de viajar daqui a pouco...
Não houve resposta. Leon abriu a janela do apartamento.
- Andrei! Onde você está?
E dirigiu-se para o quarto. Lá estava Andrei, caído sobre a cama. Leon jogou-se sobre ele.
- Acorda, querido! Sabe que horas são? A gente tem...
Mas parou. Sentiu o corpo de Andrei diferente... gelado... ao virá-lo, viu que seus olhos cor de mel estavam abertos e vidrados, e uma espuma sangrenta escorria por um dos cantos de sua boca.
No primeiro momento Leon não quis entender o que havia acontecido. Depois gritou e caiu de joelhos no chão.
Quando se ergueu, estava completamente calmo. Nenhuma dor, nenhuma agonia transtornavam seu rosto. Foi até a sala, pegou uma caneta e um pedaço de papel e rabiscou um bilhete.
" Não fui eu que matou o Andrei. Quando cheguei aqui ele já estava morto. Estou indo ao encontro dele. Peço que nos enterrem juntos."
Leon deixou o bilhete sobre a mesa da sala. Depois foi até o aparelho de som e colocou o CD de Mariah Carey na faixa ' Without You" no modo repeat, de forma que tocasse indefinidamente. Então voltou até o quarto, onde jazia o corpo sem vida de seu grande amor.
Vasculhou os bolsos da calça de Andrei e encontrou o afiado canivete, com o qual haviam feito tempos atrás um pacto de sangue, e do qual Andrei nunca se separava. Era seu amuleto de sorte, dizia.
- Não posso viver sem você, meu amor- disse Leon, acariciando-o com uma ternura infinita. - Quero dormir no seu peito... para sempre.
E, louco, perdido, transtornado, cravou profundamente o canivete em ambos os pulsos, até o antebraço, abrindo as veias. A dor era indescritível. O sangue começou a esguichar de suas veias, manchando as paredes, os móveis, o chão, derramando-se sobre a cama, onde tantas vezes haviam feito amor, onde ele perdera sua virgindade como gay.
A canção tocava sem parar... tudo rodava à volta de Leon agonizante. Como num turbilhão, ele lembrou confusamente da pista de skate, dos caras transando no matinho, da carreira de ambos, do momento em que fora possuído pela primeira vez... inclinou-se e beijou pela última vez os lábios gelados de seu grande amor. Depois deitou-se no peito dele, e ali morreu, esvaindo-se em sangue...
No outro dia os vizinhos estranharam e chamaram a polícia, que encontrou os dois rapazes mortos.
E a música tocava...
Não ao suicídio.
Não às drogas.
Sim ao amor e à vida.
FIM