ANDANÇAS - A HISTÓRIA DE MALENA (Vida e Superação de Vida) PRIMEIRA PARTE - CAPÍTULO 6

A partir daquela conversa que tivera com minha prima já me sentia mais leve e animada. Obtive dela muitas palavras de incentivo que me encheram de força e coragem para enfrentar a nova vida. Ela estava perto de completar trinta anos, logo, tinha o dobro da minha idade e consequentemente o dobro de experiência. Tinha, portanto muito a aprender com ela. Contudo, a despeito de todo aquele apoio e compreensão eu não conseguia sentir-me cem por cento segura. Por fazer parte de nossa família e por mais que quisesse meu bem e minha felicidade, nada podia me garantir que, uma hora ou outra, mamãe não descobrisse o meu paradeiro; bastaria uma visita ou um telefonema e tudo estaria perdido.

Sendo assim passei a rever os meus planos no sentido de garantir a minha total segurança. Quem quer que esteja do lado de fora e acompanhando esse relato da minha vida há de entender e sentir como era dura e difícil a minha situação. Imagina ter que se esconder da própria família! Tudo por causa de uma única pessoa que entrara a participar dela aparentemente para melhorá-la e torna-la próspera, mas que, na verdade trouxera a ruína total. Só de pensar no desespero de minha mãe eu não me continha de tristeza. Foi com esses pensamentos que, numa noite tomei a decisão de escrever para ela uma longa e minuciosa carta.

Só o fato de saber que lendo a minha carta e me sabendo viva e com saúde ela se sentiria novamente alegre e animada me fez retomar também um pouco da minha alegria perdida. É evidente que não lhe contei a verdadeira causa da minha decisão de deixar a família, pois isto tornaria tudo muito mais complicado. Mas falei da minha insatisfação com a vida; que jamais poderia alcançar os sonhos que vivia acalentando se continuasse debaixo de suas asas. Supliquei-lhe humildemente que me perdoasse a dor que sabia estar-lhe causando, mas que tudo era por uma causa mais do que justa e que, num futuro muito breve eu lhe estaria provando que fora correta a minha atitude porque era o meu futuro que estava em jogo. Dei-lhe certeza do grande amor que tinha por ela e por todos e quão grande já era a minha saudade. Minha prima apoiou-me totalmente após ler junto comigo todo o texto.

Fi-la prometer por tudo que ela tinha de mais sagrado que jamais, por motivo algum revelasse a minha família o meu paradeiro. Ela aceitou a jura, mas sob a condição de que eu, o mais rápido possível os visitasse, a fim de tranquilizar todos ainda mais. Eu prometi que o faria, mas no tempo certo e os motivos ela já os conhecia. Demais, queria visitá-los, sim, mas de posse de uma situação estável e convincente, por isso eu precisava arranjar estudo e uma colocação o mais rápido que conseguisse. Ela concordou comigo e acrescentou mais uma jura: a de me auxiliar no que eu necessitasse para conseguir esse intento.

Daquele dia em diante era como se uma grande paz tivesse de mim se apoderado. Minha cabeça andou mais leve e consegui idealizar grandes planos para o meu futuro. O principal deles dizia respeito a uma colocação profissional. Tinha certeza de que trabalhando, ocupando-me em algo útil não teria muito tempo para preocupações e tristezas. O maior peso parece que já havia saído de minhas costas, que era a agonia quanto à tristeza e o desespero de minha mãe, mas mal sabia eu que meus problemas se haviam somente iniciado. Ao mesmo tempo em que empreendia as minhas saídas quase que diariamente, quase sempre acompanhada de minha prima, aproveitava para visitar algumas imobiliárias que dispusessem de uma casa na região da Ilha Rasa, pois era lá que eu pretendia morar, pelo menos por uma boa temporada. A quietude do lugar, a atmosfera praiana e a simpatia dos moradores sempre me atraíram àquele recanto de Búzios.

Ela insistia sempre para que eu continuasse em sua casa, mas acabou, no final, vencida por meus argumentos. Eu precisava mesmo de um período exclusivamente meu, ou seja, distante de qualquer contato familiar. Ela entendeu o meu ponto de vista em razão de tudo que acontecera comigo, mas não negava ser um tanto radical a minha atitude.

Pode parecer mesmo estranho o fato de uma menina na flor da idade como eu estar assim tão determinada em relação a sua independência futura. A época em que passei por aquela fase da vida foi a das primeiras décadas do século XX. Havia ainda, fortemente enraizada na mente de todas as pessoas, a conscientização dos conceitos e das tradições familiares. O papel da mulher era fundamentalmente doméstico. A união familiar era a base da instituição. O que passei dentro de casa deveria, por força da moral e dos costumes, constituir segredo só e exclusivamente meu. Era, em tudo, diferente dos dias de hoje. Revelar o fato, sem uma prova convincente seria submeter-me ainda a mais humilhações diante das pessoas mais velhas. As famílias eram ou se mostravam comportadas em relação a valores e princípios éticos. Não digo que não havia os desvios, as traições e os escândalos.

Mas pouquíssimos eram os casos que vinham à tona pelas razões já citadas. Então, sofrer calada e manter esse terrível segredo pelo resto da minha vida era tudo que me restava. Só revelei-o a minha prima levada pela angústia que estava me sufocando e confiante e sabedora que, em sendo mulher e muito amiga jamais desvendaria o fato a quem quer que fosse. Por tão bem conhecê-la e nela confiar sabia que não teria que me preocupar.

Não custou muito para que surgisse uma resposta a uma das tantas cartas que enviamos a empresas da região. Por ter bons conhecimentos de inglês ofereceram-me uma vaga de recepcionista em um hotel no centro de Cabo Frio. Aceitei imediatamente e em menos de uma semana já estava empregada. Continuei ainda em casa de minha prima por mais algumas semanas até que consegui a tão almejada casa na praia rasa. Continuei, todavia visitando-a com grande frequência. Minhas folgas, passava-as inteiras em sua companhia e na de Pedro. Seu interesse por mim aumentou consideravelmente e ele já não escondia isto em nossas conversas. Por maior que fosse a minha determinação em não iniciar um relacionamento acabei não resistindo às conversas e promessas de Pedro que me pareceram sinceras. Não porque eu o amasse, mas por ser grande a minha carência e solidão. Minha vida andava realmente corrida e estressante como eu já previra que se tornaria.

Quase ninguém conhecia e meus relacionamentos do dia a dia eram estritamente profissionais. Na escola que em que acabara de ingressar não me sentia ainda enturmada para que algum relacionamento acontecesse. Logo, vi em Pedro uma companhia extremamente agradável, além de que era educado e carinhoso com uma mulher.

Foram essas as razões que me levaram ser sua namorada. Porém, mal sabia eu a que decepção esse namoro me levaria.

Uma mulher, depois de já ter experimentado as delícias e os prazeres de uma relação sexual nunca mais será a mesma. Não conseguirá simplesmente namorar um homem e se ele ultrapassar um pouco mais o limite das carícias de um simples namorado ela acabará não resistindo. Mesmo não tendo sido o sexo com o meu padrasto normal e aceitável não deixou de me proporcionar prazer, prazer esse que visitava com frequência as minhas lembranças. Então procurava manter com Pedro uma união de namorados, mas ao mesmo tempo extremamente cuidadosa. Ele adorava os meus beijos e se enlouquecia com eles, mas eu sempre o frustrava em suas tentativas de avançar até além de certo limite; isto pelas razões já citadas. Eram raras as vezes em que nos víamos sós. Saíamos sempre na companhia de minha prima.

Conversávamos em sua casa como sempre, íamos a cinemas, praças e quase nunca dava a ele a real oportunidade de estarmos apenas os dois para uma boa sessão de beijos e carícias, o que passou a deixá-lo mal humorado e mesmo irritado com o passar do tempo de nosso namoro.

É claro que eu me culpava muito com esse meu jeito de ser para com Pedro, mas havia, por trás do meu comportamento uma mentira que eu pretendia manter até o dia do nosso casamento, pois era esse o seu desejo para comigo. Queria que continuasse pensando e acreditando na minha virgindade.

Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 05/12/2013
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