MAIS UMA HISTÓRIA DE MÃE

Acordou atordoada. As lembranças se confundiam. Sentia dor. Muita dor. Mal conseguia mover os membros. “A forte chuva”; “O vento”; “A água do rio que não parava de subir”; “O estrondo repentino e...”. “Meu Deus, mal consigo respirar”. De Súbito uma lembrança especial: “Meu Filho”. Tentou procurar com uma das mãos numa busca instintiva, mas só encontrou lama e escombros. Com toda a força que lhe restava gritou: “Douglas!”. Nada. A não ser o ruído dos insetos. Tentou de novo: “Douglas!”; Nada. “Meu Deus, deve ser madrugada” Pensou. Sentiu quando lágrimas quentes molharam seu rosto. “Meu Deus, a casa desabou” concluiu. Tentou mais uma vez mover o corpo, não conseguiu. Alguns corpos estranhos, com “coisas” que pareciam patas, passeavam sobre seu corpo aumentando o desespero. Foi quando ouviu... Uma voz fraquinha... Não entendeu... De novo... Até que ouviu: “Mamãe”... Fez um esforço hercúleo para mover o rosto... Sim, era uma voz familiar: “Mamãe”. Buscou uma calma em meio ao desespero para tentar identificar a direção. “Meu Deus é o Douglas, meu filho”... Estava próximo... “Meu filho, mamãe está aqui” Respondeu. “Mãe, ta doendo” ouviu. Confiante no instinto fez um movimento brusco, um pedaço de laje rolou alguns centímetros. O braço esquerdo estava livre. “Graças a Deus”. Passou a tatear, até que... Encontrou os cabelos... “Meu filho”... “Mamãe, me tira daqui, ta doendo”. E agora? O que fazer? O tempo parecia não passar. Gritou um socorro, mas era como estar numa caixa. Não! Não podia se desesperar. Seu filho precisava dela! Não podia desmaiar. Tinha que salvar o filho. “Meu Deus, ele só tem cinco anos”. Foi quando ouviu: “Mãe, “to” com fome”... Ela ouviu a frase como uma estocada de punhal. “Calma, mamãe vai dar um jeito, mas preciso que você fique quietinho”. Com a mão livre, procurou o rosto do menino. Tateou e encontrou a boca. Voltou o braço e, sem pensar, mordeu. Mordeu de novo. De novo, até que sentiu o sangue jorrar, foi até a boca do filho e ofereceu. Sentiu quando a boca faminta do menino passou a sugar o liquido. Assim ficou. Não se sabe por quantas horas, mas viu quando o sol nasceu. Já não agüentava mais quando... ouviu vozes... E sem esperar, gritou. Gritou. Gritou desesperadamente. Até que Bombeiros encontraram sob os escombros, a mãe e o filho.

Na ambulância que transportava os feridos, dois Bombeiros conversavam:

- Um milagre – Disse um dos Militares.

- Realmente, eles ficaram dois dias soterrados – Respondeu um outro.

- O menino só sobreviveu por que bebeu o sangue da mãe.

- Verdade, se não teria morrido por desidratação.

- E a mãe, como conseguiu?

- Sei lá, deve ter sido na ânsia de salvar o filho.

- É, coisas de mãe.