Pequenas histórias 003
Tinha esquecido as palavras em cima dos nervos da dúvida quando, apaziguando a raiva numa calma de sossego, girou a atenção para outro ponto. Não foi preciso mudar de posição o corpo, apenas uma leve torção do pescoço para ver o que lhe interessava. E o que o viu não o surpreendeu, apenas veio confirmar o que há tempos suspeitava. Não se abalou. Voltou para a posição normal, pediu mais uma cerveja, e calmamente tomou como se fosse veneno.
E lentamente, bem lentamente desviou a atenção, desceu até o limite do sentimento, e, se postou dentro do ciúme corrosivo queimando-se pela chama da traição. Quietou-se no silencio que, apesar do alvoroço do palco com a banda tocando alto, das pessoas dançando freneticamente na pista, sentiu o silencio envolvendo-o. De onde estava, sem se virar, via os gracejos, os beijos, as caricias, as risadas, como se tivessem fazendo piada sobre ele.
Sem se precipitar, aproximou-se da mesa onde eles estavam. Assustados não tiveram tempo de reagir. Cada um recebeu um tiro a queima roupa bem no peito, fulminando-os instantaneamente. E antes que pudessem entender o que estava acontecendo, virou a arma para a cabeça e disparou.
- Você tem sorte de estar vivo. Não sei como e nem porque a bala foi desviada, atingiu somente a região do olho causando cegueira. – dissera o médico, assim que acordou após ser operado.
Tem razão, tive sorte, estou vivo, vivo preso na escuridão do meu ciúme ignorante.
pastorelli