Quer namorar comigo?
De mãos dadas com meu mais recente namorado, vejo parado na outra calçada, meu melhor amigo e confidente, seus olhos estavam fixos em mim e seu semblante estava carregado, lia tristeza e desesperança em seu rosto. Fiquei preocupada, embora já suspeitasse os motivos que o levavam a lentamente se afastar de mim.
- Amor, vou conversar com o Luís e já volto.
Atravessei a rua e com um sorriso no rosto saudei meu amigo.
- Que saudade de você baixinho.
- Hum. Nem parece que você sentiu minha falta...
Abracei-o bem apertado e pude sentir seu cheiro de rapaz limpo, saudável e honesto, com um toque de limão. Ele sempre cheirava assim, o que me fazia lembrar coisas boas da infância.
Conheci Luís quando já tinha completado vinte anos, e ele, dezoito, nossa relação sempre fora um nível elevado de amizade sincera e honesta. Combinávamos perfeitamente em tudo. Ele é de estatura baixa, para um homem de vinte e cinco anos, magro, olhos profundos, que até pareciam poder ler a alma das pessoas, e ao contrário de mim, ele esperava a pessoa certa, não namorara ninguém desde que nos conhecemos e eu já tinha namorado muitos, na esperança de encontrar o cara certo, sempre em vão.
- Faz tempo que não te vejo, o que aconteceu com você?
-Nada. Arrumou um namorado novo já?
- É... Arrumei. Não me olhe com essa cara... Ele é legal.
- Como todos os outros?
-Chato! Vem, vamos conversar um pouco, estou sentindo muito a sua falta...
Saímos conversando e eu nem percebi que tinha deixado meu namorado do outro lado da rua conversando com seus amigos.
- Sabe, eu estava querendo falar sério com você já faz algum tempo.
- Então fala.
Já imaginava o que era, e sabia que seria um sermão. Puxei-o para um banco de praça e nos sentamos.
- Você tinha me dito que não namoraria mais qualquer um, e não faz nem uma semana que você largou o último...
-Calma aí baixinho, o Fernando não é qualquer um, você até conhece ele não é?
-Conheço sim, e muito bem, por isso estou falando. Olha, você devia dar um tempo, ficar sem namorado um pouco, prestar atenção nas pessoas que realmente gostam de você.
- Quem, por exemplo? Você?
Dei uma gargalhada e baguncei todo o cabelo liso e certinho dele.
Na mesma hora percebi que tinha ido longe de mais. Seus olhos se tornaram de um castanho escuro profundo e assustador, vi verdadeiro sofrimento e orgulho ferido neles. Sem mais uma palavra ele levantou e foi embora, tão rápido que fiquei sem reação, mais uma vez tinha-o magoado, a pessoa de quem eu mais gostava no mundo todo. Mas era preciso, não sei se aguentaria uma declaração de amor, meu domínio próprio estava me deixando aos poucos.
-Aí está você gata, estava te procurando. Onde está o Luisinho?
-Foi embora... Vamos também.
Peguei mais uma vez na mão do Fernando pensando em como estaria o Luís, precisava falar com ele, ver como estava. Disse a mim mesma que amanhã bem cedo iria a sua casa. Fiquei mais tranquila e resolvi sair àquela noite, aproveitar que estava estreando uma peça nova no teatro e me distrair.
Fui ao teatro com o Fernando e assisti ao primeiro ato feliz e satisfeita, mas no intervalo um rapazinho veio me dizer que o Luís queria falar comigo lá fora. Levantei e saí bastante preocupada, - agora não escapo -, pensei comigo mesma. Cheguei ao saguão e lá estava ele, de costas pra mim, com as mãos nos bolsos do casaco de moletom, os cabelos ainda molhados e com cheiro de shampoo. Senti um aperto no coração, ele estava mais lindo do que nunca e muito mais chateado do que já estivera até hoje.
-Oi. Queria falar comigo?
- Quero sim, Marina... – Disse virando devagar e me encarando, estava pálido e abatido.
-Acho que não podemos mais ser amigos. Você não me escuta, sabe o que eu sinto por você e zomba de mim. Sabe quantas vezes eu tentei falar sério pra você o que eu sinto e você nem me deixou terminar? Sete vezes, contando com a de hoje.
Fiquei parada, sem palavras, me doía ver a dor no seu olhar, a tristeza nas suas palavras. Não podia perdê-lo, morreria sem tê-lo por perto. Num ato impensado e de impulso me aproximei e beijei-o lentamente nos lábios. Ele me tomou em seus braços e me beijou profundamente e apaixonadamente, nossos corpos se encaixavam perfeitamente, como se tivessem sido feitos um para o outro.
Sentia-me flutuando em uma emoção diferente, estava explodindo de paixão e alegria.
-Eu te amo. – Disse ele olhando em meus olhos e sem esperar resposta me abraçou forte, cheirando meus cabelos.
-Eu também te amo! – Disse eu timidamente.
- De verdade? Como homem e não como amigo?
- De verdade, como homem. Sempre te amei.
- Mas eu não entendo... E todos os namorados?
- Você é o homem mais especial que já conheci, correto, carinhoso, fiel. Não queria que você se transformasse em um canalha. Todos os homens com quem namoro transformam-se em canalhas.
- Eles não se transformam em canalhas, eles sempre foram canalhas, você que não sabe escolher. Eu nunca vou me transformar, pode ter certeza.
Seu olhar passava tanta paz e tanto amor, que me desarmou completamente. Decidi confiar em meu amigo, que nunca tinha me decepcionado, o homem que conquistara meu amor com suas atitudes e simplesmente por ser quem é.
-Quer namorar comigo?
-Claro que quero meu baixinho lindo!