ANDANÇAS - A HISTÓRIA DE MALENA (Vida e Superação de Vida) PRIMEIRA PARTE - CAPÍTULO 8
Na prática não foi difícil levar adiante essa mentira devido aos valores vigentes na época, em que, ser virgem fazia parte da moral feminina. Manter-se casta até o casamento, ser de um mesmo homem para toda a vida, viver para o lar, para a família e para o marido exclusivamente, estar à frente na educação dos filhos ainda era o papel da mulher na primeira metade do século. Até mesmo dignar-se a um casamento que satisfizesse totalmente os pais, condescendendo com a escolha deles por um candidato que achassem o mais adequado para se fazer esposo vigia ainda naquele tempo, pois valia muito mais o nome, a tradição ou condição social, fazendo se tornar a vontade da noiva um fator secundário para a felicidade do casal; o amor seria então uma consequência da união e viria com a convivência e adaptação, por parte da mulher, principalmente, a todas aquelas normas e imposições. E ela não tinha escolha a não ser aceitar e ser submissa.
Foi pensando em todos esses pormenores e levando em conta a admiração e o amor que ele dizia e demonstrava sentir por mim que decidi levar adiante essa farsa; em conluio comigo mesma, com meu próprio ego que vê em risco a sua reputação. À medida que os meses iam passando sentia aumentar minha admiração por Pedro, mas acho que não era ainda amor. Ele era o meu primeiro namorado e eu tinha tudo para me sentir apaixonada. Sentia-me extremamente culpada por não conseguir corresponder à altura a dedicação, o cuidado e até mesmo o amor de Pedro para comigo. Precisava de um tempo para mim mesma; por isso é que não queria, de imediato, me relacionar com ninguém.
Eu sentia que era ainda cedo. Via em Pedro alguém que conseguiria suprir minha tremenda carência afetiva. Mas ele foi tão cavalheiro e paciente que eu me sentia cada vez mais atraída a continuar ao seu lado. Passei a querer mais do que nunca que desse certo o nosso casamento e a preocupação começou a tomar conta de mim. Foi marcada a data do compromisso. Eu precisava encontrar uma maneira de lhe contar a verdade sem magoá-lo. Não fazia ideia de qual seria a sua reação. Em todo caso precisava pô-lo ciente do fato antes que nossa união se consumasse; do contrário ou se descobrisse por ele mesmo seria muito maior sua frustração e a minha vergonha.
Depois de muito pensar, encontrei uma forma de lhe levar a verdade de todo peculiar, o que envolveria também uma tomada de decisão por parte dele, mas que colocaria à prova sua verdadeira atração por mim; e quanto a isso eu não tinha dúvidas. Convidei-o para um almoço de domingo em minha casa na Ilha Rasa. Disse que seríamos eu, ele, minha prima e mais dois amigos em comum. Queríamos passar aquela tarde de domingo, que seria de sol, reunidos na praia. Então achei que minha casa seria o melhor local para nos reunirmos. Lá almoçaríamos e após um pequeno passeio a pé estaríamos na praia.
Pedro chegou de carro e eu fui recebê-lo no portão. Ao me saber só em casa sentiu-se meio sem jeito de entrar. Eu disse que não se preocupasse porque, mesmo esperando que os outros chegassem primeiro, não iria deixá-lo do lado de fora por causa disso e, embora fosse meu namorado não iria exceder-se ainda que estivéssemos os dois sozinhos dentro de casa. Ele aceitou esse meu argumento. Entrou. E, acentuando um pouco seu jeito tímido e reservado começamos a conversar.
O tempo transcorria e ninguém dava o ar da graça; continuávamos sós. É claro que, num determinado momento eu teria que lhe dizer o que realmente estava se passando. Pedi-lhe que fosse sincero comigo e que, depois de lhe contar algo sobre mim, mesmo se fosse sua intenção acabar o nosso relacionamento não o fizesse de imediato ou que pelo menos não me dissesse que o faria; que apenas fosse para casa e refletisse e somente no dia seguinte me comunicasse sua intenção. Pedi que, depois de lhe ter falado, independente da decisão tomada ele ainda almoçasse comigo, mesmo que o fizéssemos como dois amigos, já que foi para isso que tivera sido convidado.
Ele, a princípio, mostrou-se muito curioso com todo aquele preâmbulo que criei em torno do assunto que desejava abordar. Perguntei-lhe sobre a certeza que tinha do seu amor por mim; se era suficientemente forte ao ponto de algum fato que pudesse ter ocorrido no passado em minha vida não ser capaz de afetá-lo. Ele se mostrava mais surpreso a cada momento com o meu jeito de falar, mas assegurou-me que estava, de fato apaixonado por mim e que eu não duvidasse disso e que não importava o meu passado; o que queria era construir dali em diante uma vida nova para nós, que sua verdadeira intenção era tornar-me uma mulher imensamente feliz. Finalizou dizendo que, se fosse, o meu amor por ele, ao menos a metade do que o que ele tinha por mim eu poderia ficar sossegada que nossa felicidade estaria assegurada.
Depois dessas palavras passei a me sentir um pouco mais segura para lhe dizer toda a verdade. Ainda pervagava em meu íntimo uma ponta de medo de ver rechaçado o meu amor, portanto precisei, com muito cuidado, escolher cada palavra. À medida que eu falava ia estudando sua expressão fisionômica e suas reações físicas. Mencionei em linhas gerais as atitudes do meu padrasto para comigo dentro de casa. Minhas recusas as suas investidas e o receio de participar a mamãe o que eu estava passando por medo de não estragar a sua felicidade. Ele não me interrompia, senão vez ou outra com uma pergunta. Quis saber, por exemplo, até onde iam suas investidas.
Eu percebi aí sua principal preocupação: saber se chegamos a nos relacionar; em outras palavras, se eu ainda era virgem. Aproveitei esse momento para encerrar meu relato, contando-lhe toda a verdade. Não deixei de expor minhas justificativas, como minha grande necessidade de dinheiro para sair de casa e a forma como consegui arrancar dele a quantia de que precisava. Enfim, falei do nosso último encontro e da minha frustração por não ter funcionado o meu plano de continuar virgem e do meu grande medo de uma reação violente por parte dele