Morta Flor

Morta Flor

Diante do corpo inerte minha alma chorou sua falta, nem saberia como continuar a viver diante de sua ausência.

Seu calor teria que ser agora tomado pelo sol escaldante que secara as águas, as flores, minhas lagrimas; Iria aquecer meu couro, rachar meus lábios, quebrar meu orgulho de macho sertanejo, que não foge dos espinhos espalhados na caatinga, que pega cascavel com as mãos, que dorme com os escorpiões.

Agora toda minha coragem de nada serve. Queria pegar o meu trabuco e mirar diretamente no céu, acertar direto no coração de Deus e fazer da minha dor a sua dor, por certo o anjo Gabriel não me deixa.

A cantoria das mulheres só faz o tempo passar mais devagar, pessoas chegam a todo tempo e sou obrigado a responder as mesmas perguntas infinitamente.

Vou até o terreiro, onde tantas vezes passamos os dias cuidando dos nossos afazeres. As criações, a horta, os meninos... Embaixo da tamanqueira pendurado no arame farpado seu xale balança, ele me lembra seu corpo, parece que continua dançando, como na noite passada, enrolado em seu pescoço e escondendo a beleza do seu corpo que insistia em fugir pelo decote do seu vestido.

Que morena linda você foi, quando jovem encantava com o sorriso branco como o sal e os olhos negros de carvão, não tinha homem que não desejasse, mas fui eu o abençoado de sorte. Mesmo o tempo, não apagou seus encantos que ainda me faziam jovem toda vez que deitávamos em nossa cama. Doze filhos. Oxente, amor bom demais.

Agora à terra seca irá voltar, a bíblia sagrada diz, viemos do pó e ao pó voltaremos, quem escreveu isso deve ter morado por aqui, ô sertão seco da moléstia, acho que mesmo em vida somos feitos de pó, secos como a terra. Mas você minha amada era a água que inundava essa casa, era meu bem mais precioso.

Diante de seu corpo inerte, fico assim como tu, morto e seco, morrendo de sede aos poucos.

Não terei mais seus beijos pra me matar a sede do desejo, nem seu cheiro pra acalmar minhas angustias, não terei mais seus braços pra me levarem ao infinito.

Que diacho de vida que não se pode escolher quem vai e quem fica.

A última rosa da roseira “despeta-lô”, caiu no chão, peguei cada pétala, colocarei em suas mãos, vai embora com cheiro de flor...

Desculpe minha ira meu Deus.

Não peço mais pela vida da minha morena, apenas peço que não demore demais pra levar a minha.