Olhos de nuvem
Em meados de outono foi a primeira vez que vi Carolina. O vento frio chicoteava a alma, eu passeava despreocupadamente pela orla, estava distraído com o barulho das ondas. Todos os sábados, saia às seis da manhã, indiferente às intempéries não quebrava a rotina.
Dar uma volta pelo bairro era quase uma religião, um ritual de abstração. Na época atuava como fotógrafo. Os primeiros momentos do dia propicia a luz é ideal.
Vi ao longe uma figura diferente, parecia uma estátua, estava sentada de costas para o mar, com os pés fincados na areia, o rosto estava coberto por longos cabelos de fogo, aproveitei a câmera e tirei a primeira foto. À medida que avançava em sua direção eu a fotografava. Fiquei menos de um metro de distância, O vento atiçava os cabelos rubros, mas ela não mexia nenhum músculo. Fiquei hipnotizado, não sei por quanto tempo, de repente, ela virou a cabeça em minha direção. Como as espumas eram chupadas pela areia aquele olhar me tragou. Olhos de nuvem me surpreenderam. Então me desculpei.
"Não precisa, eu estava vendo o mar”. Ela com voz de sereia disse, “Se aproxime, eu não mordo". Soltou um sorriso de canto de boca. Foi um convite que não pude recusar, simplesmente obedeci.
Cheguei bem perto sentei ao seu lado, ela passou os dedos no meu rosto depois de uns segundos disse, "você é bonito, sua voz é sincera". Quebrado o gelo. A partir de então conversamos durante a manhã e nas outras manhãs de sábado que se seguiram.
Carolina, foi o meu amor sincero, não tinha vergonha de me expor, compartilhávamos muitas coisas. Mas com a chegada da primavera ela voltou para Londres, mantivemos o contanto por algum tempo, depois me mudei de Ipanema. Até hoje, guardo comigo todas as coisas vividas por nós. Aqueles olhos que enxergavam a alma continuam a viver comigo.
* Este pequeno é baseado numa história verídica, o personagem é um grande amigo.