Nocaute

A luta já estava em seu último round. O corpo começava a mostrar sinais de cansaço, as pernas não gingavam mais com tanta rapidez, os braços pesavam toneladas baixando sua guarda. Mas para ela a dor era um prazer, tudo que acontecera eram apenas preliminares para aquele momento, para aquela sensação. Superação, resistência, era ali em que ela se provava guerreira. Porque ela chegava onde ninguém mais conseguia. Acompanhava seu adversário e o enfrentava quantas vezes fossem necessárias sem nunca desistir e nem reclamar.

O suor escorria por sua pele quente, pelas curvas, a respiração ofegava em excitação. Olhos fitando olhos. Mergulho de corpo na alma alheia. A luta é uma jornada no oponente, lendo seus gestos e se antecipando a eles para surpreendê-lo. Uma conquista, um flerte. Dois lutadores, dois amantes que se enfrentavam para ter o seu momento solene, solitário, no pódio do prazer, da satisfação. Como no sexo, a mais íntima das relações, onde no final o gozo é solitário, porque de nada importa o outro durante o orgasmo. Ele é um momento único e singular e também exclusivo, uma forma do corpo boicotar o coito com uma descarga de prazer. Um suicídio da biologia, uma pequena amostra da morte, segundos eternos de paraíso.

E o sonho dela era vencer, mas não apenas isso, vencer da maneira mais gloriosa possível. Com um nocaute, o golpe que derruba gigantes tal qual Davi diante Golias. Aquele golpe certeiro que desfaz o nome e a fama, destrói lendas e cria novas lendas. No queixo, deslocando a mandíbula e mandando um sinal certeiro para o cérebro de que para amenizar o efeito do trauma é urgente cessar a atividade física. É o corpo boicotando a luta, a vontade, a alma.

Tanto no orgasmo como no nocaute é o nosso instinto de sobrevivência que nos trai e nos faz de uma maneira ou de outra desistir da nossa intenção, impedindo a nossa ação. Porém a vontade não governa no fim das contas a realidade, afinal não basta querer para se conseguir. E ela aprendeu a lição da maneira mais dura e doce possível. Porque de repente sentiu o gosto de sangue na boca e sorriu, porque lembrou-se da sensação de sêmen quente em sua boca.

E caiu beijando a lona, uma queda vertiginosa como um orgasmo onde se perde o sentido de equilíbrio e tudo gira ao seu redor, ondas de choque e impacto correndo por seu corpo, contraindo músculos e arrepiando a pele. Um devaneio inconsciente, um vislumbre do céu, um desligamento da terra. Deitada no ringue imaginava-se entre lençóis, extasiada e feliz. Nada mais importava, era o seu orgasmo e ninguém iria tirar isso dela. Nem mesmo os gritos do treinador ou a contagem do juíz.

José Rodolfo Klimek Depetris Machado
Enviado por José Rodolfo Klimek Depetris Machado em 22/07/2013
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