Amor

Sou mulher, no auge dos meus 40 anos, solteira. Não me sinto mais com moral alguma para questionar-me sobre relacionamentos abertos, ou o romantismo na atualidade. Resta-me questionar se o amor existe. Sim, sem dúvida existe, pelo menos quanto ao amor de pai e mãe. Mas e “aquele” amor? O amor entre duas pessoas, talvez três, movido pela atração, pelo desejo, pela angústia e pelo ódio, ódio este que por sua vez sempre andou junto com o amor.

Amei, confesso que amei. Os mais incrédulos me dizem que nunca amei, já que me apaixonava por tudo e por todos ao mesmo tempo. Porém, com a vaga ideia do que tenho sobre a diferença entre paixão e amor, posso dizer que amei, sim. Mas o amor acabou. O amor por todos os homens que amei foi sempre o mesmo. Começou fraco, como quem não queria nada, e num piscar de olhos tornou-se um tormento de anseios, uma torrente de desejos imorais. E em um novo piscar de olhos, desmoronou, caiu, acabou-se. E só por ter acabado, significa que nunca foi amor? É claro que não, eu amei, mas o amor acabou, e não assinei nenhum documento que anulava o amor devido seu fim.

Preferiria não amar mais. Mas não depende só de mim. Não suportaria todos os olhares piedosos sobre uma solteirona com seus 40, 50 anos. Não foi o que eu sonhei pra mim mesma. Quando pequena, me via abraçada a um belo homem, rodeada por crianças correndo para lá e para cá - os meus filhos -. Ser mãe sempre foi meu sonho, um sonho que com o passar do tempo se pareceu cada vez mais inalcançável. E o amor que sonhei ter se materializou, assim como eu mesma fui materializada pelos homens que me tiveram. E o amor tornou-se apenas um objeto para a minha escalada em busca de meus sonhos, ao passo que meus homens escalavam-se em mim em busca de suas meras satisfações passageiras, de suas práticas instintivas.

Hoje, desejo o amor mais do que qualquer outra coisa. Não sou mais uma menina, e não tenho mais aquele pensamento cativado por uma sociedade machista de que toda mulher deve constituir sua família. Não suporto os olhares, mas me parece que este é meu fim, me parece que estou fadada a uma vida solitária. O amor é tanto uma condição para a realização pessoal quanto o aprisionamento de subjetividades. E morrerei solitária se for preciso. Mas lutarei até a morte, mesmo sozinha, para que um dia alguém possa amar sem se preocupar com as convicções sociais, lutarei para que as subjetividades continuem não sendo aprisionadas e os ideais possam ser espremidos pra fora sem o menor pudor, lutarei por um amor em que haja tolerância pelo parceiro, ou pelos parceiros. Lutarei sozinha.