Enquanto esperava
A escrivaninha ficava diante da janela, de onde se podia contemplar toda a placidez da rua. Sentada ali, ela tinha sempre papel e caneta ao seu alcance, e passava as horas escrevendo versos e prosas enquanto esperava a chegada do seu amor. Ele não tinha dia nem hora para vir. Às vezes aparecia logo de manhã, junto com os primeiros raios de sol, trazendo pães quentinhos da padaria da esquina. Outras vezes chegava de noite, semblante cansado que não impedia o largo sorriso sempre presente nos lábios. Faziam amor debaixo do chuveiro, secavam os corpos molhados com o furor da paixão revirando os lençóis, depois iam pra cozinha e preparavam um belo jantar – ele tinha dotes culinários de dar inveja. E enquanto esperava que tudo aquilo se repetisse, despejava todo aquele sentimento em versos maravilhosos, em textos magníficos, imbuídos de tamanha inspiração que ela mesma custava a acreditar que brotavam de seus próprios dedos. E ao lê-los, no silêncio das madrugadas insones, na angústia das esperas que pareciam intermináveis, só tinha em sua mente a imagem daquele que personificava o amor mais profundo que ela podia conceber. E seus olhos encharcavam-se de lágrimas de completa felicidade.
No entanto, suas vindas começaram a ser menos frequentes. Quando aparecia, reclamava do cansaço absurdo, banhava-se e simplesmente caía na cama, entregue ao sono. Saía no outro dia tendo simplesmente trocado duas ou três palavras. Beijava-lhe a fronte e dizia que voltaria em breve. Mas esse breve foi se tornando cada vez mais distante. Às ligações, não atendia. Às mensagens, não respondia. E a espera diante da janela passou a ser sufocante, sentar-se à escrivaninha já não lhe permitia produzir seus textos outrora tão belos. As folhas de papel amassadas forravam o chão do aposento. E as lágrimas que brotavam dos olhos agora eram o reflexo da angústia que espremia a sua alma.
E foi assim que tudo terminou. Nunca mais ele apareceu. Nunca mais deu notícias. Todo aquele sentimento simplesmente esvaiu-se no ar. Papel e caneta foram parar no fundo da gaveta.
Perdeu-se o amor.
Foi-se a inspiração.
Restou a saudade dos dois.