Verônica - II
Eu a conheci não foi em um dia de sol. Não havia nada de diferente no ar quando acordei de manhã. Era apenas um dia comum, de céu nublado e pessoas apressadas a caminho do trabalho. Na primeira vez em que a vi, ela travava luta com um guarda-chuva preto que, pelo que pude perceber enquanto comprava cachorro-quente num desses carrinhos na rua, insistia em não fechar. Lembro como se tivesse acontecido há pouco: eu sorri achando engraçada a cara que ela fazia. No meio de tanta gente que ia e vinha apressada, com suas carrancas e almas cinzentas, ela era completamente diferente.
Depois de um tempo a me divertir com a pequena batalha travada pela graciosa estranha contra seu guarda-chuva, larguei o meu cachorro-quente e fui ajuda-la.
- Você precisa de jeito. – falei, me aproximando.
Ela levantou os olhos na minha direção.
- Posso? – estendi a mão para ela.
- Hum... Claro! – ela me entregou o guarda-chuva aberto, olhando-me parecendo estranhamente intrigada.
- Eis o truque – apoiei o cabo do guarda-chuva na coxa, fechei-o com bastante firmeza e segurei-o daquele jeito por algum tempo. Então, puxei-o mais um pouco para baixo e soltei. – Voilá!
- Só isso? – ela tinha as bochechas coradas.
- Só isso. – repeti, devolvendo o guarda-chuva para ela. Sorri. Ela tinha um ar muito jovial, muito inocente. E olhos azuis enormes. – Eu não acho que você vai precisar abri-lo hoje. – continuei.
Ela olhou para o céu rapidamente, antes de voltar a fixar os olhos em mim. Continuava a me olhar como se estivesse intrigada. – Acho que não. Mas este céu cinzento me deprime um pouco. Céu cinzento, pessoas cinzentas...
- Você não é uma dessas pessoas. – falei, sem pensar muito.
Ela ficou um minuto em silêncio, tempo em que suas bochechas pareceram corar mais ainda.
- Meu nome é Veronica. – disse, como se querendo se livrar do embaraço.
- Anita. – respondi, estendendo a mão.
Aquele foi o aperto de mão mais estranho que já dei na vida. Estranho bom. Ela tinha mãos pequenas, branquíssimas, e uma pele muito macia. Seguramos a mão uma da outra por um tempo ridículo para qualquer aperto de mão normal. E nos olhamos fixamente, com sorrisos embaraçados e bobos no rosto, como dois adolescentes que se apaixonam.
- Você... Tem algum compromisso agora? – Perguntei.
- Não...!
- O que acha de irmos tomar um café? – perguntei outra vez.
- Eu adoraria.
Nossas mãos ainda no ar. Uma unida à outra.
E após aquele dia, eu nunca mais soltei sua mão.