Codinome Beija-flor - cap. 15
Marcos e Isabel estavam sentados numa mesa do lado de fora da lanchonete. Marcos bebiscou um pouco do seu suco, prestando atenção ao que Isabel contava. Já estavam ali à quase meia hora, e Isabel já tinha contado quase sua vida toda, uma vida dura por sinal, mas Marcos já estava impaciente com aquela narrativa sem sentido. Ela se calou, e bebeu um gole. Ele queria terminar aquela conversa logo.
- Me desculpe a indelicadeza, mas não sei porque está me contando tudo isso. - disse Marcos, deixando claro que não estava gostando daquela conversa.
- Perdão, estou nervosa. Quando estou nervosa começo a falar sem parar. - ela ensaiou um sorriso amarelo - Na verdade quero te contar algo sobre o Murilo.
- É pra isso que estamos aqui né. - respondeu Marcos, sendo grosso.
- Sim, sim... É que não sei como contar...
- Seja direta, por favor.
Isabel abaixou os olhos e ficou mexendo o suco com o canudinho. Ela estava visivelmente incomodada, começou a falar devagar:
- O Murilo não é um jovem normal...
- Isso todos já sabem. - Marcos fez uma cara de indiferença
- Eu não me expressei direito. O Murilo sofre de um sério transtorno de personalidade.
- O que? Como assim? - Marcos levou um susto. Já tinha ouvido falar disso, mas só por alto. - Ele é um psicopata?
- Sim... A alguns anos atrás ele foi diagnosticado com transtorno de personalidade paranoide. - disse Isabel, com pesar - Ele não consegue lidar com a rejeição, e fica fora de si quando isso acontece. Marcos, você está correndo um sério risco agora.
- Isso é surreal! Ele devia está internado numa clínica.
- Ele já esteve internado numa clínica psiquiatra, mas os médicos acharam que ele estava apto para voltar a sociedade. E estava mesmo até você aparecer.
- Eu não poderia imaginar que ele fosse um doente. Um jovem tão bonito e educado, ser um psicopata, me parece meio impossível.
- As aparências enganam, Marcos. Os psicopatas são muitas vezes gentis, é consegue conquistar todos que eles querem. No caso do Murilo, ele tente a ficar agressivo quando não consegue o que quer.
- E o que ele quer sou eu... - Marcos sentiu um arrepio correndo pela espinha. - O que ele pode fazer comigo?
- Agora ele vai querer se vingar de você. Sabe lá o que ele possa fazer.
- Meu deus, não sei o que fazer. Isso é medonho e assustador.
- Primeiro, você tem que denuciar o Murilo para a polícia. E eu vou entrar em contrato com o psicólogo que tratou dele antes.
- Eu vou hoje mesmo até a delegacia.
- Faça isso mesmo. E tome cuidado, evite andar sozinho. O Murilo quando está surtado se torna imprevisível.
Depois de muita luta, Dora e Bianca conseguiram colocar o pai para dormir. Tereza trouxe um chá, na hora que as irmãs estavam saindo do quarto.
- Ele já dormiu? - perguntou a emprega - Eu fiz um chá calmante pra ele.
- Ótimo, eu tomo. - disse Bianca, já pegando a xícara. - Estou morrendo de sono.
- Eu quero comer, faz um lanche pra mim, Tereza?
- Claro.
Dora e Tereza desceram rumo a cozinha. Bianca se enfiou no seu quarto.
- O que você quer comer, minha querida?
- Um lanche leve, por favor. - respondeu Dora. - Tereza, estou com medo do futuro...
- Como assim?
- O médico disse que o Kaio terá sequelas, tenho medo que essas sequelas sejam muito grave.
- Deus queira que não seja... Deus queira.
- Mas, se forem? O que será da empresa? - Dora falou mais pra si do que pra Tereza. - Nós sabemos que o Kaio é o único que pode ficar no lugar do papai. E o papai já está ficando velho e cansado... E quem poderá ficar na presidência da empresa se o Kaio não se recuperar?
- Você, oras.
- Eu??? Oh não, eu não tenho talento pra os negócios...
- Você pode aprender.
- Ah não, Tereza... Acho não.
- Então o único que poderia ficar nesse lugar seria o Pablo... Isto é, se ele continuar na empresa, depois de ontem.
- Não entendi. O que aconteceu ontem que faria o Pablo sair da empresa?
- Xii, falei demais... Por favor não conta que foi eu que contei. O Pablo terminou tudo com a Bianca.
- Sério? - Dora não escondeu o sorisso.
- Sim, antes da notícia do acidente, os dois quebraram o maior pau aqui.
- Você sabe o motivo?
- Não me lembro dos detalhes, mas acho que ele tem outra. - Tereza ajeitou o lanche na bandeja - Seu lanche está ponto.
- Obrigado.
- Vou lá em cima, levar mais um pouco de chá para a Bia.
Dora ficou sozinha na cozinha. "Então o Pablo acabou tudo, agora posso conquista-lo sem peso na conciência", pensou ela, com um sorriso no rosto.
Pablo andava de um lado pro outro, as enfermeiras não sabiam, ou não queriam contar, o estado de saúde do Kaio. Jussara continuava sentada no canto da sala, sem se mover, só de vez enquanto se ouvia um suspiro de tristeza mais alto.
Marcos entrou na sala de espera, com dona Isabel junto dele. Pablo não esperava ver Marcos ali, por isso, levou um susto ao vê-lo. Isabel entrou e se sentou ao lado da filha e a abraçou.
- Fiquei sabendo do acidente... Precisava vim dar meu apoio.
Pablo não respondeu, apenas o abraçou. Pela primeira vez ele chorou desde do começo daquela tragédia.
- Sinto muito por essa tragédia.
- Estou péssimo... - disse Pablo, desfazendo o abraço, e se ajeitando. - Até agora não consigo acreditar no que aconteceu.
- Sei que é dificil...
- Estou com tanto medo do que possa acontecer. - Pablo se entregou as lágrimas novamente.
- Você está cansado, não quer ir pra casa, descansar um pouco?
- Não posso... Tenho que ficar aqui.
- Falando nisso, cadê a família do paciente?
- Eles foram pra casa. Estavam todos muito abalados.
- Você também está...
- Mas eu sou mais forte, Marcos.
Marcos sabia que Pablo quando queria era muito cabeça dura, ninguém o tiraria dali. Mas Marcos queria tirar ele dali, para conversar.
- Pablo, precisamos conversar. O Murilo voltou a me procurar, ele é mais perigoso do que pensamos. - Marcos soltou a revelação, pra fazer Pablo mudar de ideia.
- O que ele fez? Ele te machucou? - perguntou Pablo, nervoso.
- Calma, ele não conseguiu fazer nada, porque a mãe dele apareceu.
- Mãe???
- Sim, dona Isabel. - Marcos disse, indicando a senhora sentada ao lado da Jussara. Pablo ficou perplexo. - Essa é mãe do Murilo.
Isabel veio ao encontro dos dois.
- Então esse é o seu amado? - disse Isabel para Marcos.
- Do que estão falando? - questionou Jussara, sem entender nada. - Mãe, o Pablo é noivo da Bianca... E de onde você conhece o Marcos?
- Marcos é o motivo do surto do Murilo. E pelo que eu vejo, o Pablo também.
- Sério? Que mundo pequeno.
- Jussara, por favor, não conta nada disso para Bianca. - disse Pablo. - Eu quero contar tudo quando a poeira abaixar.
- Então, você e o Marcos tem algo... Uau, nunca pensei que você fosse gay.
- Eu não... Tá, eu sou. Eu também não aceitei isso de começo.
- o que importa é que eu e o Pablo nos amamos.
- Fica tranquilo, Pablo, de mim a Bia não saberá nada. Mas você vai ter que contar o quanto antes.
- Eu terminei tudo com ela ontem.
- Hum, então está tudo certo. Desejo que você sejam feliz. - Jussara sorriu.
Pablo abraçou a moça com afeto, nunca pensara que ela fosse tão gentil, ela sempre se postou como alguém esnobe.
- Se quiser sair um pouco, pra conversar com o Marcos, eu posso ficar aqui. - Jussara, agora estava mais calma e serena. - Qualquer coisa eu te ligo.
- Eu prometi para o Ramiro que ficaria aqui.
- O seu Ramiro e as meninas não irão aparecer aqui tão cedo. E se aparece estarei aqui, com minha mãe.
- Obrigado por tudo, Ju.
- Não estou fazendo por você, estou fazendo pelo Kaio. Ele adora você, eu só estou fazendo o que ele faria.
- Claro, o Kaio é um ser de grande coração. - Pablo sentiu uma angústia pelo amigo. - Então vamos, Marcos?
- Sim.
O casal chegou em casa. Pablo foi logo para o banheiro, enquanto Marcos foi para cozinha preparar algo para o almoço. Marcos resolveu não contar o que tinha descoberto do Murilo.
Pablo abriu o chuveiro e deixou a água gelada cair sobre seu corpo, mais uma vez as lágrimas brotaram. A dor e o medo de perder seu melhor amigo veio aos olhos. A lembraça do último encontro com o amigo lhe veio na mente, o sorriso simples, ele estava tão entusiamado com um novo encontro, mas alguém atrapalhou tudo. Quem queria acabar com Kaio?
Pablo não gostou do que pensou, mas sabia que era uma resposta plausível. Quem mais tinha a intensão de calar Kaio?
Pablo saiu do banheiro apavorado, se enrolou na toalha, e correu pra cozinha. Marcos estava em frente ao fogão, fazendo o almoço. Pablo o abraçou pelas costas, ele chorava muito e tremia. Marcos se virou, fez o Pablo se sentar na cadeira mais próxima.
- Calma, meu amor. Fica calmo, o que foi?
Pablo continuava a chora. Marcos pegou um copo de água com açúcar.
- Toma, isso vai te acalmar.
- Marcos, foi ela! - disse Pablo, entre soluço. - Foi ela...
- Ela quem? Do que você está falando?
- Foi minha mãe... Só pode ter sido ela... Era a única que tinha motivo.
- O que sua mãe fez, Pablo? Fala logo.
- Foi ela que mandou matar o Kaio!
- O quê??? - Marcos não acreditou no que ouviu, tentou se acalmar e tentou ajeitar seus pensamentos. - Está certo que a Pétala é uma cobra, mas mandar matar alguém? Você não está exagerando?
- Queria está. Marcos, no dia que sair de casa, minha mãe me disse que faria algo para calar o Kaio, pois ele descobriu sobre nós dois.
- Mas, pode não ter sido ela. Pablo, não podemos acusar ninguém sem prova.
- Eu sei... Eu vou agora atrás dela e irei preciona-la até ela confessar.
- Você não vai a lugar nenhum... Você vai comer e depois dormir um pouco.
- Mas eu preciso descobrir a verdade...
- Não vamos descobrir, mas agora você tem que descansar.
- Tudo bem... Mas, eu não irei deixar esse crime impune. Se foi minha mãe, eu não a perdoarei e irá pagar!
- Acho isso difícil, ela é uma senhora tão distinta. É uma cobra, mas daí ser uma assassina... Acho difícil.
- As aparências enganam...