FLERTE NA MELHOR IDADE

Idalina tomou o último gole de vinho, em meio as lágrimas adormeceu ouvindo Dalva de Oliveira... Ali mesmo, no sofá da sala.

Após a morte do marido, e lá se vão dez anos... As noites de Idalina assim passaram a ser. Só durmia com auxílio de medicamentos ou vinho. Logo ela, que nunca bebeu.

O casal perdeu o único filho de vinte anos em um acidente, desde então, o marido a magoou muito, com as inúmeras traições que ela perdoava por amor e receio de ficar só. Com o tempo, passaram a viver como irmãos, até que ele se foi.

Prestes a completar setenta anos, se afastou dos poucos amigos, tendo como companhia o gato feijão e sua vizinha Eulália que não entendia o sentido da palavra "solidão" sabia que a amiga queria ficar só, mas insistia em visitá-la todos os dias.

E na manhã de seu aniversário, chegou cedo, antes das 6hs a campainha não parava de tocar, com dificuldade Idalina se levantou, reclamando as dores nas costas, por culpa do velho sofá; e recebeu a amiga, bem emburrada.

- Bom dia Eulália, me acordando essa hora... Qual casa pegou fogo?

- Ainda não pegou, mas vai pegar... Parabeeeeénsss!!!

- Ah... Obrigado.

- Vim passar o dia com você, vou preparar tudo.

- Que "tudo" é esse? Não comemoro aniversário, só quero ficar quietinha.

- De jeito nenhum, trouxe um presente... Vou tingir, escovar seus cabelos e ajudar na escolha da roupa; vamos sair mais tarde!

- Ahm... Onde vamos? Quer dizer, onde é mesmo que NÃO vamos?

- VAMOS ao baile... Aquele baile da terceira idade que frequento a anos; vai gostar!

- Nunca... Sem chances.

- Precisa sair um pouco, prometo que não vamos demorar, vinte minutinhos, só pra não passar a data em branco... É isso, ou chamo os vizinhos, trago uma torta, e faço festa surpresa como no ano passado!

- Não, não... Vinte minutos?

- Vinte minutos, prometo!rs

Eulália, bem que tentou, mas o máximo que conseguiu foi tingir os cabelos brancos da amiga... Idalina rejeitou a maquiagem, o saltinho e escolheu o vestido discreto que usaria. Devidamente arrumadas, foram para o baile.

Parecia animado, foram para a mesa previamente reservada, e logo os muitos amigos de Eulália, se revezavam nas boas-vindas a visitante, que estava um tanto constrangida, mas fora tão bem recebida que foi se soltando aos poucos... Fascinada com o brilho da juventude que se mantinha aceso nos olhos de cada um. No momento oportuno, comentou com Eulália:

- Todos me parecem tão jovens, bonitos, me sinto a avó deles... Será que ninguém tem artrite?

- rss... Disse pra por brilho e um saltinho, não escondemos a idade, mas não perdemos a vaidade e vontade de viver!-vamos dançar?

- Se dançar como eles fico dois dias na cama.

- Deixa de lado esse baixo astral!rs

- Quero deixar, mas os meus pés inchados me fazem cair na realidade.

- Para com isso, acho que uma de nós será convidada pra dançar...

- Hum?

Logo, um Senhor alto,moreno e forte, com aproximadamente oitenta anos, bem cuidado e muito charmoso, convidou Idalina para uma dança; ela tentou se esquivar,mas a elegância do cavalheiro não permitia rejeição.

Com mãos firmes conduzia a dama lentamente, dançavam "How Deep Is Your Love" e trocavam palavras ao pé do ouvido.

Ela se desculpava pelo mal jeito, fora dançarina na juventude, mas a última dança foi no casamento. Ele ouvia gentilmente, e se punha à disposição para ajudá-la a retomar a prática.

Idalina, transbordava timidez ao mesmo tempo que se sentia envaidecida em ouvir os galanteios.

Aquela dança, despertou uma nova mulher, e o brilho voltou a face... Sentia-se VIVA!

Após a segunda dança, Claudionor se foi; bem cedo, por problemas pessoais. Trocaram os números de telefone, deu-lhe um beijo nas mãos e combinou de vê-la no próximo baile.

Vendo as amigas rodopiar no salão, Idalina ficou sentada na mesa, refletindo... Esqueceu as dores, as amarguras e suspirava como uma adolescente; sorria e sentia vontade de dançar, mais e mais.

Quando Eulália retornou a mesa, logo perguntou:

- Gostou do Claudionor?rs

- Porque pensa assim?rss

- Estamos aqui por horas, e me parece satisfeita... Não pediu para ir embora,dançou duas músicas, sem resmungar os pés doloridos e ainda voltou sorrindo; o que quer que eu pense?rs

- Nem lembrava mais da dor nos pés... Acho que passou!rs

- Santo Claudionor!rss

- Ele é charmoso, galanteador... Ah... Incrível!rs

- Galanteador mesmo, ou melhor MULHERENGO!rs

- Me parece muito respeitador, nem tem idade pra isso!

- Acha que safado não envelhece? Ele namorou minha amiga, ela me disse.

- E o que dançou com você, me parece interessado.

- Nunca gostei de homem mole!

- rss...

- Gosto do Walter, conhecido aqui como "poeta" ele sabe agradar uma mulher... Diz cada coisa, mas não serve.

- Por quê?

- Mulherengo!!!

- Que baixo astral hem!rs

- Agora eu é que tenho baixo astral?rs

- Gostei muito daqui.

- Que bom, espero que volte um dia, te fará bem.

- Virei no próximo!

- Hum?rs -SANTO CLAUDIONOR!!!rssrss

Em seguida, os amigos se aproximaram e iniciaram um papo divertido que se estendeu por longas horas.

Quando retornou ao lar, Idalina sentia, um novo sabor de felicidade; após o banho, considerava a hipótese de comprar roupas novas para o próximo baile, e retomar as visitas ao salão de beleza. Pela primeira vez, em muitos anos, dispensou os remédios e sonhou acordada... Adormeceu sorrindo.

Christinny Olivier
Enviado por Christinny Olivier em 23/06/2013
Código do texto: T4355049
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