A PORTA por Danka Maia
Hera nunca creu que aquele apartamento pudesse ser tão grande depois de voltar ali passados quinze anos. Todavia, era o único local que tinha plena certeza que ele não a encontraria.
Os dias passaram a dor da ausência não. Essa jamais passa, é um verbo que só fica no presente, não conhece o relógio, não sabe o que é passado. O dia doze chegou, e ao sentar no sofá esquecido de seus pais viu ao lado a pequena Bíblia que dera a sua mãe anos atrás. De pronto procurou por 1 Coríntios 13:"Tudo sofre,tudo crê,tudo espera,tudo suporta.O amor nunca falha" -Hera sorriu,e naquele riso havia a dúvida,afinal com ela não tinha sido assim.
Foi na manhã do dia doze que o destino marcou encontro com ela. A campainha tocou e nem foi necessário chegar lá, aquele cheiro amadeirado seria reconhecido por Hera em qualquer lugar do planeta ou fora dele.
Os passos descontinuaram. Foram ficando lentos, e mais lentos. E quando se abancou da porta e reclinou de lado sua face, seu coração disparou e soube que Rick estava ali.
Do outro lado daquela mesma porta, jazia um homem, um boque de rosas vermelhas e um coração em pedaços. A discussão tinha sido árdua demais e o ponto final fora dado por Hera com um pedido de não me procure mais que Ricky tentou abafar dizendo:
_Do amor não se foge, até se esconde, mas por um tempo.
Tempo que a jovem não soube ou quis esperar.
Ela dedilhava todo contorno da porta apertando os olhos e engolindo seco como se tocasse o corpo dele, e cerrou tanto os olhos que ao colocar a testa contra a porta, uma lágrima desceu vagarosamente e parou sobre seu lábio superior e ao limpar parte daquela gota misturou a sua saliva e Hera sentiu que a dor tem gosto, é amargo, salgado e ao entrar pela boca jamais sairá de seu corpo porque toma conta de tudo principalmente do coração, o músculo da vida ,o dono da alma. E foi nesse instante que notou esvaecer o perfume e a presença de Ricky que sem pensar correu apanhou as chaves em cima do balcão da cozinha abriu a porta , no entanto, tudo que pôde contemplar foi ali aos seus pés as rosas rubras, o bilhete que explicava a partida para voo dali a meia hora e o barulho das portas do elevador já fechadas.
Ela fitou a porta, as rosas, o bilhete e sem titubear desatinou descendo pelas escadas, aqueles degraus eram infindos e a sua alma sedenta. E viu como tudo se torna tão pequeno diante daquilo que realmente importa: Amar!
Todavia, caiu. E ao chegar a portaria viu que o elevador estava vazio.Decidida, de pijamas e chinelos pediu trocados ao porteiro e percorreu toda a Avenida em busca de um taxi.Dado o endereço do Aeroporto, e lá estando. Cruzou toda a extensão do recinto majestoso em pisas duras e obstinadas. As pessoas a olhavam ponderando ser uma insana.
E sim, não era, mas encontrava-se só que de amor.Porque as vezes,a única loucura mais sóbria na vida e que te faz bem é amar e nada mais.
Ofegante, desfechou a atendente:
_O Voo 347 para o Canadá?
A moça sorriu compreendo a urgência da solicitação e foi precisa:
_ Portão 12, saída em cinco minutos,senhorita.
E como ela, os demais na fila que começaram a gritar:
_Isso!
_Vai, você consegue!
A asma a impedia de manter o ritmo da corrida chegara à exaustão. Inda em passos acelerados, conseguiu chegar, porém o avião já taxiava pela pista pronto para decolagem.
Hera levou as mãos sobre a cabeça tomada e domada pelo desespero.
O tempo não tinha esperado. Que saibam o tempo jamais espera, a hora de ser feliz é sempre a mesma para todos os mortais: Agora!
Depois de breves consolos, à volta para casa foi estar no velório da própria alma. Um sepulcro caiado e vazio como rememorou estar também naquela Bíblia.
Ela não deu ouvidos a ninguém,nem ao taxita que por dó não lhe cobrou a corrida, ao porteiro que indagara como foi,e ao entrar naquele mesmo elevador pensou:
_Meu Deus, o que fiz?
Quando as portas se apartaram, Hera não existia. Sua última seiva foi tentar apanhar as rosas e abrir a tal porta que de muralha no lugar do que foi projetado: Uma mera passagem. Passagem pela razão, pelo orgulho, porque é melhor estar em paz do que certo.
Mas foi ao acender a luz que o sol brilhou. Naquele mesmo sofá Ricky jazia afoito pela sua entrada e quando a viu o riso dele tornou-se vida para ela que abandonando rosas, chaves e tudo simplesmente correu e o abraçou tão forte como quem descobrira o melhor pretexto para existir: Renúncia!
Após longos minutos se perdoando, se encontrando e se perdendo um nos olhos do outro as duas perguntas da moça foram:
_Como foi que me encontrou?
Ricky apanhou a pequena Bíblia a entregou replicando:
_Usei Jeremias 29:13.- e sorriu.
Ligeira Hera abriu na citação que mencionava:
"E me procurareis, e me achareis quando me procurares de todo vosso coração."
Então veio a segunda questão limpando os olhos marejados:
_E por que não foi?
Ele tocou a face com extrema delicadeza e segredou:
_Porque do amor não se foge, até se esconde, mas por um tempo.
E a beijou.