Capítulo XCVII
( continuação do capítulo anterior )
- Senhor Adalberto, agora temos que ser práticos para que esse pesadelo não se eternize. Sei que um pai nunca espera que um filho vá antes dele, mas aconteceu e temos que ser fortes para amparar a dona Augusta. Não gostaria que meus filhos participassem do funeral da mãe, por isso lhe peço que removamos os corpos para a Fazenda das Pedras.
- Mas e a minha sogra? Ela não terá forças para ver a neta num caixão...
- As pessoas mais velhas já viram de tudo, senhor Adalberto, estão vacinadas!
- O senhor Silveira tem razão, temos que preservar nossos netos...
Os dois corpos, de Ana Luiza e sua filhinha foram transportados em um coche funerário, até à Fazenda das Pedras.
Na sala, ornamentada com fitas pretas e douradas, em cima da mesa, foram colocados os caixões, todos ornados com flores do campo e rosas brancas.
Os amigos, parentes e vizinhos, foram se despedir de Ana Luiza e da sua infeliz menininha.
- Minha filha, você está grávida, não vá olhar os corpos, dá azar!
- Será que ela estava com alguma doença infecciosa?
- Como estava bonita, uma formosura de mulher, que desperdício da natureza!
- Os filhos não vieram se despedir da mãe!
Assim os comentários se multiplicaram ferindo os ouvidos de Silveira, queria que terminassem logo com tudo aquilo, sabendo que o quadro era irreversível e sua vontade era acabar com aquele pesadelo.
Era a hora de enterrar seus mortos e virar a página, a vida é assim, seus filhos esperavam por ele, ainda tinham muito a viver.
Durante o enterro Silveira não derramou uma lágrima sequer, já havia esgotado seu estoque anteriormente, aquele ritual demorado era muito desgastante para os familiares.Ainda tinham que ouvir um padre cantando louvores em latim, fazendo loas à falecida, uma mulher que ele nunca vira antes...
Quando tudo terminou, mesmo tarde, ele voltou para casa, queria ficar só, pensar no que fazer do seu futuro, ele nunca imaginou que as coisas pudessem terminar daquele jeito.Agora tinha em mãos a responsabilidade redobrada, estava sozinho para criar os pequenos.
- Não sei o que vou fazer, pensou Silveira, terei que me subdividir para tomar conta da fazenda, da importadora e das crianças... Os pequemos terão minha prioridade, estarei sempre ao lado deles, o resto é secundário. Mas não poderei prescindir do apoio da Maria Rosa, as crianças confiam nela, como se fosse uma segunda mãe e ainda mais, há a promessa feita à Ana Luiza de que não separaria nossos filhos de Maria Rosa... Acabei ficando refém dos meus escravos, sem eles não administrarei a fazenda, nem a importadora e nem os meus próprios filhos, já não sei quem é o escravo, se sou eu, ou eles! Terei que confiar neles, embora sabendo que se algum deles fizer algo comprometedor, serei eu o responsável, por isso terei de confiar, mas mantendo um controle total sobre tudo...
No dia seguinte, quando se levantou, Silveira reuniu Ubirajara, Pulcena, Jurandir e Maria Rosa. Fez uma preleção agradecendo os cuidados que eles tiveram durante a doença e o falecimento de Ana Luiza e da neném, e enfatizou que as responsabilidades de todos, dali para a frente, seriam muito maiores. Que ele não poderia estar à frente da fazenda durante todo o tempo, e queria fazer algumas modificações.
Ubirajara passaria a ser o responsável pelo funcionamento do dia a dia, da parte operacional do que ele já fazia e suprindo também a falta do falecido Machadão. Jurandir, além do que já fazia anteriormente, ficaria encarregado da negociação com os terceirizados, contabilizando tudo o que recebesse.
Mostrou a eles que a fazenda já estava auto suficiente e que dali para a frente teria somente de aumentar seu lucro, mesmo sem a presença física deles. As vendas de animais só seriam realizadas quando ele, Silveira estivesse presente na fazenda, e quanto à Maria Rosa, ela ficaria exclusivamente para tomar conta dos meninos e ensiná-los a ler e escrever, mas que, para onde quer que ele fosse, ele levaria as crianças, e ela iria junto.
E finalmente, como a fazenda era um repositório de muitas lembranças para ele, que então ele resolveu viajar por uns três meses e ficaria com as crianças e Maria Rosa no Rio de Janeiro. E perguntou:
- Estamos entendidos?
Ubirajara e Jurandir agradeceram a confiança neles depositadas e disseram que ele poderia ir descansado, que tudo estaria em ordem quando ele retornasse.
Jurandir, meio sem jeito, lhe disse que iria esperar sua volta para providenciar seu casamento.
- Então marque a data, Jurandir, que estarei aqui!
( continua no próximo capítulo )