Tentação ( parte XC )
( continuação do capítulo anterior )
Maria estava entre Moacir e Márcio, a charrete corria na estrada até chegar ao sopé da Serra dos Órgãos, foi ali que pararam para um descanso, muito mais para o cavalo do que para eles. Estavam juntos a uma queda d'água que margeava a estrada e oferecia boa sombra e água fresca.
Moacir desatrelou o animal e levou-o até onde a água caía com intensidade e fez com que a água lavasse seu lombo com a força da queda. Depois amarrou-o ao lado de uma touceira de capim e só então foi sentar-se ao lado de Maria e Márcio.
Maria observava tudo o que se passava, com um interesse quase infantil, via o jeito de Moacir tratar o seu cavalo, e imaginava: se ele trata assim tão bem ao seu animal, como irá tratar a um filho?
Ela se perdia nessas elucubrações quando Márcio lhe estendeu a cesta com tangerinas e laranjas, ela pegou uma laranja já descascada e quando terminou de chupá-la, jogou o bagaço sobre Moacir, dizendo:
- Estou com ciúmes, você só dá atenção para o seu cavalo...
- Adoro mulher ciumenta!
Maria nunca havia saído de Magé, para ela tudo era novidade, a floresta que sombreava o caminho, o rendilhado de sol que se projetava entre as folhas deixando o chão em parte iluminado e outro em sombra, o colorido das folhas roxas do ipê ou o amarelo intenso em mescla em sépia, das folhas da acácia... Ela sorria para a natureza!
- Vamos para a estrada, daqui para frente temos muita subida, não podemos forçar o animal, temos que parar para ele recuperar suas forças, e depois na descida também, ele vai ter que segurar o nosso peso e o da charrete por muito tempo...
Seguiram viagem e só foram parar, já bem tarde, na pousada dos italianos.
Todos foram dormir num mesmo quarto, tiveram que se lavar num banheiro externo, o último a se banhar foi Moacir, e quando ele foi entrar no banheiro, a menina lhe perguntou:
- Onde está Gioconda, moço?
- Ela está no Rio, num lugar chamado Lapa, na rua Mata Cavalos, mas há muito tempo que não a vejo...
- Se o senhor encontrar com ela, diga para ela voltar...
- Vou procurar por ela e vou lhe dar o seu recado, pode confiar em mim.
- Todo mundo gosta muito dela aqui...
- Pode deixar, não se preocupe, vou passar o seu recado para ela.
Silveira ficou radiante com o resultado da votação, ele não esperava uma vitória tão folgada.
- Senhor Silveira, ora o senhor fala como se fosse um abolicionista, ora como se fosse um escravagista, o senhor me confunde...
- No fundo todos nós temos um pouco de humanistas, e queremos que os escravos alcancem suas conquistas, tenham melhorias, não é?
Mas também não queremos sair perdendo... O ideal é que todos saiam satisfeitos, os senhores, os escravos e o governo. Esse equilíbrio de resultados é o que desejamos.
Quando saí para pegar as procurações, tive oportunidade de ver, senhor Eugênio, em algumas senzalas não havia um mínimo de conforto, o que mais falta, no meu entender, é o respeito humano... Tem alguns senhores que tratam os seus escravos como se fossem porcos. Não veem neles alguém que mereça respeito.
- Há que se considerar, senhor Silveira, que os hábitos deles não são de homens e mulheres civilizados, a maioria deles vieram de tribos e não tinham bons costumes. Eu mesmo comprei penicos para que eles usassem, eles usaram ? Estão novinhos lá, eles preferem mijar no mato, parecem com os cães, que marcam seus territórios. e fica a fedentina no lugar que eles elegem.
- É ruim para eles e para nós, não é, senhor Eugênio? Agora existem as fossas higiênicas, as descargas d'água corrente, tudo isso eu implantei na minha casa e na senzala, não fica um pingo de cheiro, e temos água corrente para nos banharmos, e lavar nossos pratos na cozinha. Quando chegarmos faço questão de lhe mostrar.
- Deve ser mesmo muito bom, quero que me mostre...
Dona Augusta começou a ficar preocupada com as dores que Ana Luiza começou a sentir.
- Minha filha, são contrações?
- Não, minha mãe, parece-me mais o posicionamento do bebê... Pelas contas do doutor Darci ainda faltam uns vinte dias para ele chegar.
- Mas o bebê está se movimentando?
- Está, mamãe, ele me chuta, quer sentir? Põe a mão aqui... Aí não, mamãe, mais para cima... Está sentindo?
Estou, Ana, ele está chutando.
- Ele não para, não me dá sossego, mamãe! Essa menina é uma espoleta!
- Agora, minha filha, não se levante daí, fica somente deitada, vou lhe trazer a vovó para lhe fazer companhia, porque tenho que providenciar a comida, a Esmeralda não dá conta sozinha do recado.
- Vá, mãe, se quiser, deixe a vozinha pra lá...
( continua no próximo capítulo )
( continuação do capítulo anterior )
Maria estava entre Moacir e Márcio, a charrete corria na estrada até chegar ao sopé da Serra dos Órgãos, foi ali que pararam para um descanso, muito mais para o cavalo do que para eles. Estavam juntos a uma queda d'água que margeava a estrada e oferecia boa sombra e água fresca.
Moacir desatrelou o animal e levou-o até onde a água caía com intensidade e fez com que a água lavasse seu lombo com a força da queda. Depois amarrou-o ao lado de uma touceira de capim e só então foi sentar-se ao lado de Maria e Márcio.
Maria observava tudo o que se passava, com um interesse quase infantil, via o jeito de Moacir tratar o seu cavalo, e imaginava: se ele trata assim tão bem ao seu animal, como irá tratar a um filho?
Ela se perdia nessas elucubrações quando Márcio lhe estendeu a cesta com tangerinas e laranjas, ela pegou uma laranja já descascada e quando terminou de chupá-la, jogou o bagaço sobre Moacir, dizendo:
- Estou com ciúmes, você só dá atenção para o seu cavalo...
- Adoro mulher ciumenta!
Maria nunca havia saído de Magé, para ela tudo era novidade, a floresta que sombreava o caminho, o rendilhado de sol que se projetava entre as folhas deixando o chão em parte iluminado e outro em sombra, o colorido das folhas roxas do ipê ou o amarelo intenso em mescla em sépia, das folhas da acácia... Ela sorria para a natureza!
- Vamos para a estrada, daqui para frente temos muita subida, não podemos forçar o animal, temos que parar para ele recuperar suas forças, e depois na descida também, ele vai ter que segurar o nosso peso e o da charrete por muito tempo...
Seguiram viagem e só foram parar, já bem tarde, na pousada dos italianos.
Todos foram dormir num mesmo quarto, tiveram que se lavar num banheiro externo, o último a se banhar foi Moacir, e quando ele foi entrar no banheiro, a menina lhe perguntou:
- Onde está Gioconda, moço?
- Ela está no Rio, num lugar chamado Lapa, na rua Mata Cavalos, mas há muito tempo que não a vejo...
- Se o senhor encontrar com ela, diga para ela voltar...
- Vou procurar por ela e vou lhe dar o seu recado, pode confiar em mim.
- Todo mundo gosta muito dela aqui...
- Pode deixar, não se preocupe, vou passar o seu recado para ela.
Silveira ficou radiante com o resultado da votação, ele não esperava uma vitória tão folgada.
- Senhor Silveira, ora o senhor fala como se fosse um abolicionista, ora como se fosse um escravagista, o senhor me confunde...
- No fundo todos nós temos um pouco de humanistas, e queremos que os escravos alcancem suas conquistas, tenham melhorias, não é?
Mas também não queremos sair perdendo... O ideal é que todos saiam satisfeitos, os senhores, os escravos e o governo. Esse equilíbrio de resultados é o que desejamos.
Quando saí para pegar as procurações, tive oportunidade de ver, senhor Eugênio, em algumas senzalas não havia um mínimo de conforto, o que mais falta, no meu entender, é o respeito humano... Tem alguns senhores que tratam os seus escravos como se fossem porcos. Não veem neles alguém que mereça respeito.
- Há que se considerar, senhor Silveira, que os hábitos deles não são de homens e mulheres civilizados, a maioria deles vieram de tribos e não tinham bons costumes. Eu mesmo comprei penicos para que eles usassem, eles usaram ? Estão novinhos lá, eles preferem mijar no mato, parecem com os cães, que marcam seus territórios. e fica a fedentina no lugar que eles elegem.
- É ruim para eles e para nós, não é, senhor Eugênio? Agora existem as fossas higiênicas, as descargas d'água corrente, tudo isso eu implantei na minha casa e na senzala, não fica um pingo de cheiro, e temos água corrente para nos banharmos, e lavar nossos pratos na cozinha. Quando chegarmos faço questão de lhe mostrar.
- Deve ser mesmo muito bom, quero que me mostre...
Dona Augusta começou a ficar preocupada com as dores que Ana Luiza começou a sentir.
- Minha filha, são contrações?
- Não, minha mãe, parece-me mais o posicionamento do bebê... Pelas contas do doutor Darci ainda faltam uns vinte dias para ele chegar.
- Mas o bebê está se movimentando?
- Está, mamãe, ele me chuta, quer sentir? Põe a mão aqui... Aí não, mamãe, mais para cima... Está sentindo?
Estou, Ana, ele está chutando.
- Ele não para, não me dá sossego, mamãe! Essa menina é uma espoleta!
- Agora, minha filha, não se levante daí, fica somente deitada, vou lhe trazer a vovó para lhe fazer companhia, porque tenho que providenciar a comida, a Esmeralda não dá conta sozinha do recado.
- Vá, mãe, se quiser, deixe a vozinha pra lá...
( continua no próximo capítulo )