O Oceano e o Continente Capítulo 1

UM

Era uma tarde de outubro, férias escolares se aproximando e Arthur estava deitado na grama atrás de sua casa. Olhando o céu, como era de costume todo final de tarde. Nuvens mansas vagueando pelo espaço limpo e lindo. Essa visão era um paraíso para aquela mente cheia de pensamentos dispersivos e sem fim. O garoto de apenas 16 anos florescia na sua maneira de ver o mundo. Desde pequeno curioso! Inteligência a flor da pele e um cérebro de dar inveja até aos professores mais instruídos.

Depois de muito pensar caiu no sono ali mesmo na grama e teve um sonho inusitado. Uma mulher vestida de sol e com um pergaminho na mão direita e uma balança na esquerda aparecia para ele e falava certas coisas que nem o humilde autor deste texto saberia explicar. Mas continuemos com a narrativa. Após acordar ainda na grama foi para o seu quarto onde estava tocando uma música com o seguinte trecho: "Dentro do mambo e da consciência está o segredo do Universo".

O menino morava com seus pais e tinha um cachorro e um gato. Ironicamente o cão se chamava Tubarão e o gato era Astolfo. Engraçados nomes? Talvez... Mas ele não se importava.

Tinha uma natureza filosófica muito extensa e adorava psicologia. Mesmo muito novo carregava muita informação pelas quais os adolescentes da sua idade não se interessavam. Tinha alguns amigos na escola... Outros conhecera desde criança e assim por diante. Uma amiga muito íntima era Natália, que morava perto da sua casa e sempre lhe fazia companhia. Era sua amiga mais próxima e ambos se amavam. Também era colega de sala do segundo ano do ensino médio. Sempre ia para a escola acompanhado por Natália. Enquanto adolescentes aquela vida de apenas estudar era moleza até certo momento que narrarei mais tarde. Eram sete da manhã e ele aparecera na casa da garota para ir para a escola.

-Oi, dona Márcia! A Natália ainda está?

-Sim, Arthur. Está se arrumando. Se quiser esperar, pode entrar. Já tomou café?

-Obrigado, dona Márcia. Sim, já tomei. Muito obrigado.

-Por nada. Agora tenho que cuidar das coisas da casa, afinal vida de "empreguete" não é fácil! Hahahaha!

-Arthur regozijava-se com o bom humor da mãe de sua grande amiga, mas ela demorava tanto que começou a ficar impaciente.

-Vai ficar aí pra sempre, sua...? Resmungou o menino.

-Sua o quê?! Respondeu Natália de dentro do quarto.

-Nada não, mas saia logo, ou iremos nos atrasar! E hoje temos que apresentar um seminário de biologia!

-Tá, tá só um instante!

-Ok.

-Então, seu chato?! Satisfeito? Disse ela com cara de brava.

-Você demora um século para se aprontar e me olha desse jeito?! Vamos sair.

-Ok, tchau mãe!

-Tchau filha, tenha um bom dia na escola!

Os dois estavam a caminho da escola e Arthur ficou calado por um tempo enquanto caminhava com Natália. A garota já tinha namorado e ele era três anos mais velho que ela e Arthur. Arthur nutria um sentimento de amor, mas não apenas amor de amigo por Natália. No entanto a garota nem desconfiava disso. E Arthur ficou calado por muito tempo sofrendo interiormente por ela. Ele então tinha uma curiosidade perturbando a mente e queria perguntar dela o porquê de uma coisa.

Ela percebeu seu silêncio e perguntou:

-Por que está calado?

-Estava só pensando numas coisas aqui.

-Que coisas?

-Por que vocês gostam de caras mais velhos?

-É por que vocês, garotinhos, só pensam em curtir com nossa cara.

Que resposta ríspida e seca! Apesar de ter dado uma resposta tão direta, isso não satisfez a curiosidade do garoto.

-Entendi. Falou, mas não disse nada. -Pensou ele.

-Por que me perguntou isso?

-Nada demais.

-Sei...

-Chega dessa conversa. Temos que nos concentrar no seminário de hoje.

-Então vamos recapitular!

-Sim.

Os amigos resolveram treinar o que ambos iriam falar na aula que era no segundo tempo. Faltavam apenas 500 metros para chegarem à escola. Natália era muito desejada pelos caras da sala de aula. Ninguém tirava os olhos dela. Sua aparência era essa: cabelos castanhos, olhos castanhos claros, formosa, personalidade forte, inteligente, gostava de músicas internacionais e sertanejo.

Eles foram a sétima dupla a se apresentar e conseguiram isso com tranquilidade enquanto os outros alunos estavam tensos, inclusive André que era um amigo de Arthur. A professora tinha bastante orgulho de Arthur. Mas quem mais o admirava era o professor Alberto, cujo aluno nas aulas de filosofia sempre dizia alguma coisa que causasse impacto. Aquela foi mais uma aula normal e satisfatória. Natália tinha mais duas amigas íntimas na sala. Eram elas Andressa e Letícia. Andressa era calma e Letícia era mais tagarela e extrovertida. Ambas eram garotas lindas. Andressa tinha cabelos encaracolados e Letícia era loira. Mas nem por isso era burra.

Para a frustração de Arthur, ao terminar a aula daquela sexta o namorado de Natália foi buscá-la na escola e levá-la para sair. Ela se despediu de Arthur e foi para o cinema com o namorado. Ele se chamava Flávio. Cursava Administração à tarde. Foi de partir o coração de Arthur, ver sua amada em segredo dando beijos doces no rapaz. Então para não ver mais, chamou André e foram para a lanchonete que ficava a duas quadras dali.

Enquanto lanchavam, conversavam sobre a amiguinha de Arthur que estava toda apaixonada.

-Você gosta dela? Perguntou André.

-Cara, a gente se conhece desde criança! Mas faz tempo que gosto dela, só não tive coragem de contar. E nem vou.

-Entendo... Mas também não acho que você tenha chance.

-Eu queria entender por que que essas meninas só ficam com caras mais velhos. O que elas veem neles?

-O que elas veem neles? Simples: carro, grana e talvez até experiência. Dizem que as garotas amadurecem primeiro do que a gente. Eu não sei se isso é verdade mas parece que elas gostam dos caras mais velhos por eles serem mais maduros e nós, os mais jovens, só gostarmos de farrear.

-Deve ser isso mesmo. Mas isso tá me martirizando!

-Entenda: se ela souber que você não a vê só como amiga, a amizade de vocês estará acabada. Deixe passar o tempo. Se o outro cara lá vacilar, é porque ele não a ama e o caminho fica livre pra você. Mas vá com calma, ou poderá se arrepender depois.

-Também penso dessa maneira.

Terminaram de lanchar e foram para casa. Arthur ficou lendo a noite inteira. Era um livro de Machado de Assis, "Dom Casmurro". O caso de Dom Casmurro era quase semelhante ao dele, mas a diferença é que Capitu não namorava ninguém ao contrário de Natália.

Ao terminar a leitura foi dormir triste. Acordou cedo naquele sábado. Como Natália morava ao lado da sua casa, ficava triste em saber que sua amada estava tão perto e ao mesmo tempo tão longe. Resolveu não ir visitá-la, coisa que fazia sempre.

O dia de sábado foi calmo e tedioso. Em outros sábados normalmente os dois ficavam juntos fazendo algo interessante. No entanto naquele sábado nada aconteceu. Arthur foi para outro lugar: uma biblioteca; como foi mencionado no princípio, aquela mente era diferente e procurava o saber. Foi graças a essa frustração que ele conseguiu dar um grande passo, que foi conhecer as obras de um gênio que levava seu nome: Arthur Schopenhauer. O filósofo que tantos afirmavam ser pessimista, na verdade era realista. Ninguém compreendia bem os textos sublimes de Schopenhauer, mas o garoto conseguiu encontrar algo que poderia ajudá-lo muito. Tudo acontece no presente, passado e futuro são apenas sonhos vazios da imaginação submetidos ao princípio de causa e efeito. O que importa é viver o presente independente do seu passado ou do seu futuro. O que importa é descobrir o que você quer da sua vida e fazer de tudo para ir conforme seu plano de felicidade. É viver na simplicidade com a consciência de saber para onde você vai depois da sua morte compulsória. Isso realmente é muito para um garoto de 16 anos. Mas quem disse que a idade significa alguma coisa?

Ele ficou encantado com o que começara a esquadrinhar naquela manhã de sábado.O céu estava totalmente sem nuvens. Uma bela manhã, professores não haviam deixado dever de casa e ele poderia ficar o dia inteiro lá ou ir passear.

Enquanto o garoto se deliciava na silenciosa leitura do livro, a sua amiguinha achou estranho que ele não tenha ido visitá-la. Foi então à casa da mãe dele, a dona Amanda, para averiguar aquela coisa estranha.

-Bom dia, dona Amanda. O Arthur está aí?

-Não, ele saiu. Foi a biblioteca. Não visitou você?

-Não...

-Que estranho... A essa hora ele deve estar lá ainda. Dá uma olhada lá.

-Tá bom. Tchau.

-Tchau. Dona Amanda também achou estranho o ocorrido, afinal Arthur e Natália eram como feijão com arroz ou café com leite.

Natália resolveu dar uma olhada na biblioteca. Caminhou um pouco ao redor das prateleiras e finalmente o encontrou concentradíssimo na leitura do livro que cativou sua alma. O livro era: "O mundo como vontade e representação".

-Então é aqui que você está...-Disse Natália com um ar perplexo.

-Oi... Desculpa não ter ido te visitar. É que eu quis variar um pouco.

-Variar um pouco? É só isso? Cara, nós somos praticamente irmãos e você diz que é só pra variar um pouco?

-Desculpa, isso não voltará a se repetir.

-Acho bom mesmo. Agora me abraça.

Se abraçaram então. O garoto adorava aquela sensação de proteção ao abraçar a amiguinha dos olhos castanhos claros. Ele a amava em segredo, afinal de contas.

-Que livro é esse?

-O Mundo como Vontade e Representação- Schopenhauer.

-Hum... Interessante. Você adora essas coisas né? Tem que parar de ler tanto, menino! Ou vai ficar doido!

-Hahaha! Acho que já sou um maluco mesmo.

-Vamos pra outro lugar? Sei lá, esfriar a cabeça um pouco.

-Jogar videogame?

-Pode ser.

-Que jogo?

-Você escolhe, desde que não seja futebol.

-De luta então, Mortal Kombat. Pode ser?

-Pode.

-Fechou.

Passaram o dia inteiro jogando. Mais tarde Arthur ficou frustrado com a saída da Natália para ver o namorado. Mas Arthur já não se importava mais com isso, afinal para a tenra idade já era muito maduro. Mais maduro até mesmo do que o namorado da amiga. Cresceu dedicando-se às artes e a filosofia. Tinha muitos hobbies: desenhar, pintar, andar de bike pela pista perto da praça, nadar, ler, escrever e olhar o pôr-do-sol com Natália as vezes.

Passou-se então um ano e eles terminavam o ensino médio. Arthur era um aluno exemplar e passou com as melhores notas. Natália também era muito inteligente, mas não conhecia o que Arthur estava aprendendo apesar de ser muito próxima a ele desde criança. Nem mesmo a família conhecia o que se passava no seu interior e o que ele estava a aprender com tantos livros. Era muito dedicado e tranquilo. Começavam a faculdade. ele fez Engenharia Civil e ela começava enfermagem. Não era tão ruim para ambos estudarem em faculdades diferentes, afinal de contas moravam bem perto.

Arthur arranjou então um emprego na prefeitura, como auxiliar de administração. Apesar de não ter muito tempo vago para ler, ele sempre dava um jeito de aumentar seus conhecimentos. Fascinou-se com a filosofia oriental, dentre elas a mitologia hindu que considerava a mais sábia. Passou a seguir certos preceitos que considerava justos, como a meditação cotidiana e adquiriu com isso o autoconhecimento. Passou a ser intuitivo e feliz mesmo sem saber por quê. Isso originou uma série de descobertas e mais ânimo para viver.

Passaram-se então mais dois anos e ele viu que engenharia não era o que queria. Saiu desse curso e entrou então na filosofia. Queria saber mais sobre si e a essência do mundo. Nesse meio tempo Natália estava terminando o quarto período de enfermagem, e supostamente seu amor crescia por Flávio. Mas quem dera que fosse verdadeiro o amor que Flávio sentia por ela! O homem a traía com a melhor amiga dela, a Andressa. Natália nem desconfiava desse fato, mas com o tempo poderia ficar. Afinal de uns tempos para cá o namorado não tinha muito tempo para ela. O que estaria fazendo então? A resposta era certa: saindo com Andressa. Que amor de cinema! Certo dia Arthur estava passando pelo quarteirão perto da faculdade a noite e flagrou os dois de longe, mas não disse nada. Achou melhor ficar calado. Flávio percebeu a presença de Arthur e tentou se esconder puxando a garota para o carro.

-O que foi? Perguntou Andressa.

-Entra no carro!

Flávio ficou com medo de que Natália descobrisse por meio de Arthur. O humilde narrador não sabe ao certo por que Flávio traíra a sua namorada. Todavia, se o leitor se interessar em saber o que acontecerá, ficará explicado que o que Flávio sentia por Natália era mais uma possessividade. Ele não gostava muito de Arthur, por ser muito próximo de Natália, mas isso não o impedia de se divertir com a amiguinha dela enquanto ela pensava que ele estava no trabalho.

ícaro Clarêncio
Enviado por ícaro Clarêncio em 02/05/2013
Reeditado em 10/05/2013
Código do texto: T4270630
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