HOMOS E METROS
O que achou dos pais do Thales, mãe, foi Sofia perguntando ao dia seguinte, acordando cedo, embora não tão cedo que o irmão não já tivesse saído para trabalhar, a mãe já estava com café pronto, e preparando feijão, São gente bacana, muito simpáticos, observou a mulher fechando a tampa na panela de pressão, enquanto Sofia tomava café, sentada à mesa, assim nas pernas dobradas, ainda estava com o conjuntinho que dormira, mas tomaria um banho, se arrumaria para o curso no salão, aprendendo intensivamente, duas cabelereiras e mais um cabelereiro homossexual, já maduro, bem mais exigente, enjoado, pensava às vezes saturada, por que não é gay como os pais de Thales, hem, foi ainda de pensar, Seu irmão que ficou tão calado, comentou Catarina observando a despensa, ficou mesmo bolado, foi pensando a rir Sofia, mas chegando ao salão, penteado frisado, maquiada, jeans e blusa jeans discreta, aprendizado intenso na segunda com Hugo Pavarello, bicha oxigenada, enjoada, Oi minha lindinha, o salão é todo nosso, e sentando-se na cadeira de frente aos espelhos, hoje vou ser sua cobaia, quero ver como anda seu progresso, sabe que o babado vai ficar sinistro se estragar meu look, hem, agitou as mãozinhas moles no ar, vamos, princesa, fecha este queixo, ação, pois hoje você se torna uma cabelereira profissional ou eu não me chamo Hugo Pavarello. Pelo ao menos não estragou tanto o look dele, foi acreditando Sofia, reparando aquele muxoxo debochado do homenzinho no reflexo do espelho, as mãos dela ainda no ar segurando o pente e a tesoura, Você tem um brilho lindo de jabuticaba nestes olhos, deusa de ébano, e olha ver se corta o cabelo daquele seu namorado magrelo, hem, girou na cadeira, levantou-se apoteótico, a calça sem cós justinha, é tão anos setenta cabelo grande com franja enorme caindo aos olhos, suspirou num tom de enfado afetado, mexendo nos seus cosméticos, Ah, amanhã abriremos com alguma estreia sua, foi avisando a se admirar repartido nos espelhos, reparando os olhos negros espantados dela refletido também, sorriu com o queixo mais furadinho, enrugadinho, calma, minha deusa de ébano, você só vai cortar cabelos de bofes assim, assim, foi explicando num gesto de abandono com as mãos, uma careta e muxoxo ainda mais risonho, Talvez fosse ganhar um emprego ali, pensou quando chegou às nove horas, não se importando que Dalila, a gordinha, mas pretinha como ela, colocou-a para limpar, passar pano no chão, mesmo estava ali para aprender, a manicure havia chegado cedo, Tenho duas horas marcadas para de manhã cedo, homem, avisou a Dalila, a manicure, mulher madura, roupinha colante, cabelo acaju, preparando-se em sua cadeirinha e mesinha, seus esmaltes, lixas novas, alicates esterilizados tirados da estufa, as luvinhas cirúrgicas na mão, Ai, filhinha, exclamou num riso para Sofia que passava com o rodo e o esfregão ali, cuidado com meu pé neste vassourão ai, quero-me casar de novo, preciso minha querida, ainda era num tom afetado de humor, Dalila ligando o rádio, previsão astrológica, James entrava no salão, calça jeans com o cós baixo aparecendo o elástico e marca da cueca, blusa preta cheia de caveirinhas de cor metálica, Bom dia, cheguei primeiro, tenho que trabalhar daqui à uma hora, foi anunciando, e Sofia arregalou os olhos, tornou-se um pouco lívida na pele de ébano, ficando confusa com aquele esfregão assim na mão, mas James encaminhava-se para a manicure, sentando-se a frente dela, nem reparara em Sofia, ou ela se ocultara um pouco encabulada, Não sei ficar com as unhas descuidadas, foi dizendo James a sorrir, entregando uma mão à manicure, É por isso que a Darla morre de amores por este menino, disse Dalila a conferir sua maquiagem no jogo de espelhos do salão, tons azulados nas pestanas longas, Quero um esmalte mais begezinho hoje, disse mesmo James cruzando as pernas, Que tatuagem irada, comentou a manicure reparando-lhe os punhos, Dalila saiu empurrando Sofia como se ela fosse uma trouxa no meio do caminho assim a outra a chamou para conferir, deram gritinhos histéricos, risadinhas, Roqueiro como o filho da Verônica, ainda comentou Dalila, Vocês perderam no sábado o anime, eu também perdi né, pois tava trabalhando, foi falando James, deixou escapar um gritinho pela ponta do alicate trabalhando em sua cutícula, mas o Enzo teve lá na loja, acreditam que ele estava de kilt, mas as duas não entenderam, É uma saia, comentou disfarçando um riso, e as duas gargalharam, Se você tem ele no Facebook, Dalila, você vai ver, ainda acrescentou James descruzando as pernas, os joelhos ficando juntos, Sossega menino, repreendeu a manicure num muxoxo bem humorado, podia se machucar no alicate assim se mexendo demais, hem, e ainda parada no mesmo lugar, segurando a vassoura esfregão, Sofia reparava a cueca aparecendo assim pelo cós da calça de James, ele assim de costas, todo inclinado para a manicure, entregava a outra mão, Ah, coloca um som maneiro, ai Dalila, pediu virando-se então reparou Sofia, que começou a arrumar a mesa junto aos espelhos, meio desconsertada ainda naquele jalecão branco cheio de bolsos, Sofia, você trabalha aqui, manifestou-se, Conhece, perguntou Dalila, pois a manicure se concentrava nas mãos do rapaz, Claro, ela foi namorada do Enzo, disse ainda James, e Dalila a olhou de cima abaixo como não crendo, Mas não sou mais, disse rindo, pois as duas já tinham visto Thales por ali, o cabelo dele, dito “bagunçado” por elas e por Hugo era comentário e digno de nunca confundi-lo, Vou buscar um cafezinho, acudiu como que precisando sair um pouco de cena, atravessou as cortinas de bolinhas que tilintavam, na exígua e aquecida cozinha, esfregou as mãos no rosto, seu coração batia forte, emocionada com que, porra, pensava aflitiva, conflituosa, os seios oscilando mártires, um branquelo veado, todo fresco, usa óculos, já o conhecia de “velhos carnavais” o suficiente para apagar este alvoroço esdruxulo, foi se admoestando, enquanto serviu os copinhos descartáveis numa bandeja, tentou aparecer mais empertigada, mas soprando as mãos tratadas e esmaltadas, mesmo a manicure fizera um detalhe alvo nas pontinhas bem arranjada, Bárbaro, exclamou James, Vê se não vai me roer estas unhas hem, rapaz, falou a mulher num tom afetado de preocupação, Não posso agora, Sofia, tão secando minhas unhas, foi mesmo as soprando, admirando-as, assim pelas lentes dos óculos com aros delgados, mas escuros, mesmo exibiu-as a ela, Veja, não tá um charme, Sim, disse Sofia num suspiro tenso, colocando a bandeja sobre uma mesinha, sentia as faces queimando, o coração acelerado, todo aquele perfume vinha de James, perguntava-se, sim, respondia seu coração acelerado, o fogo estranho ardendo-a novamente, e percebendo as unhas prontas, puxou a carteira presa a correntinha, pagou à manicure, deixando uma gorjeta, agradecendo, elas devolveram o agradecimento, Eu acompanho ele até a porta, ofereceu-se Sofia como que se querendo mostrar solicita, mesmo abriu esta, James a sorriu, suspendeu o headphone que tinha dependurado no pescoço, Vou trabalhar agora, gatinha, disse para ela assim piscando-lhe atrás da lente, os olhos eram claros, de um castanho mel, depois eu venho ai, tratar meu cabelo com você, disse ainda, embora seu cabelo fosse curto, enroladinho, embora claro, espetadinho no momento assim com gel, Não sou ainda profissional, avisou num sorriso encabulado, emocionado quando ele disse, Aprendendo com o Hugo, duvido que você não já seja, gatinha, duvido, foi saindo assim cosendo pela calçada, o andar um pouco firme, mas não tão empertigado quanto Enzo, as chamas tatuadas na parte inferior dos braços pareciam quase chegar aos cotovelos, e eu que ardo, pensou voltando-se, mas aquele gatinha, pensou algum tempo depois, lavando os cabelos de uma senhora, tinha ele mesmo dito, ou apenas impressão dos seus sentimentos aguçados, delicados, sofrendo, angustias precipitadas, o útero gemia com seus seios oscilando mártires, isto não tem cabimento, pareceu balbuciar, pois a mulher, cujos cabelos ela lavava, respondeu, meu marido sempre diz isto, minha querida, mas eu só vou cortar os cabelos quando ele ultrapassar os glúteos, hem.