A Ligação.
Estava difícil dormir naquela noite. Acordei no escuro e tateei o espaço vazio ao meu lado na cama. Tentei não pensar, mas o coração pesou, suspirei virando a cabeça pro outro lado da cama, fechei os olhos forte a ponto de começar a sentir dor de cabeça. Eu precisava dormir. Abri os olhos e deixei a escuridão entrar nos meus olhos. Não demorou e eu estava sentado na beira da cama. O celular estava no criado mudo, peguei-o.
Eram mais de duas horas da manhã, mas não havia reparado quando meus dedos digitaram o número na tela quase que de forma automática. O telefone chamou duas vezes, então pensei em desligar, talvez ela estivesse com o novo namorado, em alguma festa, com os amigos da faculdade, esse era o tipo de coisa que alguém faria na madrugada de sábado, quando ia desligar uma voz sonolenta atendeu do outro lado da linha.
— Oi.
Ela disse com a voz manhosa que ela sempre fazia ao acordar, um arrepio subiu pela minha nuca, devo ter ficado poucos segundos calado, mas pareceram durar muito tempo.
— Oi. — Respondi acordando do transe. Esperei que ela falasse algo, mas não veio nenhum sinal do telefone, por um momento pensei que ela havia desligado. — Desculpa. — Falei.
— Tudo bem, Júlio. Como você está?
— Não sei, com sono. — Falei sorrindo pra tentar discontrair a conversa. Ouvi o riso dela do outro lado da linha. — Acho que estou bem. E você?
— Eu tô bem, príncipe só q... — Ela parou de falar percebendo o que havia dito. Senti de novo o aperto no peito ao ouvir a palavra que havia se tornado comum enquanto estávamos juntos, sorri da forma que só rio quando estou nervoso. — Tô bem, Júlio. Sério.
— Só que...?
— Só que tá meio difícil as coisas na faculdade, é só isso. Você sabe como é.
— Sei.
Dava pra ouvir a irritação no tom de voz dela e então percebi que havia errado em ligar pra ela, não por ser tarde, mas só pelo fato de ter ligado pra ela. Nunca fui bom em me distanciar das pessoas, mas também nunca fui burro, e ligar para ela havia sido burrice. Não sabia mais o que dizer, tinha ficado um vazio na ligação, assim como um vazio entre eu e ela e principalmente o vazio que só parecia aumentar dentro do meu peito.
— Acho melhor eu desligar, não devia ter te ligado. Desculpa de novo.
— É. Júlio! Espera! Não desliga!
— Oi, oi. Pode dizer.
— Sabe por que eu não saí hoje?
— Não, por que?
— Lembra quando a gente fez seis meses de namoro? Foi a primeira vez que eu dormi ai contigo, eu me lembro daquela noite. Era sábado. A gente teve que entrar escondido na sua casa, eu estava meio bêbada, mas eu me lembro. Eu me lembro, Júlio! — O tom de voz dela estava ficando pesado e eu já sentia os olhos marejados. — Lembro que você disse que queria que aquele dia durasse pra sempre, mas eu deixei o pra sempre ir embora. Todo sábado ele me chama pra sair, mas eu não consigo, é como se eu estivesse te traindo. Eu não queria te dizer, mas tudo que eu queria era que você me ligasse e agora que você me ligou eu não sei o que fazer...
— Ana...
— Não, Júlio. Desculpa. É melhor você ir dormir, eu não devia ter falado nada disso. Vai dormir, viu? Tchau.
O telefone soou desligado, pensei em ligar de volta. Pensei em só deitar e dormir. Vesti a primeira camisa que eu achei e saí colhendo as chaves do carro do meu pai. Ele ia entender, ele tinha que entender. Eu estava indo atrás do amor da minha vida.