Tentação ( parte XLVIII )
                                             ( continuação do capítulo anterior)
 
Maria Rosa passou a dormir na Casa Grande desde que Ana Luiza tinha ido para a casa dos seus pais. Antonio João tinha ficado resfriado, com muita coriza e febril, exigindo sempre sua presença constante. Ela tinha feito uma poção caseira de  beladona para  alíviar o mal estar do pequeno, e lhe dava em pequenas doses, de hora em hora.
Quando Silveira chegou, percebeu que tinha voltado na hora certa, mais do que nunca precisavam dele ali naquele momento, consolou-se porque Ana Luiza estava bem cuidada na casa dos pais. Lá, ela também se sentiria útil, sem fazer esforços, conversaria com sua avó que já estava andando com o auxílio de bengala, embora estivesse mais impertinente e difícil. 
Agora Silveira iria se dedicar a replantar as mudas de bananeiras pratas e para isso chamou Jurandir para planejarem o que fazer. 
- Aquelas mudas, Jurandir, já podem ser replantadas, não podemos passar do tempo certo.
- Sim, senhor, patrão, o terreno já está preparado e vou começar o plantio. Mas gostaria de saber, o senhor conhece o fazendeiro vizinho, o senhor Eugênio?
- Conheço muito bem, porque?
- Eu preciso que o senhor me faça um favor, de pedir a ele que permita que eu namore a menina Sinhá Moça, que é cria da casa dele...Mas outro favor, não diga para ninguém daqui de casa, eles vão zombar de mim...
- Tudo bem, Jurandir, esse é um segredo nosso, vou falar com o Eugênio e você vai poder namorar a sua Sinhá Moça...
 
As luzes do salão iluminavam e mostravam as belezas de cada pilastra e o brilho do mármore nas variadas cores que ornavam o chão da Câmara. 
Quando o deputado Oliveira Mandim apresentou Ubiratan para que ele prestasse seu depoimento, o plenário estava repleto, as galerias apinhadas de pessoas, umas a favor da abolição mas muitas contrárias.
Ubiratan cumprimentou a todos com um aceno de mão e iniciou a sua fala:
- Solicito, por favor, a presença da Senhora Condessa da Piedade, para que ela se sente aqui, e apontou uma cadeira com localização privilegiada.
A velha condessa se apresentou com a elegância marcante que sempre a acompanhou e sentou-se no lugar indicado. Ubiratan foi até a ela e beijou-lhe a mão, em sinal de respeito e só então prosseguiu:
- Meus senhores parlamentares, senhora Condessa da Piedade, meus senhores e minhas senhoras. Meu depoimento é um preito de agradecimento à Senhora Condessa da Piedade,  da qual fui escravo durante tantos anos, mas mesmo não sendo atualmente seu escravo, continuo sendo mais do que nunca, seu cativo, porque ela ensinou a mim e a todos os seus escravos, uma coisa que jamais poderemos esquecer, ela nos legou uma lição de amor. Em cada letra que aprendi com ela, em cada número e em cada lição, ficaram impressos o amor que ela doou aos  seus semelhantes, porque assim ela nos via...E desse modo ela nos fez ver aos outros, sem diferenciações de cor, de cultura ou etnia. Ela nos ensinou as semelhanças na diversidade, e o que é mais importante, que tudo gira em torno do amor.
Foi com ela que aprendi a ler, a escrever, a falar o português , o francês e o inglês, porque até então só falava o yorubá.
Com ela, repito, nunca me senti escravo, mas por ela nunca me deixarei de sentir cativo.
Foi com ela, também, que percebi o valor da liberdade, dos direitos fundamentais da humanidade, de ir e vir, da expressão e do pensamentos livres, e espero que os senhores possam com essa veneranda senhora, aprender tudo isso que eu aprendi, a valorizar as suas vidas, valorizando as vidas dos seus semelhantes, exercendo as suas liberdades ao libertar os escravos e ao abolir a escravidão...
Para terminar, peço uma salva de palmas para a Senhora Condessa! 
                                          ( continua no próximo capítulo )
 
elzio
Enviado por elzio em 11/04/2013
Reeditado em 23/05/2013
Código do texto: T4234863
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