O tesouro do pergaminho
E o ônibus de excursão partiu para o seu destino, com muita conversa, risadas, zorra, gritos... Todos jovens, moças e moços, de diferentes classes sociais, raças, religião... Cada um com seu passado bem vivido ou... E o que interessava a eles era o presente: passeios, festas, curtição, praia... Sem pensar no futuro, deixando pra trás sua família, talvez orando por eles ou não, mas confiando, pois eles eram simplesmente jovens... Querendo viver tudo, se possível em um dia, em uma semana, naquela ansiedade agitada, sem pensar nas consequências... Pegação... Ficar...
E a excursão de jovens seguiu seu curso e eles, já entrosados, começaram a sua curtição, com batidas, paqueras, intrigas, ciúmes, soberbia, brigas, sorrisos, novas amizades, namoro, autoafirmação... Os de maior poder aquisitivo querendo se impor e os menos favorecidos, já complexados, fazendo panelinhas. Mas tudo valia, eram jovens, tinham a juventude.
Nessa ânsia de descobrir tudo de uma vez, de ganhar o seu espaço atropelando tudo pela frente, esqueceram-se de olhar a estrada, a natureza, o sol, o céu azul, os vários tipos diferentes de vegetações, a riqueza de um lugar em relação ao outro, as diferenças sociais e o mais importante, esqueceram-se de orar e agradecer. Cabeças vazias, só com fios de cabelos pendurados, olhos esbugalhados, bocas de sapo escancaradas, cheias de dentes, esperando... Curtir da maneira deles, mas não vivenciando nada.
A excursão finalmente chegou a seu destino, uma belíssima praia, um paraíso. Foram para o hotel, cada um querendo falar mais que o outro. Adentraram pela porta e não perceberam uma tabuleta com o seguinte escrito: “DEUS está aqui, sejam bem-vindos”.
Cada grupo pegou o seu quarto, eles mesmo fizeram a dividança, abriram as malas e passou a mão nos biquínis, shorts, boné, camisetas, bronzeadores, cigarros, bebidas, câmeras digital... E foram fazer um passeio de escuna para uma ilha afrodisíaca. Todos bebendo, dançando, gritando, vomitando e mais uma vez esquecendo-se de olhar o céu azul, as ondas do mar, as gaivotas riscando o céu, os golfinhos saltitando com alegria em louvor a eles.. .E eles nada... Só uma coisa os inquietava, o olhar calmo, lindo e sereno de um belo moço que estava sentado perto da casa das máquinas, observando-os... Um velho marinheiro cantarolando baixinho sem se preocupar com o que estava acontecendo lá em cima, pois estavam com um guia da excursão que por sinal era bem desligado e já havia entrado na deles.
Chegou à ilha, a beleza dela era estonteante, praia virgem, a água do mar era tão transparente que dava para espelhar-se nela, o cantar dos pássaros parecia uma orquestra, a magia do vento nas árvores... Mas eles nem perceberam, não pararam por um momento para sentir aquela magia e agradecer. O velho marinheiro foi para uma velha cabana que servia de bar, restaurante, pousada... Uns ficaram na praia, outros no mar brincando nas ondas e nadando, outros filmando tudo que viam, para depois, quando voltassem, mostrar para alguém que se interessasse ou deixar esquecido na máquina, e todos bebendo, mas bebendo muito, as moças se insinuando com seus biquínis, colocaram músicas e começaram a brincar e a dançar, ficaram na belíssima praia até o entardecer. Voltaram para a escuna, a maioria bêbada, outros dormindo e outros olhando para o infinito sem pensar em nada.
A volta foi silenciosa. Quando a escuna atracou ao cais, despediram-se do velho marinheiro e do lindo moço, com olhar calmo e sereno sentado perto da casa das máquinas. Ficou combinado que no outro dia, logo ao amanhecer, iriam explorar a outra parte da ilha.
Entraram no hotel e foram para os seus quartos tomar banho para depois, todos juntos degustarem uma saborosa e quentinha canja de galinha para curar a canseira e a ressaca.
Depois do jantar todos sentaram na varanda do hotel e como já estavam cansados, por um momento se calaram e viram com admiração as belezas daquela praia: o brilho das estrelas, a lua prateada bailando no céu, o barulho das ondas batendo de leve nos rochedos e sentiram uma vontade de chorar. Não entendiam o motivo da tristeza, se estavam tão felizes, se tinham bebido e aprontado todas. Por que continuavam tristes? Apesar da beleza, sentiam um vazio cortante na alma, ficaram quietos refletindo e só ouvindo o pulsar de seus corações e a respiração.
Amanheceu na ilha encantada, o primeiro raio de sol surgiu para dar bom-dia aos jovens sonolentos e sedentos por viverem tudo em uma semana, e começou tudo outra vez, aquela magia da noite anterior, quando encontraram o seu próprio eu, já havia adormecido em suas mentes.
Tomaram um gordo café da manhã e, preparados com seus equipamentos: bebidas... Dirigiram-se para a escuna onde estava o velho marinheiro esperando-os e o belo jovem, sorrindo pra eles com seu lindo e calmo olhar, sentado do lado da casa das máquinas, os cumprimentou. O que mais intrigava entre as moças é que elas não tinham coragem de aproximarem-se dele.
A escuna chegou na ilha, era outro pedaço do paraíso, lá havia árvores frutíferas altíssimas, uma pequena floresta, mas de grande porte, as águas do mar eram também cristalinas, só que as ondas eram mais fortes e quebravam com mais intensidade e as areias da praia eram tão brancas que pareciam talco. Despediram-se do velho marinheiro e do moço, pois eles iriam ficar na escuna. Começaram a caminhar, os que já estavam namorando seguiram de mãos dadas e os outros tentando a conquista, caminhando perto do mar onde as ondas batiam com força nas suas pernas, por incrível que pareça começaram a sentir aquela sensação estranha de paz, alegria, felicidade, não tinham vontade de beber, zoar, gritar, brigar, discutir. Eles só tinham vontade de conversar como velhos amigos, sem distinção de raça, religião... E não queriam perder nada da natureza e olhavam agora com os olhos da alma.
Depois de caminharem bastante, ouviram um barulho forte de água caindo e um brilho por detrás das árvores que ficava perto da praia, foram em direção a floresta e desbravando , seguiram por entre as árvores, eis que finalmente pararam, extasiados, vendo uma enorme cachoeira que descia de um morro e quando suas águas caiam no mar, suas espumas branca misturavam-se com a água cristalina, do lado formava uma piscina que dava para nadar e todos correram para banhar-se e curtir aquela cachoeira belíssima e ficaram ali nadando, brincando e depois foram sentar em umas pedras , só para observar a beleza do Criador e sentiram emoção. A fome começou apertar então os moços subiram nas árvores frutíferas e apanharam bastantes frutas de diversos tipos, todas suculentas e saborosas e o almoço foi bem tropical.
Continuaram conversando e sorrindo, então viram um tipo de caixote vindo pela água do mar, perto da cachoeira, passando por eles e parando nas areias brancas da praia, todos correram para ver do que se tratava e quando chegaram perto, era um baú muito antigo, fechado, lacrado. Daí deixou de serem aqueles jovens meigos, amigos... E começaram as discussões... Se tiver ouro aí dentro nós vamos dividir em quantias iguais. O que vira primeiro o baú, falou:- Não, a quantia maior tem que ficar comigo... E a briga continuava cerrada, até que o guia deu um grito, pediu para que todos se calassem e que, primeiro, deviam abrir o baú para depois pensarem no que fazer, mas na altura dos fatos, já eram inimigos. A soberbia pegou a todos.
Depois de muito custo conseguiram quebrar o fecho do baú, todos em volta dele, cabeças vazias, só com fios de cabelos pendurados, olhos esbugalhados, bocas de sapo escancaradas cheias de dentes, esperando... O guia foi abrindo o baú devagar... Eis que uma luz intensa saiu dele e ofuscou a vista de todos, no fundo do baú havia um pergaminho. O guia pegou o pergaminho em suas mãos, esse brilhava só o barulho da cachoeira e, as respirações ofegantes eram ouvidas, o guia foi abrindo o pergaminho devagar e, conforme ele abria, a luz ficava mais amena, ele ficou por um tempo parado olhando fixo para o pergaminho e num sobressalto acordou com eles gritando para falar o que estava escrito. Ele, com duas lágrimas escorrendo por sua face, disse calmamente: fiquem em silêncio para que eu possa ler “O tesouro do pergaminho...” E começou a leitura...
“Eu sou o caminho, a verdade e a vida”.
Ah! Se soubéssemos trilhar esse caminho sem distrair-nos demais nas veredas.
Se acreditássemos nessa verdade sem contestá-la tanto e inutilmente, teríamos sem dúvida a verdadeira vida.
E não necessitaríamos a cada ano desejarmos felicidades uns aos outros, pois a teríamos em abundância.
Jesus Cristo.
O guia pegou o pergaminho, enrolou, colocou dentro do baú e novamente o lacrou.
Todos choravam, a emoção brotava de suas almas, a serenidade voltava e todos se abraçavam, já não
eram mais sacos vazios e sim cheios de virtudes. Estavam em êxtase e assim ficaram por muito tempo, e quando deram por si, já havia entardecido. E não perceberam que o baú havia desaparecido. Foram embora para a escuna pensando em tudo que havia acontecido, agora eram outros jovens, jovens de verdade: felizes, virtuosos e com objetivos de vida.
Chegando à escuna o velho marinheiro como sempre os recebeu com alegria, adentrou e ficou vendo-a distanciar-se da ilha, notaram que a cadeira do lado da casa das máquinas estava vazia, onde estava aquele lindo jovem? Foram perguntar para o marinheiro e esse, surpreso, respondeu:- Jovem, que jovem?...Eu sempre viajo sozinho, eu acho que vocês estão vendo coisas demais... Ah! Esses jovens...
E todos olharam em direção a ilha e lá estava o lindo jovem segurando o pergaminho nas mãos e acenando para eles...
Do meu livro: Pedaços de Uma Vida